Jornal Estado de Minas

Eleições em MG revelam o fiasco dos prefeitos como cabos eleitorais

Os resultados que saíram das urnas no segundo turno derrubaram algumas máximas das eleições no país. Uma delas é que o candidato que tem maior tempo na TV leva vantagem na disputa e tem mais chance de ser eleito.


Foram vários os casos de candidatos que ganharam a eleição aparecendo bem menos que os adversários no horário de propaganda na televisão. O maior exemplo é o próprio presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL).

Outro mito que ruiu – e esse desabou em Minas – é que os prefeitos são os grandes cabos eleitorais dos candidatos ao governo do estado e que o apoio deles é meio caminho andado para uma vitória. Não foi o que se viu no estado.

O tucano Antonio Anastasia passou boa parte da campanha destacando que a maioria dos prefeitos mineiros apoiava a sua candidatura. Ainda no primeiro turno, ele chegou a calcular o tamanho dessa sustentação.

“Estimo que dos 853 prefeitos de Minas Gerais, devemos ter pelo menos hoje o apoio de 600. Temos apoio expressivo de prefeitos que estão contrários ao governo do estado”, disse em um encontro com lideranças da Zona da Mata, em 22 de agosto.

Na última semana de campanha no segundo turno, Anastasia participou de uma sabatina na Associação Mineira de Municípios (AMM) e foi ovacionado pelas lideranças municipais presentes no auditório da entidade. O “estreante” na política – e agora governador eleito – Romeu Zema (Novo), que concorria com ele, faltou ao encontro – explicou que teve problemas de agenda – e a comunicação de sua ausência à plateia acabou em uma sonora vaia.

Apesar da afinidade entre Anastasia e os chefes de executivo municipais, Romeu Zema ‘atropelou’ o candidato do PSDB e os prefeitos na eleição. Dos 853 municípios mineiros, ele venceu em nada menos que 832, ficando com 71,8% dos votos contra 28,2% do tucano no segundo turno.
Em algumas cidades das regiões do Triângulo e Alto Paranaíba, o empresário venceu com mais de 90% dos votos. Ele também foi vitorioso nos oito maiores colégios eleitorais do estado, incluindo a capital.

DESGASTE
As dificuldades financeiras das prefeituras, agravadas com os atrasos nos repasses do Governo do Estado e a força das redes sociais são citadas pelos prefeitos como os fatores que diminuíram o poder de transferência de votos deles. Alegam ainda que as limitações da propaganda eleitoral, como a proibição do uso de carro de som para divulgação dos candidatos, também contribuíram para que deixassem de ser os fortes cabos eleitorais de outrora.

Para o presidente da Associação Mineira de Municípios (AMM), Julvan Lacerda (MDB), os prefeitos de Minas perderam a capacidade de transferência de votos na eleição por causa do desgaste provocado pelas dificuldades financeiras ocasionadas pelo atraso de verbas do governo do estado para as prefeituras na gestão Fernando Pimentel. “Sofremos o efeito Pimentel”, afirma Julvan, que administra o município de Moema, de 71, mil habitantes, no Centro-Oeste do estado.

Segundo o presidente da AMM, os repasses em atraso do governo para os 853 municípios mineiros já chegam a R$ 9,5 bilhões, envolvendo recursos do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e de outras transferências obrigatórias.

Julvan Lacerda salienta que sem o repasse do estado os municípios ficaram de mãos atadas para realizar obras e atender às reivindicações da população. Assim, os chefes dos executivos municipais perderam a força política. “O prefeito ficou sem poder pedir votos porque não estava cumprindo com o seu dever. Quem na eleição iria querer acompanhar o prefeito que não estava fazendo sua obrigação?”, comenta.

Efeito das redes sociais


No Norte de Minas, tradicionalmente, os candidatos aos cargos majoritários apoiados pelos prefeitos vencem as eleições.

Mas, no segundo turno do pleito de 2018, Romeu Zema venceu com folga em quase todas as cidades da região, apesar de não ter o apoio dos gestores municipais. O prefeito de Grão Mogol, Hamilton Nascimento (PPS), avalia que os prefeitos ficaram “enfraquecidos” por causa das restrições da lei eleitoral, que proibiu, por exemplo, o uso de carros de som na campanha política, sem a presença do candidato. Ele acha que as redes sociais também tiraram a força eleitoral dos prefeitos.

Nascimento lembra que a as mensagens pela internet e pelo WhatsApp chegam “mais rápido” do que a propaganda e a divulgação de candidaturas no trabalho corpo-a-corpo. “Aqui no município existem comunidades distantes da sede. Enquanto eu rodo seis quilômetros de estrada, a propaganda do candidato já chegou há muito tempo em localidades a 100 quilômetros de distância pela rede social”, compara o prefeito norte-mineiro.

Grão Mogol é um exemplo de votação em peso em Romeu Zema no segundo turno por parte de eleitores que votaram em Fernando Pimentel (PT) no primeiro turno da eleição.

O petista foi o vencedor do primeiro turno no município, com 3.216 votos (45,66%) seguido de Antonio Anastasia, que recebeu 2.625 votos (37,27%), enquanto Zema ficou em terceiro lugar com 1.122 votos (15.93%).

No segundo turno o empresário “pulou” para primeira colocação em Grão Mogol, com 3.653 votos (59,02%) contra 2.536 votos (40,98%). O prefeito conta que no município existem vários assentamentos de trabalhadores sem-terra, cujos integrantes teriam votado em peso em Pimentel no primeiro turno e em Zema, no segundo turno.

Também no Norte de Minas, o prefeito de Janaúba (71,5 mil habitantes), Carlos Isaildon Mendes (PSDB), diz que os chefes de executivos municipais não transferem votos como em eleições passadas porque os eleitores mudaram de comportamento e não seguem mais as lideranças políticas.


Ele ressalta que na eleição de 2018 nomes já conhecidos, como o do senador Antonio Anastasia foram derrotados devido ao “sentimento de mudança” do eleitorado. “O houve foi um recado do desejo de mudança pelo povo. O Anastasia não perdeu a eleição por causa da falta de prestígio dos prefeitos”, assegura Isailson.

O chefe do Executivo de Janaúba declarou que no segundo turno tirou férias e não fez campanha para o candidato a governador pelo seu partido. “Não pedi voto nem para minha mulher”, confessa Isaildon. “Mas, mesmo se eu tivesse feito campanha (para Antonio Anastasia), talvez iria melhorar um pouquinho, mas não daria para ganhar a eleição”, reconhece. No segundo turno, Romeu Zema venceu fácil em Janaúba, com 23.710 votos (78,49%) contra 6.498 votos (21,51%) para o tucano.

 

 

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