A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, denunciou o deputado federal Lúcio Vieira Lima, o ex-ministro Geddel Vieira Lima, a mãe dos dois políticos, Marluce Vieira Lima, e outras cinco pessoas pelo crime de peculato. Relatório da Polícia Federal concluído no início de novembro mostra que os Vieira Lima cometeram o crime ao pagarem empregados domésticos com verbas da Câmara dos Deputados. A denúncia foi protocolada pela chefe do Ministério Público Federal nesta quarta-feira, 5, e mostra que, somados, os valores desviados ultrapassam R$ 5,2 milhões.
Além de Geddel, Lúcio e Marluce, foram denunciados o irmão dos políticos, Afrísio de Souza Vieira Lima Filho, Valério Sampaio Sousa Júnior, Cláudia Ribeiro Santana, Milene Pena Miranda Santana e Paulo Cezar Batista de Melo e Silva.
"Muitos assessores trabalhavam para suprir os interesses domésticos, pessoais e dos negócios particulares de membros da família Vieira Lima. Dirigiam os dois carros privados (nunca viaturas, ou carros alugados com verba parlamentar); transportavam filhos e esposas no dia a dia; iam ao mercado, faziam compras; organizavam as contas do posto de gasolina da família; faziam contabilidade dos negócios agropecuários; cuidavam da saúde do pai doente, Afrísio Vieira Lima, nos últimos dias de vida, e também de Marluce, pessoa idosa. Foram, portanto, empregados domésticos pagos com dinheiro público", diz Raquel Dodge.
No documento, Raquel Dodge pediu que os acusados respondam por peculato com pena acrescida pela quantidade de vezes em que o crime foi praticado. Lúcio praticou o crime de peculato 520 vezes, de acordo com o MPF. A procuradora-geral também requereu que os envolvidos sejam obrigados a ressarcir os cofres públicos por danos materiais e que o valor seja corrigido desde a data do recebimento indevido e que paguem indenização por danos morais em valor equivalente ao dobro do total desviado. Por fim, a procuradora-geral pediu que seja decretada a perda da função pública dos acusados que ocupam cargo ou emprego público ou mandato eletivo.
O relatório da PF narra que nas mais de trinta inquirições realizadas confirmou-se que Lúcio Vieira Lima e família "se utilizavam de indicações de secretários/assessores parlamentares para contratar pessoas para exercer funções de cunho pessoal, sem qualquer ligação com a atividade parlamentar, incluindo piloto, motoristas que dirigiam para esposas e filhos dos parlamentares e empregados domésticos".
O delegado Bruno Benassuly Maues Pereira, que assina o relatório final da autoridade policial e é responsável pelo caso, concordou integralmente com o convencimento expressado pela procuradora-geral da República, em parecer enviado ao ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, em 10 de setembro.
Ainda de acordo com as diligências realizadas, diz Raquel Dodge, "são nomeações decorrentes da camaradagem, da amizade, favor, compadrio com outros políticos - levadas a efeito sem a mínima preocupação com os princípios republicanos como eficiência e interesse público na Administração Pública" e que "são pessoas que nunca puseram os pés na Câmara dos Deputados nem em representação parlamentar no Estado da Bahia", que "não têm e-mail institucional, não conhecem o regimento interno, não lidam com documentos públicos".
As investigações apontam que Job Ribeiro Brandão trabalhou por 30 anos como empregado doméstico da família Vieira Lima. Porém, seus salários, ao longo de 27 anos, foram bancados pela Câmara dos Deputados. Apesar de nunca ter exercido de fato função pública, segundo o relatório, foi nomeado e mantido secretário parlamentar, em momentos sucessivos, por Lúcio Vieira Lima, Geddel Vieira Lima e pelo pai dos políticos, Afrísio Vieira Lima.
Na denúncia protocolada nesta quarta-feira, Raquel Dodge destaca que, apenas no caso de Job, foram desviados R$ 4,3 milhões ao longo do período em que desenvolveu atividades privadas. Ele só foi exonerado em outubro de 2017, depois que as suspeitas de peculato se tornaram públicas.
"Além de instituir funcionário fantasma, a família apropriava-se dos salários de Job. No bojo do inquérito 4633, Job revelou que Lúcio Vieira Lima, Geddel Vieira Lima e Marluce Vieira Lima, a mãe, apropriavam-se de até 80% dos seus rendimentos pagos pela Câmara dos Deputados, todos os meses, há vários anos. Além disso, Job, Milene Pena e Roberto Suzarte não exerceram funções de secretário parlamentar, e sim de serviços à família e a seus negócios. Ou seja, também eram 'funcionários fantasmas'", narra o documento.
Raquel Dodge, no entanto, não ofereceu denúncia contra Job pelo crime de peculato porque o assessor revelou os aspectos do esquema que até então eram desconhecidos pelos investigadores.
Além de Job, Milene e Roberto Suzarte, as investigações revelaram um quarto funcionário fantasma, chamado Valério Sampaio Souza Junior. Ele foi nomeado secretário parlamentar de Geddel em 2010 e, a partir de 2011, passou a "trabalhar" vinculado ao gabinete de Lúcio. Ouvido, Valério Sampaio Sousa Junior afirmou que foi nomeado secretário parlamentar porque seu pai pedira um emprego aos irmãos Vieira Lima. "Ocorre que ele nunca trabalhou em Salvador/BA, nunca esteve em Brasília/DF, e não sabe sequer dizer onde ficam os escritórios de representação de Lúcio."
No caso de Cláudia Ribeiro, narra Raquel Dodge na denúncia, a Câmara dos Deputados gastou R$ 90,8 mil em salários, embora ela nunca tenha prestado serviço público. Residente em Teixeira de Freitas (BA), Claúdia, ao ser interrogada, não soube dizer onde ficam os escritórios de representação do deputado Lúcio Vieira Lima. A denúncia relata, ainda, desvios de recursos públicos decorrentes das nomeações de Milene Pena Miranda (R$ 26 mil) e Paulo Cezar Batista (183,8 mil).
A defesa da família Vieira Lima foi procurada pela reportagem, mas não retornou até a publicação desta matéria. Procurado, o deputado Lúcio Vieira Lima também não se manifestou. A reportagem tenta contato com os demais investigados..