Brasília – A reforma da Previdência ainda nem começou a tramitar na Câmara e a pressão por uma mudança ministerial já ecoa na Esplanada dos Ministérios. A fervura vem de diferentes segmentos. De bancadas partidárias a temáticas, a reclamação é unânime em relação à comunicação feita até o momento pela articulação política do governo. Sem uma interlocução eficiente e uníssona, líderes e aliados avaliam que, cedo ou tarde, o presidente Jair Bolsonaro precisará substituir ministros para obter apoio capaz de aprovar agendas reformistas, como a própria proposta de emenda à Constituição (PEC) que atualiza as regras de aposentadoria. Ontem, Bolsonaro recebeu o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), no Palácio da Alvorada, para discutir a reforma da Previdência. Maia ficou no palácio por cerca de uma hora e saiu sem falar com a imprensa.
Nem aliados da bancada evangélica poupam a articulação. No Twitter, o deputado Marco Feliciano (Podemos-SP) fez duras críticas à comunicação, em comentário direto a Bolsonaro. “Está péssima. O ego daqueles que vocês elegeram está tão inflado que só enxerga seus umbigos. Alguns ministros estão deslumbrados com os holofotes”, reclamou. O deputado Pedro Lucas Fernandes (PTB-MA), líder do partido na Câmara, reforça o tom. “Tem muita gente falando pelo governo e o ruído acaba saindo estranho para as lideranças e bancadas”, alertou.
A defesa por uma reforma ministerial é capitaneada pelo DEM, que lidera o bloco vencedor das eleições da Câmara com outros partidos do Centrão. A ideia é ter mais nomes ligados para melhorar a comunicação entre Executivo e o Legislativo. Os parlamentares ainda evitam nomear publicamente os alvos, mas três ministérios são almejados. O do Turismo, gerido por Marcelo Álvaro Antônio, é o mais cobiçado. Ele é suspeito de liberar recursos públicos do fundo partidário para candidaturas laranjas nas eleições de 2018, quando era presidente do diretório estadual do PSL em Minas Gerais. Nem Bolsonaro o defende mais. No Parlamento, a avaliação é de que a queda é uma questão de tempo.
Outra pasta cobiçada é a da Educação, do ministro Ricardo Vélez Rodríguez. Além de ter um dos cinco maiores orçamentos da Esplanada, divisões internas despertaram a atenção. Depois da repercussão negativa sobre o pedido de filmagem de crianças cantando o Hino Nacional em escolas públicas, Vélez determinou o afastamento de nomes ligados ao filósofo Olavo de Carvalho, “guru intelectual” de Bolsonaro.
'TRAIÇÃO'
A determinação do ministro repercutiu mal entre os aliados de Olavo, a ponto de o episódio ser considerado por um deles como a “maior traição” dentro do governo até agora. O próprio Olavo, que indicou Vélez, reagiu às mudanças e sugeriu que os alunos deixem o governo. O ministro da Educação ainda é protegido por aliados do governo, como a deputada Bia Kicis (PSL-DF), mas o desgaste pode custar caro.
A bancada da bala no Congresso quer desmembrar o ministério da Justiça e Segurança Pública, de Sérgio Moro. A ideia é que o ex-juiz fique apenas com a Justiça. A indicação da especialista em segurança pública e política de drogas Ilona Szabó para um conselho de política prisional irritou parlamentares ligados a Bolsonaro. A pressão sobre o presidente desencadeou a exoneração da crítica do porte de armas e reforçou a ambição por parte da pasta comandada por Moro. A ideia de desmembrar o ministério da Justiça e Segurança Pública está prevista em uma emenda apresentada pelo senador Major Olimpio (PSL-SP) à medida provisória (MP) que reestruturou a organização dos ministérios.
NÚCLEO PRESERVADO
Os ministérios comandados por militares também são cobiçados no Congresso. Entretanto, a ambição deve ficar em segundo plano depois dos últimos movimentos do presidente Jair Bolsonaro. Na quinta-feira, o chefe do Palácio do Planalto afagou os oficiais das Forças Armadas. Pela manhã, declarou que liberdade e democracia só existem quando elas querem. À noite, convocou uma transmissão ao vivo em rede social para falar com a sociedade ao lado de dois generais, o porta-voz da Presidência, Otávio Rêgo Barros, e o ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI). Na interpretação de líderes e aliados, é o recado de que o núcleo militar será preservado na Esplanada.
A postura de Bolsonaro foi encarada no Parlamento como uma blindagem contra a fritura que o presidente sentiu após manifestações controversas nas redes sociais durante o carnaval. Embora a articulação política seja o principal alvo das críticas dos congressistas, o pesselista passou a ter a credibilidade questionada depois de usar as mídias para publicar comentários polêmicos durante as festividades — entre eles, a postagem de um vídeo obsceno na terça-feira.
Os militares dão um respaldo social para Bolsonaro e ajudam a reforçar a popularidade do presidente. Ao colar a imagem junto a oficiais de alto escalão, ele se protege do fogo amigo do Parlamento e passa o sinal de que eles serão a trincheira do presidente. “É como se estivesse dizendo que está bem protegido e que irá resguardar os sustentadores”, ponderou um aliado.
A permanência dos militares, entretanto, não é totalmente garantida. O deputado Coronel Tadeu (PSL-SP) não descarta a possibilidade de uma reforma ministerial conforme as dificuldades da articulação política aumentem. “Os militares não são os mais recomendados para conversar com o Congresso. Quando a situação apertar, vamos ver quem é base.” (RC)