Às vésperas de enviar a proposta de reforma da Previdência ao Congresso, o presidente Jair Bolsonaro tentou nesta segunda-feira, 18, encerrar a grave crise que há quase uma semana abala o governo e anunciou a demissão do ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Gustavo Bebianno. A queda de um de seus principais auxiliares, no entanto, está longe de representar o fim da turbulência no momento em que o Palácio do Planalto precisa fortalecer a articulação política no Congresso.
Em uma tentativa de amenizar o impasse, o presidente gravou um vídeo e combinou de postá-lo nas redes sociais, agradecendo a "dedicação e o comprometimento do senhor Bebianno". Foi uma estratégia acertada na última hora, para evitar que o ex-auxiliar saísse "atirando". A mensagem, porém, não havia sido publicada nas contas de Bolsonaro até a noite de segunda-feira, o que irritou o agora ex-ministro, segundo uma fonte próxima a ele.
Como revelou o jornal O Estado de S. Paulo, o general da reserva Floriano Peixoto substituirá Bebianno, que era até agora o único interlocutor do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), no Planalto. Atual secretário executivo da pasta, Peixoto será agora o oitavo ministro militar na Esplanada.
Na mensagem divulgada para aliados, Bolsonaro usou um tom apaziguador, de trégua, para se referir ao ex-auxiliar, a quem chamou de "senhor Gustavo Bebianno". "Comunico que desde a semana passada diferentes pontos de vista sobre questões relevantes trouxeram a necessidade de uma reavaliação", afirmou o presidente no vídeo, sem especificar as divergências.
"Avalio que pode ter havido incompreensões e questões mal entendidas de parte a parte, não sendo adequado prejulgamentos de qualquer natureza", completou ele, ao desejar a Bebianno "sucesso em sua nova jornada".
Antes, o porta-voz da Presidência, Otávio do Rêgo Barros, disse que a exoneração do ministro ocorrera por "razões de foro íntimo."
Ex-coordenador da campanha de Bolsonaro e responsável por levá-lo para o PSL, Bebianno caiu após um ruidoso embate público com o vereador Carlos Bolsonaro, filho do presidente. Na semana passada, Carlos chamou o então chefe da Secretaria-Geral de "mentiroso" por ele ter dito que havia conversado três vezes com Bolsonaro. Bebianno tentava com isso negar que estivesse isolado por causa de uma crise, mas foi desmentido por Carlos e pelo próprio presidente.
O clima azedou de vez após Bolsonaro ser informado de que o ministro deixara vazar para interlocutores mensagens de áudio com conversas privadas entre os dois. Antes disso, o nome de Bebianno também havia sido citado em denúncias sobre um esquema de desvio de dinheiro do Fundo Eleitoral do PSL para patrocinar candidaturas laranjas, em 2018.
"Acho que a questão entre o presidente e o ministro Bebianno tem mais problemas do que a questão dos laranjas", disse nesta segunda o vice-presidente Hamilton Mourão. "Agora vamos ver como colocar uma gaze úmida nessa queimadura de terceiro grau (no governo)", emendou a deputada Joice Hasselmann (PSL-SP), mostrando preocupação com o impacto da crise sobre o Congresso.
A "fritura" de um dos homens fortes do governo se arrastou por dias. Para evitar que a instabilidade contaminasse votações prioritárias para o governo no Congresso, como a reforma da Previdência, ministros do núcleo político, militares e até Maia tentaram convencer Bolsonaro a manter Bebianno no cargo.
O plano não surtiu efeito e os "bombeiros" políticos fizeram de tudo para construir uma "saída negociada", que não deixasse o ex-ministro na "chuva". Emissários do presidente chegaram a oferecer a Bebianno - que comandou o PSL em 2018 - uma diretoria de Itaipu Binacional e até uma embaixada em Roma ou em Portugal, para que ele saísse do Brasil. Bebianno, porém, não aceitou. "Tudo o que fiz foi por garra, não foi por emprego ou para ganhar dinheiro", disse o ex-ministro ao Estado. "O tempo é o senhor da razão".
O receio de auxiliares de Bolsonaro é de que, mesmo com os agradecimentos feitos pelo presidente, Bebianno seja o que no jargão político se chama de "homem-bomba" e aja para detonar o governo e o filho do presidente. A oposição, por exemplo, vai convidá-lo para prestar depoimento.
"Preciso pedir desculpas ao Brasil por ter viabilizado a candidatura de Bolsonaro. Nunca imaginei que ele seria um presidente tão fraco", afirmou Bebianno a amigos.
Áudio
Na prática, a gota d'água que levou à demissão do ministro - assinada no fim de semana, mas só anunciada nesta segunda - foi a divulgação de um áudio de WhatsApp no qual o presidente dizia a ele que não queria "aproximação" com a TV Globo.
O episódio ocorreu na última terça-feira, quando Bolsonaro, ainda internado no Hospital Albert Einstein, mandou o então ministro suspender audiência que teria com o vice-presidente de Relações Institucionais do Grupo Globo, Paulo Tonet Carvalho.
"Como você coloca nossos inimigos dentro de casa?", perguntou ele a Bebianno, segundo o site Poder 360. Para Bolsonaro, a divulgação do áudio foi uma "deslealdade". Um interlocutor do presidente confirmou o teor da mensagem ao Estado.