A juíza Ivani Silva da Luz, da 6ª Vara da Justiça Federal, em Brasília, decidiu nesta sexta-feira, 29, proibir os atos de comemoração do aniversário de 55 anos do golpe militar de 1964. Em decisão liminar, a juíza atendeu a um pedido apresentado pela Defensoria Pública da União (DPU), e afirmou que o ato impugnado contraria o princípio da legalidade previsto na Constituição Federal, uma vez a legislação estabelece que a proposição de data comemorativa deve estar prevista em lei.
Leia Mais
É difícil prever consequências de comemorações do golpe de 64, diz vice do TJ-SPVítimas da ditadura vão ao Supremo contra pedido de celebração do golpe de 64MPF recomenda às Forças Armadas no RJ abstenção de comemorações ao golpe de 1964Comemoração de 1964 ficará dentro dos quartéis, diz Bolsonaro em entrevista na TV'Não considero um golpe', diz ministro das Relações Exteriores sobre 1964Onde estavam os ministros militares de Bolsonaro em 1964?Gilmar nega seguimento a ação de vítimas da ditadura contra celebração a golpeEditora vai dar desconto em todos os livros sobre o golpe militarComo o dia 31 cairá em um domingo, o Comando Militar do Planalto realizou nesta sexta-feira uma cerimônia para relembrar a data. O evento realizado em Brasília, contou com a presença do comandante do Exército, general Edson Leal Pujol. Mesmo assim, a juíza tomou a decisão liminar.
A juíza afirma que o "ato administrativo impugnado, não é compatível com o processo de reconstrução democrática promovida pela Assembleia Nacional Constituinte de 1987 e pela Constituição Federal de 1988" e que "afasta-se do ideário de reconciliação da sociedade, da qual é expressão a concessão de anistia e o julgamento de improcedência da ADPF 153, quando o Supremo Tribunal Federal recusou pedido de revisão da Lei nº 6.683/1979, mantendo ampla e irrestrita anistia aos crimes comuns, de qualquer natureza, quando conexos com crimes políticos ou praticados por motivação política".
"Nesse contexto, sobressai o direito fundamental à memória e à verdade, na sua acepção difusa, com vistas a não repetição de violações contra a integridade da humanidade, preservando a geração presente e as futuras do retrocesso a Estados de exceção", escreveu.
"Esse é o mote, inclusive, de sentença deflagrada pela Corte Interamericana de Direitos Humanos no 'Caso Herzog e outros', reproduzida ao Id Num. 43099478.
"Desse modo, a Administração Pública, jungida ao princípio da legalidade, não deve estabelecer celebração de data sem a previsão expressa em Lei, previamente debatida e aprovada pelo Congresso Nacional", escreve.
Reação
Nesta sexta-feira, o Instituto Herzog e a Ordem dos Advogados do Brasil enviaram à Organização das Nações Unidas uma denúncia contra Bolsonaro. O documento afirma que o presidente e outros membros do governo tentam "modificar a narrativa histórica do golpe que instaurou uma ditadura militar".
A determinação de Bolsonaro gerou uma reação de órgãos e entidades brasileiras, como o Ministério Público Federal e a DPU.
A ordem do dia nesta sexta, assinada pela cúpula das Forças Armadas e pelo ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, seguiu a determinação do presidente Jair Bolsonaro de "relembrar" o 55º aniversário do movimento cívico-militar. O documento foi lido na íntegra por uma civil.
O documento caracteriza a data como um "episódio simbólico". Em um dos trechos, afirma que "as Forças Armadas participam da história da nossa gente, sempre alinhadas com as suas legítimas aspirações. O 31 de março de 1964 foi um episódio simbólico dessa identificação".
O pedido
A magistrada acatou pedido do defensor público regional federal de Direitos Humanos do Distrito Federal Alexandre Mendes Lima de Oliveira. Em ação civil pública, também assinada pelos defensores públicos Alexandre Benevides Cabral, Amadeu Alves de Carvalho Júnior, Thaís Aurélia Garcia e Fernanda Cristine de Paula, Oliveira pede que "seja deferida a tutela de urgência" para que se determine que a União se abstenha de levar a efeito qualquer evento em comemoração a implantação da ditadura no Brasil (Golpe de 1964), proibindo especialmente o dispêndio de recursos públicos para esse fim".
O defensor ressalta ser necessária a proibição de gastos públicos com o possível festejo. "A ordem presidencial para comemoração do 'Golpe de 1964' deve ser executada no dia 31 de março de 2019 e a indefinição sobre o formato das comemorações pode gerar o dispêndio de recursos públicos em violação à moralidade administrativa e à memória de todas as pessoas que foram perseguidas, torturadas e assinadas durante a implantação do regime ditatorial no Brasil"..