Jornal Estado de Minas

Lentidão favorece impunidade de acusados com foro privilegiado


Com a condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), e as avaliações a respeito dos prazos de processos no Judiciário, reinicia-se o debate sobre as questões relacionadas ao foro privilegiado. Enquanto Lula é condenado em segunda instância seis meses após o veredito de Sérgio Moro, outros políticos com prerrogativa de função têm crimes prescritos. Nos próximos meses, a Câmara dos Deputados e o Supremo Tribunal Federal voltam a julgar o fim da regalia.

O Ministério Público Federal apresentou o indiciamento contra o ex-presidente em setembro de 2016. Em julho do ano seguinte, o juiz federal Sérgio Moro condenou o réu em primeira instância. Seis meses depois, Lula teve a condenação confirmada. Para o professor do curso de Doutorado da PUC do Paraná e ex-presidente do TRF-4 Vladimir Passos Freitas, houve clara rapidez no processo em comparação a outros políticos também investigados pela Lava-Jato, graças à falta de foro privilegiado do ex-presidente.

“Se fosse em qualquer tribunal do país com uma ação penal originária, isso nunca teria sido julgado”, comentou. “O foro especial é uma grande via de impunidade.
Os políticos envolvidos sabem que o tempo do processo demora, e a chance de prescrever é muito maior”, explicou o especialista.

Segundo Freitas, são poucos os casos em que alguém com prerrogativa de função é julgado até o fim e condenado. “Do jeito que está, não termina. E quando terminam, são ações como o caso do Maluf, em que o homem já está idoso e é uma pena que não tem mais sentido pelo tempo que passou”, avaliou. Mas, mesmo que o benefício seja extinto, ainda é necessário que as varas criminais atuem com mais rapidez nos casos.

“Não vai ser um paraíso, porque nem todas as varas são iguais. Também haveria caso de prescrição, de muitos recursos. Mas já seria um esforço de mudança”, argumentou o professor. Mesmo que o tema seja discutido na Câmara dos Deputados, o professor não acredita que a votação vá até o fim.
“Acho muito difícil eles acabarem com um benefício que têm”, acrescentou.

Mas há aqueles que acreditam que o foro não gera mais lentidão ao processo. É isso que argumenta o professor de direito constitucional e criminal do Instituto Brasileiro de Direito Público (IDP) e da Universidade de São Paulo (USP) Daniel Falcão. “Por que ficamos com essa impressão de que demora mais? O Sérgio Moro, em Curitiba, julga mais rápido os acusados e dá a sentença. Desde que a operação começou,em 2014, a vara em que o juiz trabalha só cuida desse assunto”, argumentou.

Ou seja, segundo o professor, o problema é que outras varas não são exclusivas de uma operação. “É fato que muita coisa prescreve, mas tem que ver o porquê disso. Até agora, qualquer tipo de crime de pessoas com foro vira processo nesses órgãos como o STF e STJ. E eles não têm infraestrutura para isso.
Esse trabalho que eles acabam fazendo é de juiz de primeiro grau, e eles têm competências enormes”, explicou.

Decisão sobre Serra


Ontem, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) o arquivamento do inquérito que investigaria o senador José Serra (PSDB-SP). Ele é acusado de crime eleitoral de caixa 2. Durante depoimento na Operação Lava-Jato, o empresário Joesley Batista afirmou ter combinado com o senador uma contribuição de R$ 20 milhões, referentes à campanha presidencial de 2010, na qual Serra disputou.

Segundo Batista, desse valor, R$ 13 milhões foram repassados como doação oficial, e cerca de R$ 7 milhões foram por meio de caixa 2 e notas fiscais fraudadas. A procuradora, no entanto, entendeu que Serra tem mais de 70 anos e, por isso, o tempo de prescrição cai pela metade. Sendo assim, o suposto crime teria prescrito em 2016, mesmo que a investigação tenha sido iniciada no ano passado..