Brasília, 15 - O ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles afirmou, em sua primeira entrevista após deixar o cargo, que a eleição deste ano traz risco de instabilidade do País e que candidatos de esquerda, como Ciro Gomes (PDT), e de direita, como Jair Bolsonaro (PSL), representam um desmonte da política de reformas do governo Michel Temer.
Mais à vontade fora do traje de ministro, ele disse estar convicto de que será o candidato do MDB à Presidência se Temer abdicar da vaga. Questionado sobre as acusações de corrupção que pairam sobre seu novo partido, afirmou que não será afetado por sua trajetória pessoal: "Nunca fui político".
Meirelles também negou ser o "candidato do mercado". Ele começou a montar sua equipe neste fim de semana e prepara a instalação de um gabinete na sede nacional do MDB, em Brasília, de onde vai despachar com privacidade.
O senhor fez um acordo com Temer antes de deixar o cargo?
Não revelo minhas conversas com o presidente. Tenho convicção de que, não sendo o presidente Temer, o candidato do partido serei eu. Não há possibilidade de ser outro.
Sendo Temer, o sr. será o vice?
Não. No momento não estou considerando essa possibilidade. Se o presidente Temer julgar que tem condições de ganhar a eleição, ele vai ser candidato e certamente é um projeto ótimo.
O sr. se filiou ao MDB, que tem integrantes sob investigação. Isso pode afetar sua campanha?
Não acredito que afete em nada pelo meu histórico pessoal. Eu não participei de nada ilícito e ilegal. É óbvio. Eu nunca fui político. Disputei uma eleição autofinanciada em 2002.
O sr. trabalhou para a J&F, cujos sócios, os irmãos Batista, delataram corrupção. Alguma vez percebeu algo suspeito?
Meu trabalho estava estritamente relacionado à criação e lançamento da plataforma digital do banco Original, sem relação com os outros negócios do grupo. Nunca tive conhecimento de atividade ilícita.
Nas eleições de 2002, o País viveu grande instabilidade dos mercados.
Acho que vai ocorrer instabilidade em 2018. Não necessariamente na mesma dimensão. Aquele nível era a incerteza política com vulnerabilidades da economia, que agudizavam o processo. Não tinha reservas, existia uma dificuldade com a dívida doméstica. Agora é o risco da volta atrás. O risco do desmonte, de desestabilização da economia, por propostas de candidatos.
Quem são eles?
Os candidatos dos extremos que estão aí. Seja Bolsonaro, seja Lula. O Ciro está propondo várias coisas radicais nesse sentido. O Bolsonaro está apresentando propostas liberais, mas tem todo um histórico de votos a favor do intervencionismo econômico. Como parlamentar, ele foi contra todas essas reformas.
O sr. colocaria nesse grupo o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa?
Eu não sei o que o Joaquim Barbosa pensa de economia.
O que diferencia o sr. do ex-governador Geraldo Alckmin (PSDB) e do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM)?
Tenho resultado concreto para mostrar. As pessoas estão cansadas de falatório. Entramos no governo na maior recessão da história.
Como vê a decisão do Superior Tribunal de Justiça de remeter para a esfera eleitoral a investigação sobre Alckmin na Lava Jato?
Defendo a investigação de todas as suspeitas, sem partidarismo. Sou contra a politização de ações judiciais.
Como fica o quadro sem Lula?
Enfraquece muito a posição do PT e torna a eleição um pouco mais aberta. Lula é o pré-candidato mais conhecido. Na medida em que ele sai, abre-se um espaço grande para os eleitores procurarem conhecer quem são os outros. Não concordo que a Justiça esteja agindo politicamente (no caso de Lula). Acho que ela está cumprindo a sua função. É um grande avanço institucional o que está sendo feito em Curitiba e nos tribunais superiores. Se o Lula não puder disputar a eleição, será pelo funcionamento do estado de direito.
Qual a diferença entre a candidatura do sr. e a de Temer?
Não sei qual seria o plano de governo e de campanha dele. Sei o que ele está fazendo e eu concordo, evidentemente, participo do governo. Eu sei qual é o meu projeto. São três eixos. Prosseguimento das reformas e da modernização da economia. Não só a reforma da Previdência, mas a tributária, uma série de questões relacionadas aos Estados. Segundo, um grande avanço na qualidade dos serviços públicos à população, seja na educação, saúde, segurança e infraestrutura. O terceiro pilar é a maneira como o País funciona, o que na economia olhamos sob o ponto de vista de produtividade.
Alguns líderes regionais do MDB apoiam outros candidatos... Num partido tão enraizado, é normal que os líderes pensem diferente. Estou organizando uma agenda de visitas aos diretórios do MDB e líderes.
Como o sr. vai se tornar conhecido numa campanha curta?
É curta, mas é suficiente por causa do tempo da televisão. Não preciso de muito tempo para as pessoas reagirem: este é o candidato que eu quero. Quando elas veem o histórico na televisão, um vídeo bem feito, mostrando cenas da vida real, seja no exterior, na presidência de um banco global, seja no Banco Central... 'Oh, então realmente foi ele o grande responsável pela estabilidade, pela inflação baixa e pelo crescimento do Brasil naquela época, pô, bacana'. Então, muitos resumem o seguinte: 'Ele (Meirelles) é um homem competente (...) E a partir daí foi chamado pelo Lula porque o Brasil tinha problema. Ele resolveu o problema. Aí, de novo, o Brasil estava com um problema grave. O Temer chamou, (ele) resolveu o problema'. É uma história forte. As pessoas gostam.
O sr. financiará sua campanha?
Sim. Eu posso, se julgar adequado, financiar a campanha dentro dos limites. É uma vantagem, porque não existe nenhuma suspeita de qualquer tipo de financiamento ilegal.
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse que o "candidato do mercado" não ganhará a eleição. O sr. é o "candidato do mercado"?
Não. Eu sou o candidato do crescimento e do emprego e contra o atraso. O mercado funcionando bem é consequência de qualquer política econômica. As informações são do jornal
O Estado de S. Paulo.
(Adriana Fernandes e Felipe Frazão).