Registrada em cartório no dia 27 de agosto do ano passado, a promessa do governador Romeu Zema (NOVO) de não receber salário até que o pagamento do funcionalismo público seja regularizado não pode ser cumprida. Menos condições ainda ele tem de fazer com que o vice Paulo Brant ou os secretários de estado também não tenham os vencimentos creditados nas contas. Diante do impedimento legal, ele anunciou no dia seguinte à posse que vai doar os R$ 10,5 mil recebidos mensalmente para instituições de caridade.
Segundo especialistas ouvidos pelo Estado de Minas, não seria possível ao chefe do Executivo determinar que os salários dos subordinados não fossem pagos. O que ele poderia fazer, desde que devidamente justificado, seria reduzir os valores.
A promessa de Zema, candidato mais rico da eleição com um patrimônio declarado de R$ 69.752.863,96, foi registrada no Cartório do 9° Ofício de Notas de Belo Horizonte. Em campanha, na ocasião, o governador disse que ele, Brant e os secretários não serão pagos enquanto houver funcionário ativo ou inativo com vencimentos, aposentadorias ou pensões em atraso e parcelamento.
Em entrevista à TV Globo nessa quarta-feira (2), Zema disse que vai doar o próprio salário e que a situação dos secretários, que tem direito a R$ 10 mil mensais, ficará a cargo de cada um.
Determinado em lei
O subcoordenador dos cursos de mestrado e doutorado de Direito da UFMG, Thomas Bustamante, afirma que apresentar uma promessa desta natureza é não compreender a verdadeira natureza de uma função pública. “É um trabalho e as cláusulas são fixadas em lei, ele não pode dispor sobre isso. Uma vez exercendo o cargo público, a pessoa faz jus à remuneração relativa a esse cargo. É inclusive necessário que receba para depois poder ser cobrado por qualquer desvio”, disse.
Os salários de R$ 10,5 mil do governador, de R$ 10,250 do vice-governador, e de R$ 10 nos secretários foram fixados na lei 16.658/07, que não dá outra alternativa de pagamento.
“A partir do momento que o dinheiro é depositado na conta dele e deixa de ser público para ser privado, ele pode fazer o que quiser com ele, mas não pode dispor das finanças públicas como se fosse algo privado. A lei não proíbe expressamente, mas ao fixar a remuneração, pelo princípio da legalidade, ela dispõe qual será a remuneração e como ela será recebida”, explicou o professor.
Segundo Thomas Bustamante, “pior” é a promessa em relação aos secretários. “Ele nomear alguém com a condição de não receber salário é algo absolutamente esdrúxulo, não pode dizer o que o outro vai fazer com o dinheiro dele, que é privado.”
O professor afirmou que mesmo que fosse reduzir os salários, Zema precisaria dar uma justificativa aceitável, que não poderia ser a solidariedade aos servidores públicos que recebem parcelado.
“Pelo princípio do fundamento determinante, uma medida dessas teria de ser analisada à luz de uma justificativa que poderia ser tornar o orçamento mais eficiente, por exemplo, mas para ser benevolente seria um argumento que não seria aceito por nenhum tribunal”, afirmou Bustamante.
Salário é fixado pela Assembleia
Segundo o advogado e professor de Direito Administrativo Raphael Maia, o novo governador dependeria da Assembleia para fazer uma alteração no seu subsídio, já que a fixação do valor é atribuição da Mesa do Legislativo.
“O governador poderia, já no discurso de posse, ter articulado a suspensão do subsídio com os deputados estaduais. Outra alternativa seria edição de um Decreto Regulamentar, estabelecendo a suspensão do pagamento dos subsídios do Governador, Vice e Secretários, enquanto perdurar o parcelamento dos demais servidores”, explicou.