Jornal Estado de Minas

Moro enfrenta resistência na Câmara para aprovação da lei anticrime


No primeiro corpo a corpo com deputados, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, percebeu que o caminho para aprovar o projeto anticrime no Congresso não será fácil. Além de enfrentar resistência da oposição, ele foi questionado até mesmo por aliados do governo sobre os fundamentos das alterações que pretende fazer e o resultado prático para a segurança pública caso as mudanças entrem em vigor. O ministro deixou a Câmara dos Deputados prometendo voltar e admitiu que poderá fazer alterações no texto, ante a insatisfação de setores do Parlamento. Sem um cenário favorável na magnitude que deseja ter entre os deputados, o próximo passo será conversar com os integrantes do Senado.

Na reunião realizada a portas fechadas, o magistrado apresentou a proposta que altera 14 leis. Durante a exposição, que começou às 14h de ontem e terminou após as 16h, o ministro assumiu que o trecho mais controverso é o que trata da prisão a partir da condenação em segunda instância de Justiça. Mas ele alegou que é grande a necessidade de se incluir na lei a possibilidade do cumprimento imediato da pena para evitar que o assunto seja retomado diversas vezes no Supremo Tribunal Federal (STF), com a possibilidade de revisão do entendimento sempre que for alvo de julgamentos na Corte.

Por meio de um sorteio, parlamentares puderam fazer questionamentos sobre a medida. As perguntas foram restritas aos sorteados e o ministro recebeu críticas pelo tempo limitado dado aos deputados. No entanto, ele se comprometeu a voltar outras vezes ou atender os congressistas sempre que for procurado.
“Esse é apenas um momento inicial para mostrar esse projeto. Infelizmente esse convite para falar aqui veio de surpresa. Mas já deixei bem claro ao presidente Rodrigo Maia e agora deixo ao senhores que a qualquer momento estou à disposição para conversar sobre essa proposta”, disse.

Ao sair do encontro, Moro admitiu que pode realizar alterações na proposta ainda nas próximas semanas. “O governo Bolsonaro quer convencer os parlamentares do acerto deste projeto. Temos que endurecer contra crime organizado, crime violento e corrupção. É o que foi orientado a fazer. Mas é uma reunião inicial.
Nós esperamos sugestões relevantes”, disse.

O ministro rebateu acusações de que o salvo conduto concedido a policiais em caso de mortes durante as atividades se trate de uma licença para matar. “Ninguém deseja a morte do criminoso. Ele tem que ser julgado segundo a lei. Mas se, infelizmente, isso acontecer, o policial não pode responder como homicida”, completou.

Integrantes da Frente Parlamentar de Segurança Pública foram os responsáveis por organizar o evento na Câmara e convidar o ministro. Além de deputados, alguns senadores, como a ex-juíza Selma Arruda (PSL-MT), compareceram à reunião. O deputado Túlio Gadelha (PSB-PE) criticou a ausência de dados e estudos que fundamentam as mudanças na legislação. “Esse projeto só pode começar a ser votado se tiver uma ampla discussão na sociedade e no parlamento. Não se ouviu quem entende do assunto, como especialistas em segurança.
Se trata milícia como organização criminosa, quando na verdade são organizações paramilitares. Não trata da superlotação nas prisões e outros problemas’, disse.

Supremo

Com forte repercussão no mundo jurídico, o projeto anticrime do ministro Moro pode enfrentar resistência no Supremo Tribunal Federal (STF). Nos bastidores da Corte, diversos trechos são considerados inconsistentes. Como a possibilidade do investigado assumir o crime para se livrar de uma pena mais alta, e ainda a possibilidade de prisão a partir de condenação em segunda instância.

O ministro Marco Aurélio Mello fez críticas públicas ao texto. Ele afirmou que as medidas anunciadas não reduzem a violência. “O aspecto formal não se sobrepõe à realidade. O endurecimento das normas penais não deságua necessariamente na ausência da prática criminosa”, disse.

Ele disse ainda que o cumprimento antecipado da pena não pode ser tratado via projeto de lei. “O impasse continua, porque acima da lei ordinária está a Constituição. O problema é o conflito com o cumprimento da decisão em segunda instância, um conflito com a Constituição e o princípio da não culpabilidade, e mais ainda a matéria está na pauta para o Supremo julgar”, afirmou..