A corrida ao Planalto começou, mas os pré-candidatos evitam tocar em um assunto espinhoso que não poderá ser ignorado na campanha: a regra de reajuste do salário-mínimo. A norma atual, em vigor desde 2007, expira em 2019. Portanto, o próximo presidente precisará deixar claro se manterá ou não a metodologia existente logo no primeiro ano de mandato. Essa fórmula é criticada pelos defensores do equilíbrio fiscal, porque ajudou a piorar as contas públicas, apesar de o piso salarial ainda ser muito baixo se comparado com outros países.
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Um levantamento feito pela Organização para a Cooperação do Desenvolvimento Econômico (OCDE) mostra que, entre 2000 e 2016, o mínimo brasileiro está entre os poucos que tiveram valorização acima de 100%, mas continua entre os mais baixos em valores em dólar.
A metodologia de reajuste é criticada por especialistas em contas públicas porque contribuiu para o forte crescimento do rombo da Previdência, pois mais de 65% dos benefícios pagos pelo Regime Geral de Previdência Social (RGPS) e pelos programas assistenciais, como Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS) e também o abono salarial são indexados ao mínimo. Portanto, se o mínimo tem aumento, essas despesas também crescem acima da inflação, algo que não ocorre com as receitas há muito tempo. Pelas contas do economista Raul Velloso, cada real a mais no salário-mínimo implica R$ 400 milhões a mais nas despesas da Previdência.
Tema impopular
“Pela Constituição, o salário-mínimo tem de acompanhar a inflação para que o trabalhador não perca o poder de compra. O novo presidente terá de decidir se manterá a regra atual ou deixa apenas o que a Constituição determina”, diz Velloso. Para ele, os candidatos evitam tocar no assunto porque mudar a regra é um assunto impopular, apesar de inevitável. “Mas não existe razão para um governo que não consegue equilibrar as contas continuar concedendo aumentos acima da inflação.”
A economista Vilma da Conceição Pinto, pesquisadora do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre/FGV), não tem dúvidas de que a manutenção da regra atual vai comprometer as contas públicas.
Para Thaís Zara, economista-chefe da Rosenberg Associados, o ideal seria que o reajuste do mínimo fosse negociado ano a ano, não como a regra atual que o Congresso aprova para valer de quatro em quatro anos. “Mudar a regra é uma medida impopular e os candidatos vão evitar mexer com isso agora, mas o assunto virá à tona, porque a indexação está criando um problema para a própria Previdência.”
Claro que a regra do mínimo não é o único vilão do rombo da Previdência. Além disso, o lado de o fato de castas privilegiadas de servidores, políticos e militares terem aposentadorias integrais por períodos que superam o tempo de contribuição é uma das maiores contradições. Basta olhar para a evolução do rombo das contas do regime geral da Previdência. Em 2007, o deficit somava R$ 32,3 bilhões e, no ano passado, chegou a R$ 182,4 bilhões, um salto de 464,7%. A tendência de crescimento é constante porque, assim como as despesas com salários do funcionalismo, outro problema fiscal que precisará ser atacado, os gastos com a Previdência têm crescido acima da inflação.
O economista Felipe Salto, diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI), do Senado, ressalta que, pela evolução das receitas e das despesas do governo central, em 2019, será muito difícil cumprir o teto dos gastos, que é uma emenda constitucional.
O economista-chefe da Spinelli, André Perfeito, reconhece que o mínimo brasileiro, apesar de ter registrado valorização expressiva nos últimos anos ainda está bem abaixo da média mundial. “Discutir uma nova regra para o reajuste do mínimo gera constrangimento entre os candidatos, porque ele é uma das conquistas do imaginário popular. A sociedade é populista e ninguém quer brigar com populista em ano eleitoral.” Para ele, seria importante que todo ano o mínimo fosse negociado, retirando o problema dos gatilhos e regras automáticas que geram a indexação.
Reflexos nas candidaturas
Poucos pré-candidatos se arriscaram comentar sobre mudanças na regra do salário mínimo. João Amoedo (Novo), por exemplo, critica a indexação dos benefícios previdenciários pelo mínimo e defende uma regra mais aperfeiçoada. “É importante que a renda da classe trabalhadora acompanhe o crescimento da produtividade nacional. Mas precisamos aperfeiçoar esse mecanismo. Não faz sentido, por exemplo, utilizar a mesma regra para outros salários mais altos e rendimentos previdenciários. Nossa posição sobre piso salarial seria basear seu cálculo em uma mistura de mínimo com Bolsa Trabalho, um complemento salarial pago pelo governo a trabalhadores com salário formal de renda mais baixa.”
O senador Álvaro Dias (Podemos-PR) também defende uma nova regra de reajuste do mínimo a partir de 2020.