Boston, 07 - No dia em que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi preso, o ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso disse que "do mesmo modo que não se deve criminalizar a política, não se deve glamourizar o crime". Aplaudido de pé ao fim de palestra na Brazil Conference at Harvard & MIT, em Cambridge, Barroso afirmou ainda que há uma "operação abafa" em curso, que tinha como alvo a manutenção do foro privilegiado e agora se centra na derrubada da jurisprudência do STF que permite a prisão depois de julgamento em segunda instância.
"A estratégia mudou para acabar com a execução após o segundo grau. Daí o processo (contra corrupção) vai começar no primeiro grau e não vai acabar nunca. A estratégia foi alterada diante da perspectiva da mudança do foro", observou o ministro, depois de lembrar que já há oito votos no Supremo favoráveis ao fim do foro privilegiado. A jurisprudência que permite a execução da pena depois de julgamento em segunda instância esteve na base da decisão da corte de negar o pedido de habeas corpus de Lula.
Barroso não mencionou o nome do ex-presidente de maneira expressa, mas fez uma referência velada a ele. "Procuro ser o melhor juiz que eu consigo ser, que é um juiz que faz uma interpretação constitucional retilínea e não desvia quando chega em A, não desvia quando chega T e não desvia quando chega em L" - a menção à inicial do nome de Lula provocou risos e aplausos na plateia.
"Quem cobra dinheiro para dar desoneração em medida provisória, quem achaca em Comissão Parlamentar de Inquérito ou quem cobra pedágio para dar financiamento público, isso não é criminalização da política. Isso é crime mesmo", afirmou. Barroso disse que o Mensalão e a Lava Jato começaram a mudar a cultura de que o Direito Penal se aplica apenas aos pobres e não atingia ninguém que ganhe mais que cinco salários mínimos.
Segundo ele, a dimensão da corrupção no Brasil é fruto de um "pacto oligárquico" para beneficiar o que chama de "elites extrativistas". Diante do avanço na punição, Barroso disse que os mesmos grupos reagem às ações do Judiciário.
No mesmo evento, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, pediu que a opinião pública se mantenha "ativa" e cobre das instituições e do Judiciário a aplicação da lei de maneira igualitária para todos. Para Raquel, a pressão popular foi um dos fatores fundamentais que ampliaram o combate à corrupção nos últimos anos, ao lado da delação premiada, dos acordos de leniência para empresas e da decisão STF de permitir a prisão de réus após condenação em segunda instância.
Dodge disse estar confiante de que o Supremo manterá esse entendimento. "O STF acaba de chancelar pela quarta vez essa possibilidade. Isso é importante porque abrevia o tempo de aplicação da sanção e torna possível divisar no horizonte a ideia de que a condenação vai ser realmente cumprida", afirmou.
Barroso ressaltou que a defesa da integridade deve estar acima de ideologias e fazer parte de um pacto que anteceda a disputa por ideias. Depois de mencionar estatísticas da operação Lava Jato, o ministro afirmou que a escala do sistema de corrupção é "tão impressionante" que poderia levar alguns a imaginarem que se trata de uma co
nspiração-teoria que é defendida por muitos dos apoiadores de Lula.
"Só há um problema contra essa teoria: os fatos, os malditos dos fatos. Os áudios, os vídeos, as fotos, as malas, as mochilas, os apartamentos.
(Cláudia Trevisan, enviada especial).