O governo de Minas Gerais tem poucos dias para decidir se entra como parte em uma ação bilionária na Inglaterra que pode garantir recursos para ajudar na crise financeira do estado. Trata-se de um pedido já apresentado por 21 municípios à Suprema Corte do Reino Unido para que a BHP Billiton, que divide com a Vale a sociedade na Samarco, pague pelos prejuízos causados às cidades pelo rompimento da Barragem do Fundão, em Mariana, em 2015. Vendo na participação do estado uma forma de dar mais força à causa, que pode ultrapassar R$ 24 bilhões (ou 5 bilhões de libras), municípios pressionam o governador Romeu Zema (Novo) a ingressar na ação. O advogado-geral do estado, Sérgio Pessoa, informou que a situação será avaliada.
Em 3 de novembro do ano passado, o município de Mariana e outros 23 ingressaram com a ação internacional contra a BHP pedindo o pagamento pelos danos causados às economias locais pelo desastre. Dias depois, a Fundação Renova, gerida por Samarco, Vale e BHP Billiton, propôs um acordo para pagar R$ 53 milhões aos 39 municípios afetados, mas exigindo que eles retirem as ações que tramitam na Justiça. Três cidades que haviam aderido ao termo inicial da ação aceitaram e desistiram da cobrança judicial, mas as outras 21 e quem mais quiser ingressar na fundamentação e nos pedidos da petição inicial têm até 5 de março para fazer isso.
Até o momento, o governo de Minas Gerais não ingressou na ação na Inglaterra. O estado faz parte de um termo de transação e de ajustamento de conduta (TTAC) fechado em 2016 que previa ações de reparação nos municípios mas, segundo as prefeituras que ingressaram na Justiça, o acordo não está sendo cumprido.
O prefeito de Mariana, Duarte Junior (PPS), disse que o município vai insistir com a ação e espera receber cerca de R$ 1,5 bilhão pelas perdas com a tragédia. “Alguns municípios que estavam em situação difícil aceitaram, mas não retirei (a ação) porque a Samarco não pagou Mariana. Os governos de Minas e federal erraram muito ao não permitir que os municípios afetados ajudassem na elaboração do primeiro TTAC e ficamos à mercê. Além disso, Minas Gerais perdeu uma bela oportunidade de cobrar por um direito que tem. Deveria ter acionado a Vale na Inglaterra”, disse.
Duarte Junior explica que, diferentemente da lei brasileira, a legislação da Inglaterra entende que a empresa que causou o dano deve pagar pelos tributos cessantes, que seria a arrecadação que ocorreria se a atividade não tivesse encerrado os trabalhos. Caso Minas ingressasse na ação, poderiam ser pedidos bilhões relativos a impostos. Em documento distribuído pela Samarco à época, a mineradora disse que a perda equivalia a 1,5 % do Produto Interno Bruto de Minas e reconheceu gerar, com a paralisação só em 2017 e 2018, perdas de R$ 2,6 bilhões em tributos federais, estaduais e municipais. No TTAC, no entanto, foi previsto o pagamento de apenas R$ 12.691.378,79 para Minas. “Isso é irrisório e nem foi pago”, diz uma das advogadas brasileiras que atuam no processo movido pelo escritório anglo-americano SPG Law.
Além de Mariana, entraram na ação as cidades mineiras de Aimorés, Bom Jesus do Galho, Engenheiro Caldas, Governador Valadares, Ipatinga, Itueta, Marliéria, Matipó, Ouro Preto, Raul Soares, Resplendor, Rio Doce, Santa Cruz do Escalvado, São Domingos do Prata, São Pedro dos Ferros, Tumiritinga e Periquito; Espírito Santo, Baixo Guandu, Colatina e Marilândia. Saíram da ação Alpercata, Galileia e Naque.
“É importante que o governador Romeu Zema se posicione, já que estamos informando que nada está sendo cumprido. Qual vai ser a determinação dele: uma intervenção mais firme em relação à Renova ou uma ação judicial como fez Mariana?”, questiona Duarte Junior. O prefeito cobra ainda R$ 30 milhões relativos a multas aplicadas pelo Ibama à época que deveriam ter sido repassados pelo ex-governador Fernando Pimentel (PT) ao município.
SUPORTE O presidente da Associação Mineira dos Municípios (AMM), Julvan Lacerda (MDB), também cobrou a participação do estado na ação contra a BHP. “É muito triste ver o que está acontecendo, estamos vivendo em um estado federado onde os entes não conseguem se unir. O estado não só tinha o direito de reivindicar como deveria ser o carro a puxar os municípios, que precisam desse suporte e participação. Até porque, nesta situação de flagelo financeiro, se conseguir algo seria um refresco não só para os municípios afetados mas para todos do estado”, disse.
O advogado-geral Sérgio Pessoa afirmou que não houve interlocução dos municípios sobre a ação, mas que vai avaliar a eventual participação do governo. Segundo ele, o acordo judicial fechado em relação ao desastre de Mariana está sendo observado “entre idas e vindas” e o que não estiver correto deve ser submetido a um juiz federal. Já em relação à ação dos municípios, ele disse que o assunto será discutido. “Estamos tomando conhecimento dessa medida para fazer uma avaliação oportunamente”, disse. Sobre os R$ 30 milhões que o prefeito de Mariana diz ter a receber, ele também afirmou que vai se inteirar da situação e que os compromissos serão cumpridos.
Sobre o fato de o governo Pimentel não ter acionado a Justiça na Inglaterra, o antigo advogado-geral Onofre Batista disse que Minas tem um acordo com a Vale em uma ação que tramitou no Brasil e que, por isso, acionar outro tribunal poderia ser considerado litigância de má-fé. “Uma vez tendo sido assinado um TTAC com a Justiça brasileira para o ressarcimento das multas, não faz sentido Minas entrar em outra jurisdição acionando uma das três empresas que estão no termo”, disse, mas ressaltou que a decisão será do novo advogado-geral.