Jornal Estado de Minas

'Governo terá dificuldade para aprovar', diz presidente da ALMG sobre recuperação fiscal

Apontado como o ponto de partida para um processo de recuperação financeira de Minas Gerais, o chamado Regime de Recuperação Fiscal negociado entre o governo estadual e a União deverá encontrar várias barreiras na Assembleia Legislativa. O alerta é do presidente da Casa, Agostinho Patrus (PV), que na noite de terça-feira reuniu-se com o governador do Rio Wilson Witzel (PSC) para discutir a experiência do único estado a aderir ao RRF.
 
“O projeto está sendo colocado como uma forma de solução de todos os problemas de Minas, e isso não é verdade. O governo terá muita dificuldade para aprovar esse projeto”, afirmou o deputado em entrevista ao Estado de Minas. Minas Gerais vem negociando as bases do acordo com a União, o que inclui medidas impopulares, como a privatização de estatais e aumento da alíquota da contribuição previdenciária de servidores. A expectativa do Executivo é que o projeto de lei prevendo o acordo chegue à Assembleia até o final deste mês.
 
Por que o senhor foi ao Rio de Janeiro discutir o projeto de regime de recuperação fiscal?
 
Queria conhecer, ouvir o governador e também o presidente da Assembleia (André Ceciliano), porque eles já aprovaram o plano há três anos. Ver as dificuldades encontradas, primeiro na aprovação do projeto, depois os benefícios que trouxeram e as dificuldades que tiveram no estado do Rio de Janeiro. O governo deixou muito claro que não é uma solução em si.
 
Esse projeto tem sido muito colocado pelo governo como um alternativa importante para o problema do caixa mineiro. Pela experiência do Rio, então o efeito pode não ser o esperado?
 
O governo lá foi muito claro ao dizer que isso (plano de recuperação) adia o problema.
Quais são os benefícios? O primeiro é deixar de pagar os juros da dívida com a União durante três anos, prorrogáveis por mais três. Ótimo, mas Minas já não paga os juros da dívida há nove. Então, esse benefício imediato não existe. Outro benefício que gera caixa, ou seja, diminui o desembolso, é aumentar a contribuição previdenciária dos servidores civis e militares. Nós votamos isso aqui em Minas, vamos dizer em maio, e a Câmara vota em junho (reforma da previdênca)? Traria para cá todo um desgaste e depois Brasília resolve diferente e nós vamos ter que adaptar?
 
O senhor é contra esse projeto?
 
Não estou contra, mas estou querendo dizer da dificuldade da aprovação. Dos 26 estados da federal, só o Rio de Janeiro conseguiu aprovar. Quem tentou? O Paraná, o Rio Grande do Sul, estados do Nordeste.
O projeto está sendo colocado como uma forma de solução de todos os problemas de Minas, e isso não é verdade. O governo terá muita dificuldade para aprovar esse projeto, tenho falado isso desde o início.
 
O governador tem essa consciência? No acordo firmado na semana passada com os municípios mineiros, para quitar a dívida que o estado tem com eles, foi dito claramente que o cumprimento depende desse plano de recuperação fiscal...
 
Ele (Romeu Zema) falou isso e nós fizemos uma nota. No acordo que foi assinado não existe nenhuma ligação a isso, nenhuma. Eu fiz questão de participar, de procurar o presidente do Tribunal de Justiça (Nelson Missias), então não existe correlação entre as duas coisas. Inclusive chamei aqui o presidente da Associação Mineira de Municípios (Julvan Lacerda) para dizer isso para ele, que não condicionasse a isso a expectativa dele de recebimento, porque é algo de difícil aprovação na Assembleia. Se fosse fácil tinha sido aprovado com facilidade no Rio.
 
O presidente da Assembleia do Rio, André Siciliano, do PT, me disse que fizeram três barreiras em volta da Assembleia, que foi invadida, teve manifestações. Não é um projeto que possa ser tratado como algo que vamos resolver de uma hora para a outra. Para privatizar qualquer coisa em Minas Gerais são necessários 48 votos, dois terços dos deputados.
Diferente do que era no Rio de Janeiro. Por que? Porque nós temos cláusulas na Constituição proibindo (privatizações), o que é um dificultador.
 
Vários deputados, inclusive da base, têm reclamado que até agora ninguém do governo veio até a Assembleia explicar como será o plano de recuperação, quais os bônus e o ônus. Essa ida do senhor ao Rio foi também uma resposta a essa falta de informações?
 
É, e também para ver uma experiência acontecida. Eu vou visitar outros estados que tentaram e não conseguiram. Eu fui lá no exemplo que foi vitorioso, mas vou ao Rio Grande do Sul e Paraná para ver qual foi a dificuldade encontrada lá.
 
O Rio de Janeiro fez um empréstimo de R$ 9,2 bilhões se compromentendo, como garantia, com a privatização da Companhia Estadual de Águas e Esgotos (Cedae). Três meses depois, a Assembleia apresentou um projeto revertendo a garantia. O governo vetou e a Assembleia do Rio de Janeiro derrotou o veto por 45 votos a zero. Então não é algo que se diz 'olha, é fácil de ser feito'.
 
E a dívida de R$ 2,9 bilhões está sendo arcada pela União.
 
O Executivo está jogando a responsabilidade para o Legislativo nessa questão?
 
Eu quero é fazer um alerta de que não podemos tratar um assunto tão importante como esse, de forma simples. Olha, nós vamos privatizar, olha nós vamos fazer, até a data tal já fiz isso. É isso que estou querendo mostrar.
Não estou querendo dizer que vai ser aprovado ou que vai ser rejeitado. O que eu quero dizer é o seguinte: o assunto precisa ser tratado com a complexidade que ele tem, por isso eu saí daqui e fui lá no Rio de Janeiro ontem (terça-feira). É importante que o parlamento tenha esse conhecimento e que a gente veja os casos em que foi aprovado e foi rejeitado. 
 
OUTRO LADO
 
Integrante da base aliada do governo, o deputado Guilherme da Cunha (Novo) afirmou que a adesão ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF) é, até o momento, a alternativa trabalhada pelo governo para equacionar a questão financeira no estado. “Se ele tem uma ideia melhor, estamos prontos para ouvir”, disse, referindo-se às declarações do presidente Agostinho Patrus.
 
O parlamentar ressaltou ainda que o governo mineiro ainda debate com representantes a União as exigências para o acordo, buscando cláusulas que sejam as melhores possíveis para o estado. “Todo o ajuste fiscal envolve o Legislativo e é preciso lembrar que é urgente a situação financeira do estado”, argumentou.

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