Não é só o Centrão que vai pressionar o governo por cargos. Na esteira da cobrança na Esplanada dos Ministérios estarão também militares, irritados com sinalizações do presidente Jair Bolsonaro e dos filhos, sobretudo o vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ).
Os oficiais das Forças Armadas contam com mais de 115 integrantes em postos do primeiro ao terceiro escalão, mas, cientes de que partidos do bloco governista ampliarão a tensão por espaço — mirando crescimento nas eleições de 2020—, aglutinarão forças para manter o prestígio em um momento que o governo tenta se articular para aprovar a reforma da Previdência na Comissão Especial.
Um dos problemas dos militares está nas declarações do escritor Olavo de Carvalho. Por mais folclórico que possa ser visto por grupos na Esplanada, os posicionamentos do pensador irritam os militares, que ganharam apoio do Centrão, bloco composto por partidos como DEM, PP, PR, MDB, PSD, PRB, PTB, Solidariedade e Podemos.
Olavo voltou a usar as redes sociais para sugerir que o vice-presidente Hamilton Mourão, o ministro-chefe da Secretaria de Governo, Santos Cruz, e o porta-voz da Presidência da República, Otávio Rêgo Barros, “obedeçam ao presidente e não encham o saco”. O problema é que não há desautorição em relação ao escritor.
Desde a posse de Bolsonaro, os oficiais das Forças Armadas saíram do ostracismo e passaram a ser atores relevantes no governo — mas vão buscar mais visibilidade depois dos ataques de Carlos. É um caminho que pode começar pela Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil), onde emplacaram o diretor-presidente, contra-almirante Sérgio Ricardo Segovia. Com o pedido de demissão do diretor de Gestão Corporativa, Márcio Coimbra, vão exigir um segundo integrante na empresa ligada ao Itamaraty.
A convivência entre militares e o Centrão no governo não foi um “céu de brigadeiro” até o momento. Disputas por espaço entre os mais de 10 mil cargos de livre nomeação os colocaram em disputas. No Ministério da Cidadania, por exemplo, o general Marco Aurélio Vieira, ligado a Mourão, não sobreviveu à disputa de poder e foi retirado da Secretaria Especial de Esporte, em derrota para a ala política ligada ao chefe da pasta, Osmar Terra, do MDB.
Os ataques de Carlos contra o vice-presidente, no entanto, mostraram aos dois grupos que as tentativas de um anular o outro só promovem desgaste. Agora, a meta é evitar o confronto e se unir para apaziguar os ânimos, em busca de um fortalecimento mútuo.
A relação entre as classes política e militar beneficia a ambos. Os militares têm poder e mais de R$ 176,3 bilhões de recursos para fazer quantidade imensa de obras, podendo alcançar poder estratégico muito maior do que já tem com apoio dos políticos nos estados.
O Programa de Parceria e Investimentos (PPI), responsável por políticas ligadas à área de infraestrutura, é ligado à Secretaria de Governo, do general Santos Cruz. O Ministério da Infraestrutura é comandado por Tarcísio de Freitas, capitão do Exército. Os dois ministros mantêm um ótimo relacionamento com parlamentares que, por sua vez, prometem intensificar a relação.
Os militares vão agir nos bastidores e fortalecer o Centrão com ações em suas respectivas pastas. Movimentações de união com apadrinhamento de indicados do baixo clero surgiram, mas foram abortadas para não levantar suspeitas, depois de ataques feitos por Carlos e Olavo. Líderes partidários no Congresso, entretanto, prometem crescer juntos com os oficiais na Esplanada. Com a reforma da Previdência na Comissão Especial, prometem endurecer o coro por cargos nos estados e no primeiro escalão, ou seja, ocupar ministérios.
Promessa
A promessa de pressão por parte da classe política é manter os militares em postos estratégicos, caso assumam uma pasta. “Nós não vamos competir contra os militares. Estaremos com eles. É perfeitamente plausível termos um ministério e eles ficarem com a secretaria executiva. Não são apegados a cargos”, afirma um líder do Centrão. O parlamentar usa, como exemplo, o ex-ministro-chefe da Secretaria-Geral, Gustavo Bebianno, do PSL, que tinha como secretário executivo Floriano Peixoto, o atual titular da pasta.
Os oficiais das Forças Armadas têm força ou influência em quase todos os ministérios. O sonho de consumo, no entanto, é se inserir no Itamaraty. A cúpula militar não gosta da política externa conduzida pelo ministro Ernesto Araújo. Julgam “entreguista” e pouco alinhada com os mercados orientais, onde o Brasil tem força com alguns dos principais parceiros comerciais, como a China. No relacionamento com os políticos, tentarão abocanhar espaço no Ministério das Relações Exteriores. Interlocutores políticos menos entusiasmados com a relação, alertam, contudo, para a classe política não cair no “canto da sereia”. “Não podem ser ingênuos. Os militares cresceram muito e temo pelo que pode acontecer”, alerta.
Apelo contra desidratação
O presidente Jair Bolsonaro tenta evitar a desidratação da reforma da Previdência. Encontrou-se ontem com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para conversar sobre a matéria. No Twitter, o presidente voltou a defender a aprovação do texto “sem muitas modificações”, alegando que, assim, poderá fazer mais pela população. Na publicação, divulgou um vídeo em que o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, anuncia que vai aumentar o horário de funcionamento de postos de saúde. “Com a Nova Previdência sem muitas modificações, poderemos mais, descentralizando poder, beneficiando estados e municípios. O Ministério da Saúde ampliará horário de funcionamento de unidades de saúde, entrega 88 veículos para o transporte de pessoas com deficiência.”