Brasília – A história da política brasileira mostra que a figura do vice-presidente é importante no governo do país. Desde a redemocratização, três “número 2” assumiram a vaga do presidente. O primeiro deles, José Sarney, substituiu Tancredo Neves (PDS), eleito indiretamente pelo Congresso em 1984. O segundo foi Itamar Franco, que assumiu o cargo após o impeachment de Fernando Collor de Melo. Hoje, o presidente da República é Michel Temer (MDB), eleito vice de Dilma Rousseff (PT) em dois mandatos. Escanteados nas campanhas do PT e do PSL ao Planalto, o general Hamilton Mourão (PSL), presente na chapa puro-sangue de Jair Bolsonaro, e a deputada estadual Manuela D’Ávila (PCdoB), aliada a Fernando Haddad, aparecem como simples figurantes às vésperas de uma eleição extremamente radicalizada e ainda imprevisível.
"Quem é eleito é o presidente. O vice vai junto. Teve um período em que o vice era votado independentemente"
Sérgio Praça, professor de ciência política da FGV
No Brasil, mesmo sem uma missão especial, o vice-presidente eleito tem residência oficial no Palácio do Jaburu e despacha num anexo do Palácio do Planalto. Para o professor de ciência política da Universidade Estadual de Goiás (UEG) Felippo Cerqueira, as previsões sobre as dificuldades orçamentárias e a impopularidade dos dois candidatos ao Planalto tornam a figura do vice ainda mais importante. “É ele que vai precisar resolver as pendências, fazer as articulações com o Congresso para um a pauta minimamente comum, buscar a união entre os partidos e combater a oposição. Sem vice, Michel Temer precisou fazer o trabalho sozinho. Não é o melhor dos mundos.”
A perspectiva de uma volta dos militares ao poder fez com que o cientista político Ivan Ervolino recapitulasse a importância da democracia e de sua composição. “A principal mensagem deste momento é que as escolhas democráticas vivem em evolução. Há coisas boas e ruins, mas a via eletiva é a melhor maneira para resolvermos os problemas”, afirma o criador da start-up de monitoramento legislativo SigaLei. Apesar dos erros e acertos, o Congresso optou por não fazer eleições diretas após a saída de Dilma Rousseff. Michel Temer foi instituído presidente. “Quem ganhar a Presidência tem agendas muito difíceis pela frente e que não vai poder se furtar, por exemplo, de discutir reformas. No fim, o vice é o marcador da composição de chapa”, explica o analista político Creomar de Souza.
Dificuldade para compor chapa
Durante a pré-campanha, o desafio de encontrar um vice-presidente chacoalhou as alianças dos atuais candidatos ao Planalto. Manuela foi a primeira opção de Haddad, mas, antes das definições sobre a saída de Lula, aceitou o convite informal do partido. Bolsonaro teve três convites recusados até fechar às pressas o acordo de uma chapa única. Um príncipe da Casa Imperial do Brasil e um astronauta foram sondados para o cargo, mas ninguém aceitou. A advogada do impeachment, Janaína Paschoal (PSL), também não foi a escolhida — e alega nunca ter sido chamada formalmente. Acabou eleita a deputada estadual mais votada de São Paulo.
Embora o vice tenha a importância reconhecida, não é a figura central de nenhum sistema presidencialista. “Quem é eleito é o presidente. O vice vai junto. Teve um período em que o vice era votado independentemente. Jânio Quadros (PTB) foi eleito presidente e, João Goulart (PCB), vice. Não tinha uma chapa. Os candidatos ficavam isolados. Abre-se também um precedente para que o vice, em caso de desgaste do presidente eleito, faça articulações para tomar o poder. Isso acontece”, detalha Sérgio Praça, professor de ciência política da Fundação Getulio Vargas (FGV). “Todos os candidatos tiveram dificuldade em costurar o nome do vice”, conclui.