Ao ser reeleito pela sétima vez como deputado federal pelo Rio de Janeiro, Jair Bolsonaro (PSL) tomou a decisão de se tornar o “zero um” da política brasileira. Aproveitou o desgaste do PT, com mais de uma década de poder, e começou a se articular entre os militares para analisar sua força como eventual candidato à Presidência da República.
“A gente não acreditava que essas coisas fossem acontecer com tanta desenvoltura. Tivemos exemplos aí que não deram certo. O desgaste dos petistas fez com que a candidatura se viabilizasse sem a mínima estrutura. Outro cara com o mesmo perfil do Bolsonaro foi para a briga no Executivo e acabou sem nada. Inclusive sem mandato aqui na Câmara”. O comentário é de um dos aliados de Jair Bolsonaro no PSL, onde o capitão costuma ser comparado ao ex-adversário, Cabo Daciolo (Patriota-RJ). “O que a gente vê acontecendo aí com o Daciolo poderia muito bem ter acontecido dentro do partido. Bolsonaro não tinha toda essa força, mas a ideia de tudo o que ele representa é algo tão caro ao eleitor que não importa se tem dinheiro, nome, família... Bolsonaro representa uma promessa de mudança”, conta o conselheiro do capitão reformado.
Rigor
O rigoroso comportamento do militar fez com que difíceis decisões fossem tomadas na construção da candidatura. “Notamos que foi necessário soltar a mão de algumas pessoas, superar o trauma de um ataque... Longe dos holofotes, o candidato conseguiu se manter como promessa de mudança na cabeça dos brasileiros”, aponta o professor de ciência política da Universidade Estadual de Goiás (UEG) Guilherme Silva Prado. “Tudo isso é fruto de planejamento, de oportunidades bem aproveitadas. O candidato usou as redes sociais num momento em que elas se tornaram protagonistas. Aproveitou a onda antipetista para pregar exatamente o contrário do que o partido representa. Isso é usar os acontecimentos com sabedoria. Como disse, planejamento”, detalha o especialista.
Dois elos unem praticamente todos os que cercam o deputado federal. Um deles é o sentimento antipetista. O outro, o militarismo. Foi a irritação de Bolsonaro com o PT, em 2014, que fez com que o candidato se aproximasse de Gustavo Bebianno, presidente do PSL, e mudasse para o partido com a promessa de “mais liberdade”. O passado no Exército fez com que o candidato permanecesse ligado aos colegas de quartel e prometesse a alguns uma vaga na Esplanada. Na última semana antes do segundo turno, resultados mapeados pelas últimas pesquisas mostram que o capitão terá uma confortável vantagem nas urnas. Tudo indica que a missão será cumprida com êxito.
General Hamilton Mourão
A verve atuante do candidato à vice-presidência pelo PTRB já causou desavenças com Jair Bolsonaro. Frases polêmicas, encontros não avisados e soluções improvisadas são alguns pontos que incomodam o presidenciável. Ainda assim, o general tem grande influência perante o capitão — mesmo que os discursos públicos de Bolsonaro pareçam desautorizar Mourão. O candidato a vice é visto como grande articulista e tenta trabalhar independentemente na solução de temas que julga importantes para a “ordem do país”. Defende o “despertar da luta patriótica”, uma exaltação aos militares que traz problemas de imagem à chapa. Mourão será uma espécie de “coordenador” dos ministros que vieram do serviço militar.
Paulo Guedes
Apontado como “cérebro econômico” de Jair Bolsonaro, Paulo Guedes será o responsável pela viabilidade dos planos do PSL na área econômica de um eventual governo. É um dos conselheiros mais próximos do candidato, presente em quase todas as reuniões de campanha. Economista, defende a privatização sem restrições de empresas e agências governamentais e é apontado como o garoto-propaganda de Bolsonaro junto ao mercado financeiro. Guedes terá papel importante ao assumir o aglutinado Ministério da Economia durante a gestão de um presidente que é assumidamente fraco neste tema.
Onyx Lorenzoni
Um eventual governo Bolsonaro terá o deputado federal Onyx Lorenzoni (DEM-RS) como ministro da Casa Civil, pasta que responde pela articulação política do governo. Reeleito para um novo mandato na Câmara e membro da bancada ruralista, o democrata é o atual coordenador político da campanha do PSL. Foi um dos articuladores para conseguir o apoio oficial dado à chapa pela Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), grupo que congrega deputados e senadores ligados ao agronegócio. Lorenzoni é um dos mais insistentes críticos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a quem frequentemente acusa de ser “chefe da quadrilha” responsável pela corrupção no Brasil.
Gustavo Bebianno
Cotado para ser ministro da Justiça na gestão de Bolsonaro, Bebianno é um admirador do capitão que se tornou seu braço direito. Presidente do PSL e advogado de carreira, ofereceu consultoria grátis ao deputado em 2014, quando Jair Bolsonaro enfrentava duras críticas do PT na Câmara. Foi o motivo da mudança de partido (antes, o capitão era do PSC) e estimulou a candidatura à Presidência da República, considerada pelos mais cautelosos como algo “fora de cogitação” no ano passado. Foi um dos poucos amigos que ficaram no hospital quando o candidato sofreu o atentado em Juiz de Fora (MG), durante comício.
General Augusto Heleno
Foi o primeiro nome colocado à mesa em se tratando da vice-presidência de Bolsonaro e um dos três generais que ajudaram a articular o plano de governo do partido. Defende políticas conservadoras e atua como uma espécie de conselheiro na área da segurança pública. Critica de maneira ferrenha a esquerda e tudo o que ele acredita que ela representa. É favorável ao uso da força em determinadas decisões e considerado um dos mais próximos conselheiros de Jair Bolsonaro. Costuma estar acompanhado de ao menos dois militares de alta patente durante suas reuniões, inclusive com o candidato à Presidência. É o provável ministro da Defesa.
O professor tem auxiliares
De vice do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva à cabeça de chapa, Fernando Haddad (PT) é candidato à Presidência desde 11 de setembro. Preso em Curitiba, Lula teve a candidatura barrada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por se enquadrar na Lei da Ficha Limpa. Em 2012, quando foi eleito prefeito de São Paulo, Haddad ficou conhecido por ser o “segundo poste do ex-presidente” — uma alusão ao papel que Dilma Rousseff protagonizou no pleito de 2010. Seis anos depois, a frase volta à tona, mas dessa vez com outro viés: “Volto ao cargo de poste”, disse Haddad, quando estava sendo cotado, em julho, para substituir o amigo na chapa O Brasil feliz de novo. Agora, o professor universitário, doutor em Filosofia e mestre em economia, disputa o segundo turno do pleito contra Jair Bolsonaro (PSL) com nomes importantes por trás da candidatura dele.
No dia seguinte ao resultado do primeiro turno, 8 de outubro, Haddad voltou a Curitiba para a carceragem da Polícia Federal, onde Lula cumpre pena de 12 anos desde o último 7 de abril. Ele queria agradecer o apoio do ex-presidente durante a corrida ao Planalto e recebeu uma espécie de última bênção, como um afago para continuar na briga. A viagem era comum e, rotineiramente, ele ia acompanhado da presidente petista, Gleisi Hoffmann. A aproximação com o ex-presidente deu a Haddad visibilidade, mas trouxe consigo a rejeição; o sentimento antipetista ganhou espaço entre o eleitorado, principalmente depois que Lula foi preso.
Para a segunda fase do pleito, tem o apoio apenas de Guilherme Boulos (PSol) e da vice Manuela D’Ávila (PCdoB), que o acompanha desde quando era apenas a vice do vice. Mas ainda parece não ser suficiente. Agora, o petista precisa se afastar de Lula, buscar o distanciamento do legado do governo Dilma — que sofreu um impeachment em 2016 —, se separar dos escândalos de corrupção envolvendo o partido e mostrar ser um gestor competente para reverter o cenário econômico do país. Esses são uns dos principais desafios de Haddad desde quando entrou na disputa eleitoral. “A bênção de Lula fidelizou o eleitorado, mas atingiu um teto. Agora, tem que apostar em outras coisas. O plano de governo é bom, mas sofreu mudanças para conquistar eleitores que não votaram no Bolsonaro no primeiro turno e ainda conversam com a esquerda. Mas Haddad é extremamente capacitado”, diz um integrante do partido.
Participaram das propostas de Haddad pessoas escolhidas a priori por Lula, seis meses antes da homologação da candidatura. Entre elas, estão o economista Márcio Pochmann e o ex-deputado petista Renato Simões. As consultorias do experiente Jaques Wagner, articulador político, com a postura mais radical de Gleisi Hoffmann, e o ex-presidente da Petrobras José Sérgio Gabrielli apresentaram medidas efetivas para o país que, no segundo turno, foram adaptadas. Para o deputado federal Carlos Zaratini (PT), Haddad fez um plano baseado na experiência dos projetos que o partido construiu por 13 anos. “São propostas que deram certo, mas agora estão focadas, sobretudo, em reverter a crise financeira e recuperar empregos”, acrescenta. “Márcio e Renato se destacam na área econômica, enquanto Jaques Wagner e Gleisi Hoffmann ganham enfoque no setor estratégico”.
Luiz Inácio Lula da Silva
Escolheu Haddad para ser o substituto dele nestas eleições. Manteve, desde antes de ser preso, em 7 de abril, o controle da campanha petista e o avanço do partido durante a disputa. Do Paraná, arquitetou as alianças políticas, sobretudo do primeiro turno, quando conseguiu que a sigla de Carlos Siqueira, o PSB, firmasse apoios pontuais ao PT, e deixasse Ciro Gomes (PDT), principal concorrente na ala da esquerda, isolado; fechou com Manuela D’Avila (PCdoB) para ser a “vice do vice” e, se precisasse, se tornaria vice oficial — como foi feito. Também aconselhou caciques petistas e mobilizou a militância de todo o país por meio de vídeos gravados anteriormente e cartas públicas.
Gleisi Hoffmann
Presidente do PT, Gleisi Hoffmann é peça importante no setor estratégico da campanha de Haddad. A relação entre os dois chegou a ficar estremecida durante o imbróglio em torno da candidatura de Lula — ela demorou a assumir que Haddad seria o sucessor do ex-presidente e, até o momento final, negou que houvesse um plano B. A deputada federal recém-eleita é responsável por fazer o meio de campo entre a população e Lula. Com a experiência na vida política e ligação com o ex-presidente, Gleisi foi peça-chave nesta trajetória — sobretudo com a militância.
Manuela D’Avila
Antes mesmo de firmar acordo com o PT, a deputada estadual do Rio Grande do Sul já defendia a união do campo da esquerda — entre PT, PCdoB, PDT e PSol — durante a pré-campanha presidencial. A parlamentar afirmava que só desistiria da própria candidatura se as siglas se apoiassem. Desde então, atua nas ruas com a militância, participa de atos onde ressalta as escolhas em prol de um futuro governo de esquerda e democrático e participou da elaboração de parte das propostas do plano de governo petista.
Jaques Wagner
Articulador político da campanha de Haddad, o senador eleito pela Bahia Jaques Wagner é quem mantém conversas com viés de apoio político e visão estratégica da trajetória do candidato até aqui. Uma das figuras mais respeitadas dentro do partido, Wagner saiu dos bastidores e defende a necessidade de outros políticos, mesmo de ideologias distintas, firmarem aliança com o correligionário. “Não precisa ser apaixonado pelo PT, pode até ter raiva do PT”, disse recentemente. O senador está firme na busca por aliados: conversa com interlocutores do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, com a candidata da Rede, Marina Silva, e Ciro Gomes (PDT).
José Sérgio Gabrielli (foto) e Márcio Pochmann
Ambos participaram da elaboração do plano de governo de Haddad. O ex-presidente da Petrobras José Sérgio Gabrielli desempenha a função de coordenador-geral da campanha de Haddad, enquanto o economista Márcio Pochmann é assessor econômico do candidato. Atualmente, Pochmann se divide entre a sala de aula da Universidade Federal de Campinas (Unicamp) e o escritório da Fundação Perseu Abramo, instituto de estudos políticos e econômicos fundado pelo PT em 1996. Pochmann foi secretário do Desenvolvimento da Prefeitura de São Paulo de 2001 a 2004; presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) de 2007 a 2012, e, em 2014, candidato pelo PT à Prefeitura de Campinas, mas não venceu o pleito.