Candidato a deputado estadual pelo PSC, o ex-vereador Moamed Rachid recebeu R$ 250 mil por meio do fundo partidário, gastou R$ 146 mil em uma gráfica fantasma e teve apenas 707 votos na eleição de 2018. O candidato, que já foi vereador de BH por seis vezes e teve mais de 270 mil votos como candidato ao Senado em 1998, foi o segundo que mais recebeu recursos do partido para sua campanha, mas teve menos votos do que candidatos do PSC que gastaram menos de R$ 10 mil. Rachid negou ser parte em esquema de candidaturas laranjas e questionou a segurança das urnas eletrônicas.
A maior parte dos recursos foi gasta na gráfica ML Serviços Gráficos, que tem endereço no Bairro Fernão Dias, na Região Nordeste da capital mineira. Ao todo, foram gastos R$ 145.980 na gráfica, o que representa 60% de todos os recursos arrecadados por Rachid na campanha. Nesta semana, a reportagem do Estado de Minas foi até a gráfica e descobriu que ela não funciona no local há pelo menos três anos. A casa é agora um escritório de contabilidade.
O grande montante de verbas públicas gasto com a campanha de Moamed Rachid se contrapõe ao pequeno número de votos obtidos pelo candidato. Apesar de ser um dos que mais receberam repasses do PSC, ele ficou atrás de 29 candidatos da legenda. Entre os que tiveram mais votos estão candidatos que gastaram menos de 2% do que gastou Rachid. O candidato Adelino Cândido (PSC) gastou apenas R$ 300 e teve 955 votos. Cabo Zanola gastou R$ 40 mil e teve 21 mil votos. Já o candidato Cláudio Burrinho, que gastou R$ 108 mil, teve 19 mil votos.
Entre os três deputados do PSC que foram eleitos para a Assembleia Legislativa, apenas o presidente do partido gastou mais do que Moamed Rachid – R$ 821 mil – recebendo 114.807 votos. Os outros dois eleitos gastaram menos: Raul Belém gastou R$ 205 mil (teve 31 mil votos) e Gustavo Mitre gastou R$ 103 mil (teve 21,3 mil votos).
Em entrevista ao EM, o ex-vereador se disse surpreso com a baixa votação e avaliou que problemas em urnas eletrônicas podem ter afetado seu desempenho na eleição de 2018. “Já fui o terceiro mais votado em BH, tive cinco mandatos e, no sexto, obtive 4 mil e tantos votos e assumi como suplente. Fico me perguntando se as urnas são confiáveis, porque trabalhei muito para ganhar a eleição e não tenho motivo para brincar em uma disputa eleitoral. Em Minas, foram canceladas 7 mil urnas”, afirmou Moamed Rachid. De acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), no primeiro turno das eleições do ano passado foram substituídas 487 urnas eletrônicas em Minas. A troca não representou prejuízo para a contagem dos votos, uma vez que o órgão usa urnas de contingência quando ocorrem problemas técnicos nos aparelhos e a contabilização dos votos não é alterada.
Sem miséria
Moamed admitiu que não conhece a gráfica que contratou para produzir seu material de campanha, mas que o dono é seu conhecido há mais de 30 anos e sempre prestou serviços durante as eleições. “Gasto um monte de material gráfico, santinho, citru (adesivos) para carros, nada de mais. Se você olhar todas as minhas campanhas verá que eu gastei muito com material. Não tenho miséria com material. Nos últimos dias, eu gastei muito para mandar para algumas igrejas mais longe”, afirmou o ex-vereador.
O dono da gráfica ML Serviços Gráficos, Marciano Leite de Almeida, admitiu que não produz mais material de campanha no endereço em que sua empresa está registrada, mas que terceiriza os serviços. “Há algum tempo atrás, durante a crise, tive que vender o maquinário e passei a trabalhar apenas terceirizando os serviços. No caso (do Moamed), peguei o serviço e terceirizei com umas três gráficas”, disse Marciano.
Questionado sobre quais serviços prestados pelas gráficas na campanha de Moamed Rachid no ano passado custaram R$ 145,9 mil, Marciano informou que foram feitos “santinhos, santões, colinhas e critus. “Os proprietários das gráficas não autorizaram informar os nomes das empresas”, disse Marciano. Rachid também não soube informar quais gráficas produziram seu material de campanha. “Não sei se ele terceirizou ou como fez. Mas não sou candidato laranja. Não tive voto, mas pilantra eu não sou”, afirmou o ex-vereador.
Executiva Nacional
Segundo Rachid, o repasse dos R$ 250 mil foi feito pelo diretório nacional do PSC, mas ele não sabe quem definiu o valor. “Eles acreditaram que eu poderia ter uma votação muito grande, por já ter sido vereador seis vezes. Mas não sei como foi definido esse repasse. O presidente do PSC em Minas, deputado Noraldino Júnior, confirmou que o repasse foi feito diretamente da Executiva Nacional para o candidato e afirmou que os gastos de campanha são de responsabilidade do próprio candidato. No entanto, Noraldino disse que o resultado de apenas 707 votos para Moamed Rachid foi estranho diante de um gasto tão alto e que o partido poderá abrir um procedimento administrativo para apurar os gastos do correligionário. Procurada pela reportagem, a Executiva Nacional do PSC não retornou as ligações.
Entrevista
MOAMED RACHID/Candidato a deputado pelo PSC nas eleições de 2018
“Nem pedi esse dinheiro”
O senhor foi um dos candidatos que mais receberam verbas do fundo partidário do PSC e teve apenas 707 votos. Como gastou os recursos em sua campanha?
Não sei nem por que aconteceu isso. Eu já fui vereador, já fui o terceiro mais votado em BH. Já tive cinco mandatos, no sexto eu tive 4 mil e tantos votos, fui o primeiro suplente e cheguei a assumir. Fico me perguntando se as urnas são confiáveis. Porque trabalhei muito. Meu objetivo era ganhar eleição. Tenho 24 anos de vereador, não tenho motivo para brincar numa disputa eleitoral. Tenho um nome a zelar. Fiquei assustado com essa eleição. Não sei se o povo realmente não votou, ou, era bom até que vocês jornalistas pudessem ajudar, porque em Minas foram canceladas 7 mil urnas. Vocês têm que ir no TRE-MG e apurar isso. Só na Grande BH foram canceladas mais de 2,5 mil urnas. É onde eu mais trabalhei. Você veja que outros deputados perderam eleição, o Iran Barbosa (MDB) e o Vanderlei Miranda (MDB).
Mas, mesmo não eleitos, Iran Barbosa e Vanderlei Miranda tiveram mais de 30 mil votos cada um…
Mas o Iran era para ter mais de 50 mil votos. O Vanderlei era para ter mais de 50 mil votos. Essa eleição me surpreendeu muito. Eu trabalhei muito na Grande BH. Por ser evangélico é muito mais fácil eu conseguir votos. O que teve de gente trabalhando para mim para conseguir votos e os votos não apareceram. Tem alguma coisa que não está batendo. Se for contar só as pessoas que me ajudaram na campanha, contando os amigos e parentes, daria muito mais de mil votos.
Do total de gasto, o senhor gastou R$ 146 mil em apenas uma gráfica, a ML Serviços Gráficos. O senhor conhece essa gráfica?
Eu gasto um monte de material gráfico. Gasto com divulgação de pessoal. Gastei com uma empresa que trabalha comigo há muito tempo para divulgação de Facebook. O material que eu faço é normal, santinho, citru (adesivo) para carros. Não tem nada de mais. Sempre fiz muito material em todas as campanhas. Se você olhar todas minhas campanhas – 1996, 2000, 2004, 2008, 2012, verá que gastei muito com material. Não tenho miséria com material não. Nos últimos dias eu gastei muito. No final eu gastei em outra gráfica para mandar para igrejas mais longe. Foi de última hora. Não tenho medo de gastar com material. Temos que ter os santinhos para distribuir nas igrejas.
Nós fomos até lá e a gráfica não existe mais. O sr. conhece o dono e pode me contar os serviços que foram prestados?
Conheço. É o Marciano. Pelo menos eu creio que é ele. Uma pessoa que conheço há 30 anos. Ele sempre prestou serviço para mim nas campanhas. Não conheço a gráfica, mas ele é o responsável por fazer o meu material. Não sei se ele terceirizou o serviço. Não sou candidato laranja. Não tive voto, mas pilantra eu não sou. Pode pesquisar minha vida de cabo a rabo. Tive 11,4 mil votos para vereador.
Como foi o processo para conseguir o repasse de R$ 250 mil do PSC?
Eles acreditaram que eu poderia ter uma votação maior por já ter sido vereador por seis mandatos. Eu não sei nada não. Nem pedi esse dinheiro, na verdade. Eles tinham que mandar o dinheiro para Minas Gerais. Apostaram que depois do Noraldino eu seria o segundo mais votado. Na conta deles lá do partido com 25 mil eu teria sido eleito. E eu deveria ter 35 mil ou 40 mil votos pelo tanto de igreja que eu tinha. O voto não apareceu.