A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, afirmou, após a prisão do governador do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão (MDB), que ele sucedeu o ex-governador Sérgio Cabral no comando da organização criminosa envolvida em esquema de corrupção e lavagem de dinheiro dentro do governo estadual. Em uma rara entrevista à imprensa, ela enfatizou, nesta quinta-feira,, 29, a necessidade de desmantelar organizações criminosas em todo o País e recuperar danos causados aos cofres públicos.
A investigação da PGR descreve Pezão não só como sucessor de Cabral após a prisão do ex-governador, mas como alguém que tinha seu próprio esquema criminoso. Ele teria recebido R$ 25 milhões em valores históricos, segundo o procurador Leonardo de Freitas, do MPF do Rio. Os valores são oriundos, em parte, de uma mesada paga pelo operador de propinas de Sérgio Cabral e agora colaborador premiado, Carlos Miranda, e, em outra parte, de desvios de recursos públicos ligados ao setor de transporte.
Também presente à coletiva, Freitas afirmou que houve "uma dança das cadeiras espúria com uma sucessão de pessoas após a prisão do primeiro time", de Sérgio Cabral. "O senhor Carlos Wilson (ex-secretário de gestão de Cabral) foi sucedido pelo Affonso Monnerat (secretário de Governo de Pezão). Hudson Braga, ex-secretário de obras de Cabral, foi sucedido por José Hiran, preso na data de hoje", disse o procurador.
"Há certa de dois anos, quando da prisão do senhor Sérgio Cabral, na Operação Calicute, nos fizeram uma pergunta que foi: e o Pezão? Nós não esquecemos a pergunta de vocês e estamos aqui hoje para responder a pergunta", disse o procurador.
Raquel Dodge explicou que a operação desta quinta tem como objetivo também coletar provas da lavagem de dinheiro. Ela não deu detalhes sobre uma das abordagens da investigação, que é sobre o envio de dinheiro para o exterior, mas falou que a operação ajudará a trazer mais detalhes.
Sobre provas já encontradas, o procurador Freitas afirmou que há várias e elas não se resumem a acordos de colaboração. "Posso destacar os bilhetes apreendidos ainda no bojo da Operação Calicute que faziam menção de alguma forma a 'Pé', 'Pezão' ou 'P', com anotações de valores do lado. Esses bilhetes são provas documentais apreendidas há cerca de dois anos e, com as colaborações e depoimentos, vieram a ser corroborados e autenticados", disse o procurador.
O fato de se estar a um mês do fim do mandato foi dito como irrelevante para a deflagração da operação. "Os pedidos foram apresentados no primeiro momento possível. A coisa do mandato foi faltando um mês, poderia ser a menos, poderia ser a mais. Mas será um mês a menos em que essas pessoas poderão usar a máquina pública para operar", disse.
Autora dos pedidos de prisão e buscas e apreensões ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), Raquel Dodge destacou que é uma missão da PGR e uma diretriz combater organizações criminosas e buscar o ressarcimento do dano causado aos cofres públicos, daí o sequestro de R$ 39 milhões (valores atualizados) autorizado pelo ministro do STJ Felix Fischer.
"Tenho enfatizado a importância de recomposição do dano. O sequestro de bens é necessário para que haja em tempo oportuno ressarcimento de danos", disse Raquel Dodge.
"As organizações criminosas precisam ser desfeitas e desbaratadas no País", continuou. "A entrevista é uma oportunidade de comunicarmos à sociedade brasileira a gravidade dos crimes que estão sendo praticados contra o patrimônio público. A corrupção desvia os recursos do patrimônio público e coletivo e, por isso, esse crime deve ser combatido com ênfase necessária para fazer cessar atos de corrupção", disse.
Dodge explicou que, diferentemente de parlamentares, o cargo de governador não exige uma ordem de prisão seja confirmada pela Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. "As medidas foram determinadas pelo Poder Judiciário e são suficientes em si", explicou.
Além de Pezão e dos secretários estaduais Affonso Monnerat e José Hiran, foram presos Luiz Carlos Vidal Barroso - servidor da secretaria da Casa Civil e Desenvolvimento Econômico; Marcelo Santos Amorim - sobrinho do governador; Cláudio Fernandes Vidal - sócio da J.R.O Pavimentação; Luiz Alberto Gomes Gonçalves - sócio da J.R.O Pavimentação; Luis Fernando Craveiro De Amorim - sócio da High Control Luis; e César Augusto Craveiro De Amorim - sócio da High Control Luis.
A operação foi batizada de Boca de Lobo - nome, como são chamados os dutos em vias públicas que receberem o escoamento das águas da chuva drenadas pelas sarjetas com destino às galerias pluviais. O nome da operação faz alusão aos desvios de recursos, revelados nas diversas fases da Operação Lava Jato, que causam a sensação na sociedade de que o dinheiro público vem escorrendo para o esgoto.