A grave e precoce crise no governo federal envolvendo o PSL, partido do presidente Jair Bolsonaro, se arrasta a partir de ameaças, acusações e riscos de desequilíbrio na base parlamentar, prestes a receber o projeto de reforma da Previdência. Ao longo do dia, o ministro-chefe da Secretaria-Geral, Gustavo Bebianno, insistiu em se manter no cargo e chegou a advertir o Palácio do Planalto. Vinte e quatro horas depois de uma postagem do vereador fluminense Carlos Bolsonaro acusando Bebianno de ter mentido ao dizer que havia falado por três vezes com o chefe do Executivo sobre o esquema de laranjas envolvendo candidaturas do PSL, os interlocutores civis e militares tentavam encontrar uma saída para o caso.
Em meio a declarações de apoio e fortes ataques de parlamentares governistas, o principal apoio recebido por Bebianno veio do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, que se assusta com o desajuste na base e nos riscos para a reforma da Previdência. Em entrevista ontem à Globo News, Maia reagiu a Bolsonaro. “A impressão que dá é que o presidente está usando o filho para pedir para Bebianno sair. E ele é presidente da República, não é? Não é mais um deputado. Se ele está com algum problema, tem de comandar a solução e não pode, do meu ponto de vista, misturar família com isso, porque acaba gerando insegurança, uma sinalização política de insegurança para todos”, avaliou o presidente da Câmara.
O recado é claro e, segundo integrantes do Planalto, foi reforçado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, amigo de Maia. O desconforto sinalizado pelo presidente da Câmara, no entanto, se deve à ausência de articulação com o ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni. Ambos não têm bom convívio desde a última legislatura, quando o chefe da interlocução política do governo foi relator de um pacote de medidas de combate à corrupção. O então deputado foi acusado de descumprir acordos com os parlamentares. A possibilidade de queda de Bebianno fecharia o canal mais próximo que Maia tem de diálogo com o Planalto.
Depois do susto com a publicação de Carlos Bolsonaro contra Bebianno, os militares — incluindo o vice Hamilton Mourão — tentaram agir para debelar a crise, que aumenta com o passar do tempo. A dificuldade foi definir a estratégia, pois há um incômodo sobre a atuação do vereador desde a campanha, passando pela posse — quando Carlos desfilou em carro aberto sentado na capota recolhida, atrás do pai e da madrasta, Michelle Bolsonaro — e ao longo dos primeiros 45 dias de governo, principalmente com as postagens feitas no hospital, ao lado do chefe do Executivo. “Não havia entendido a razão de ele desfilar naquele carro aberto. Não fazia sentido, mas agora fica claro a unidade entre o filho e Bolsonaro”, disse um oficial das Forças Armadas.
Entre quarta-feira e ontem, Bolsonaro se reuniu com os ministros do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno; da Defesa, Fernando Azevedo; e da Secretaria de Governo, Santos Cruz. Conselheiros próximos a Bolsonaro, os generais alertaram para o risco de o governo passar uma imagem de enfraquecimento político em caso de demissão sem sequer dar a oportunidade de Bebianno se justificar. Interlocutores dos militares negam que os generais estejam acobertando o ministro. A preocupação maior, asseguram, é com a ingerência dos filhos sobre o presidente.
Congresso
A disputa de poder preocupa aliados no Congresso. Deputados temem que a instabilidade política interfira na aprovação da reforma da Previdência. Maia tem o poder da caneta na Câmara e pode pautar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) apenas se quiser. “E isso pode levar a pauta principal do país a ficar em segundo plano”, ponderou um deputado.
Dentro do PSL, a expectativa é de que tudo se resolva o quanto antes. Os deputados da legenda avaliam ser dever do governo aparar as arestas por entender que a bancada não tem nada a ver com a polêmica. Mas temem que a lentidão em dar uma resposta à situação de Bebianno respingue no partido. “Como vamos explicar o inexplicável? Ninguém quer acobertar nada. Quem o fez que seja responsável. Se justificar, é possível o clima ficar mais tranquilo. O problema é não ter o que dizer”, argumentou um deputado da sigla.
Apesar dos esforços de Bebianno, a permanência é vista como improvável. Depois das acusações de Carlos Bolsonaro, o ministro tentou fortalecer a estrutura da Secretaria-Geral, ampliando o quadro de assessores especializados em crises de imagem. O desejo, no entanto, foi vetado, sob argumento de que não pegaria bem ao Planalto chamar mais gente para uma pasta que já é tratada como morta. ( Colaborou Bernardo Bittar)