O engenheiro agrônomo Xico Graziano, de 66 anos, que deixou o PSDB para apoiar a candidatura de Jair Bolsonaro, sentiu na pele a ira dos grupos ligados ao escritor Olavo de Carvalho. Ao defender no Twitter a necessidade de o presidente negociar com o Congresso para aprovar a reforma da Previdência e outras medidas de impacto, Graziano virou alvo da "patrulha ideológica" virtual dos olavistas, que enxergam em qualquer composição política o velho "toma lá, dá cá". Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, ele critica o que chama de "seita direitista" e diz que, apesar dos ataques, continua a apoiar o governo.
Em 2018, o sr. deixou o PSDB, apoiou Bolsonaro nas eleições e foi cotado para ministro do Meio Ambiente. Nos últimos dias, passou a fazer críticas a bolsonaristas nas redes sociais. O sr. se arrependeu do apoio a Bolsonaro?
Não estou arrependido de nada. Estou procurando mostrar o meu desalinhamento de um grupo de radicais ligados ao escritor Olavo de Carvalho, que está com Bolsonaro. Quis marcar uma posição porque começou a ficar uma coisa claramente fascista. Dá a sensação de que nós trocamos uma quadrilha vermelha por uma seita direitista, interessada em atacar o globalismo e em fazer uma Revolução Cultural ao contrário, para combater o que havia antes.
O que despertou sua reação contra os olavistas?
Quando publiquei alguns comentários no Twitter defendendo a necessidade de Bolsonaro fazer política, negociar, sem que isso signifique necessariamente corromper, levei um pau danado desses caras - e não aceitei as pancadas que me deram. Eles falaram que não dava para negociar com esses políticos, que tinha de fechar o Congresso e o Supremo. Que negócio é esse? Na democracia, você tem de fortalecer os Poderes e não reduzi-los a pó. Sei quais são os defeitos dos Poderes, mas achei a reação exagerada. Vi que esse grupo estava influenciando mais do que devia o presidente, levado um pouco pela luta política, por todos os anos que eles ficaram apanhando. Parece que estão querendo dar o troco na esquerda. O troco já foi dado, com a vitória contra tudo e contra todos na eleição.
O sr. considera que foi vítima de um "linchamento virtual"?
Não me senti linchado, mas fui xingado. Eles não serão capazes de me linchar, porque já apanhei muito na vida e estou escaldado. Esses linchamentos que acontecem nas redes são tão pouco expressivos do que pensa a opinião pública que não dá para perder muito tempo com isso. O que eles dizem para você? "Você não é da nossa seita." Não sou mesmo. Sou contra as seitas. Odeio seitas políticas. O PT quis criar uma seita. Todo mundo era obrigado a achar isso ou aquilo. É preciso ter pensamento crítico, liberdade de opinião.
Qual sua opinião sobre o escritor Olavo de Carvalho e como vê sua influência no governo?
Não entendo muito o Olavo de Carvalho. Confesso que nunca prestei atenção nele e em suas posições. Mas vejo que a influência dele sobre os filhos do Bolsonaro, o Carlos e o Eduardo, é muito grande. Com o presidente, nem tanto, pelo que posso observar. O Bolsonaro é o presidente da República, tem de liderar o País. Como é que lidera um País sem conversar, sem mostrar tolerância? Tem pessoas neófitas em política que, em vez de aprender com quem ajudou a eleger Bolsonaro, ficam pegando no pé da gente, tacando pedras em mim. Depois de tudo o que fiz para ajudar o Bolsonaro ainda fico apanhando desses bobocas.
Várias personalidades que apoiaram Bolsonaro na campanha, como o músico Lobão, a deputada Janaina Paschoal, o empresário Flavio Rocha, e grupos como o MBL também têm criticado o radicalismo de Olavo e seus pupilos. Na sua visão, o radicalismo desse grupo está provocando um racha na direita?
Não sou entendido em direita. Fujo dessa armadilha de pensar como direita ou como esquerda. Nunca fui um cara de direita. Mas apoiei e apoio Bolsonaro. O mundo contemporâneo não cabe mais nessas caixas. O (ex-presidente) Fernando Henrique diz que você pode ser de esquerda ou direita, mas tem de ser decente. Eu apoiei o Bolsonaro porque não queria a volta do PT ao poder. Muita gente que votou nele não estava nem aí para o Olavo de Carvalho. O nosso sistema político está falido e o Bolsonaro ganhou a eleição por causa disso.
Nos anos 1980, o termo "patrulha ideológica" surgiu para designar grupos de esquerda que não aceitavam divergências. Hoje, o sr. acredita que ele poderia ser aplicado também à direita?
É patrulha, sem dúvida. Patrulha ideológica de sinal trocado. Agora, é um pessoal sem muita expressão. A gente se impressiona porque tem um pouco de força nas redes sociais. Mas por quanto essa direita "porra louca" foi responsável pela eleição do Bolsonaro? Uns 20%? Digamos que sim. Os outros 80% vieram de gente como eu, preocupada com segurança pública, que acredita que o capitão vai colocar ordem nisso aí. Não teve nada a ver com ideologia.
Na visão de muitos analistas, as crises ocorridas nesses cinco meses de governo se devem principalmente à ação de Olavo e de seus pupilos. O sr. Concorda?
Não acho que esse seja o problema. Acredito que se dá muito valor a isso. O problema maior é que o Bolsonaro ganhou a eleição sozinho, numa baita crise da economia. Imaginar que ele poderia botar tudo para funcionar em dois ou três meses não tem muita lógica. Agora, se daqui a um ano as coisas não estiverem andando, você poderá dizer que o governo tem um problema de gestão. Tem muita gente nova no governo. O Bolsonaro não foi governador, prefeito. Boa parte da força do governo se deve ao núcleo militar. São estrategistas, que têm uma formação adequada. Aí, de repente, vem esse pessoal da seita atacando e querendo derrubar os militares, dizendo que são aliados dos comunistas. Isso é uma loucura.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
POLÍTICA