Na última semana antes do segundo turno, os presidenciáveis apostam em estratégias diferentes para convencer o eleitorado. Enquanto Jair Bolsonaro (PSL) continua sem comparecer a debates e focado nas redes sociais, Fernando Haddad (PT) intensifica a campanha nas ruas, com a vice, Manuela D’Ávila, e seus apoiadores. Especialistas não acreditam em uma reviravolta, a não ser que aconteça um fato novo de grandes proporções.
Nas declarações mais recentes, o petista tem se colocado como a opção democrática no pleito, contra uma candidatura “perigosa” de extrema direita, segundo ele. Ontem, Haddad falou sobre o assunto após encontro com catadores de materiais recicláveis, em São Paulo. Afirmou ter “várias preocupações” quanto à democracia, a começar pela “ameaça ao STF (Supremo Tribunal Federal)”, em referência à fala do filho do capitão reformado do Exército, deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), de que bastam um soldado e um cabo para fechar a Corte (Leia mais na página 4).
Discursos parecidos são esperados nos próximos eventos dos quais Haddad participará. Hoje, ele estará no Rio de Janeiro para um “ato da virada” com Manuela, Chico Buarque e Caetano Veloso. Ontem, quando cumpriu agenda com catadores, Haddad também classificou Bolsonaro como “uma pessoa perigosa e que não faz questão de esconder isso”. Citou como exemplo de “absurdo” o discurso proferido pelo candidato do PSL no domingo, quando afirmou: “Essa turma, se quiser ficar aqui, vai ter que se colocar sob a lei de todos nós. Ou vão pra fora ou vão para a cadeia. Esses marginais vermelhos serão banidos de nossa pátria”.
Tentativas infrutíferas
Desclassificar pessoalmente o candidato do PSL, no entanto, já se mostrou infrutífero, observa o analista político Thiago Vidal, da Prospectiva Consultoria, uma vez que o eleitorado não se importa com as declarações polêmicas do capitão reformado. “Vimos o Geraldo Alckmin (PSDB) tentar bastante essa desconstrução, no primeiro turno, mas não adiantou muito”, lembra o especialista. Agora, a melhor estratégia pode ser atacar as propostas, mas sem ser muito agressivo, apontando as inconsistências do adversário. Uma desconstrução bem-feita pode repercutir durante toda a semana, até o domingo de votação. “O problema é que Bolsonaro tem um plano de governo estrategicamente vago, para evitar esse tipo de ataque”, explica Vidal.
Outra estratégia de Haddad vem das promessas populares, como baixar o preço do botijão de gás — afirmou que não passará de R$ 49 — e manter a universidade pública gratuita. Ele apela também para o programa Bolsa Família, afirmando que terá aumento de 20% a partir de janeiro, caso ele seja eleito. “Esse tipo de proposta, por um lado, é boa, porque consegue mais votos. Por outro, é ruim, porque ele se queima com o mercado financeiro e setor produtivo, que têm um discurso mais fiscalista”, pondera Vidal.
De seu lado, Bolsonaro segue a tática da campanha nas redes sociais. Após se reunir com empresários de diversos setores, comemorou, no Twitter: “Vamos juntos livrar o Brasil das garras ideológicas da esquerda!”. Mais cedo, o candidato se encontrou com representantes da Assembleia de Deus e com o ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST) Ives Gandra Martins Filho. Favorito entre cristãos e executivos, Bolsonaro recebeu um documento formulado por evangélicos, enquanto o motivo do encontro com o ministro não foi revelado. O magistrado entrou e saiu da casa do candidato sem falar com a imprensa.
Ofício de evangélicos
Entregue pelo presidente do Conselho Geral da Convenção da Assembleia de Deus no Brasil (CADB), Samuel Câmara, o ofício pede o compromisso do capitão reformado do Exército a favor “da preservação da vida humana desde a sua concepção”, da “formação familiar tradicional”, da educação pública “sem influência ideológico-partidária esquerdista e sem erotização de crianças”, pela redução do Estado e a retomada do crescimento econômico, e a favor da liberdade de pensamento e religião.
Para o cientista político Geraldo Tadeu Monteiro, coordenador do Centro Brasileiro de Estudos e Pesquisas sobre a Democracia, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), a estratégia de Bolsonaro de se afastar da mídia tradicional tem dado certo. Segundo ele, manter distância dos confrontamentos é o caminho ideal para seguir na liderança. “Há muito pouco tempo para uma reviravolta. Só um escândalo realmente muito forte, que atingisse a figura dele, poderia gerar uma grande comoção”, disse.