Jornal Estado de Minas

Reforma da Previdência entra em nova rodada de negociações

Parecer de Samuel Moreira prevê aumento da CSLL dos bancos para 20% - Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados


Brasília – Longe de ter colocado fim à discussão sobre a reforma da Previdência na Câmara, a apresentação do parecer do relator, Samuel Moreira (PSDB-SP), deu apenas o pontapé inicial para a nova rodada de negociações. Os pedidos de mudanças no texto partem não só das categorias que se consideram as mais afetadas pelo projeto, como também de grupos que foram contemplados no relatório apresentado na última quinta-feira, como servidores públicos.

A esperança de quem está insatisfeito com o texto é a complementação de voto, pelo relator, ou, na hipótese de as conversas não terem resultado tão rápido, alguma mudança por destaque, no plenário. O parecer divulgado na quinta-feira não é definitivo e pode ser alterado quantas vezes Moreira considerar necessárias, ao longo das discussões na Comissão Especial. Depois, o texto ainda tem como mudar no plenário, desde que haja emendas, protocoladas no colegiado, que tratem do assunto em questão.

Aliados do governo concordam com a insatisfação do ministro da Economia, Paulo Guedes, pela retirada do regime de capitalização – que, afinal, era o que caracterizava a “Nova Previdência”, segundo ele. Deputados do PSL e do Novo já adiantaram que vão tentar retomar a possibilidade de migração do sistema atual, de repartição, para o de contas individuais.

Esse é um dos itens que serão alvo de destaque por integrantes do PSL, de acordo com o líder da bancada, deputado Delegado Waldir (GO), que defende um sistema de “poupança garantida opcional” aos novos trabalhadores. A ideia, entretanto, não estava na PEC do governo e precisaria ser detalhada em lei complementar. O relator preferiu postergar a discussão.

Ontem, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), usou o Twitter para afirmar que o novo texto da reforma será aprovado. “Quero reiterar, mais uma vez, que faremos a reforma da Previdência, porque ela é justa e vai ajudar a reduzir a pobreza e o desemprego no Brasil.
Estou seguro de que iremos aprová-la em julho na Câmara”, postou na rede social no início da tarde. “A gente tem um grupo de 15 partidos com o mesmo comprometimento, apesar de todo o desgaste provocado pela matéria. Mas, com a responsabilidade que temos com o Brasil, todos vamos votar e ajudar o país.”

Em um terceiro post citou a retirada da capitalização do texto. “A capitalização pode não entrar neste texto inicial, mas nada impede que seja aprovada no próximo semestre. O PDT, por exemplo, tem uma ótima proposta de capitalização, apresentada e debatida desde o período eleitoral”, afirmou Maia.

Além da capitalização, a retirada do Benefício de Prestação Continuada (BPC) deixou insatisfeitos integrantes do PSL. Deputados dizem que preferem a possibilidade de que o benefício seja opcional aos 60 anos, mas abaixo de um salário mínimo até os 70, como propôs o governo. O parecer de Moreira manteve as regras atuais, pelas quais idosos de baixa renda, a partir dos 65 anos, recebem um salário mínimo mensal.

ESTADOS E MUNICÍPIOS Outro tema que tem sido negociado por vários parlamentares, com a atenção do relator e do presidente da Câmara, é a reinclusão dos estados e municípios na reforma.
Eles foram excluídos do parecer, mas governadores e prefeitos trabalham para que voltem e possam ter as mesmas regras estabelecidas para a União. Assim, não precisariam fazer as próprias reformas, o que demoraria mais e geraria muito desgaste político.

Maia acredita que será mais fácil incluí-los novamente durante o debate no plenário, desde que os deputados de cada estado que tenha interesse na mudança colabore na votação. “Tenho acordo dos líderes para trazer os governadores para o texto, pode ser na comissão ainda, mas é mais fácil no plenário, por emendas”, disse o o parlamentar, na sexta-feira.

O líder do Novo na Câmara, Marcel van Hattem (RS), adiantou que pretende apresentar uma proposta para incluir os servidores estaduais e municipais já na comissão. “A gente quer trazer de volta propostas que sejam salutares para a reforma e, claro, que inclusive possam aumentar de novo o valor da economia”, afirmou, na quinta-feira, após a apresentação do parecer. O partido também quer retomar a capitalização e incluir uma regra de transição para aposentadoria de parlamentares.

CATEGORIAS ESPECIAIS Na Comissão Especial se discute mais flexibilização nas regras para professores. O líder do PL, Wellington Roberto (PB), já apresentou destaque para retirar do parecer todas as mudanças relativas à aposentadoria de professores. O parecer suavizou as regras para as mulheres, que passam a ter idade mínima de 57 anos, mas ainda não atendeu a todas as reivindicações do Centrão e da Comissão de Educação da Casa.

Os policiais também estão insatisfeitos. Os pedidos de mudança da categoria devem mirar em uma idade diferenciada de aposentadoria para policiais mulheres, de quem são exigidos os mesmos 55 anos dos homens.
Os destaques podem ser apresentados até o início da discussão do parecer no colegiado, que deve acontecer na próxima terça-feira.

Lido o parecer, na última quinta-feira, os deputados apresentaram um pedido de vista coletivo, o que suspende o início da discussão na comissão por duas sessões do plenário. O andamento da matéria não será prejudicado, porque a contagem começou na sexta-feira. Pela primeira vez em mais de um ano, houve número suficiente de deputados (51 dos 513) para abrir a sessão de debates no último dia da semana, o que foi comemorado por deputados governistas como um sinal de que o assunto deve avançar neste semestre.

* Estagiárias sob supervisão de Rozane Oliveira
 

Pontas a aparar no relatório



Pelo parecer apresentado na última quinta-feira pelo relator, Samuel Moreira (PSDB-SP), o ganho previsto em 10 anos com a reforma da Previdência ficou em R$ 913 bilhões, não tão abaixo do R$ 1,2 trilhão que o ministro da Economia, Paulo Guedes, considera ideal. Ainda assim, desagradou até a alguns dos deputados mais liberais, por ter incluído medidas controversas para diminuir as perdas com as concessões feitas nas regras previdenciárias. Depois da apresentação, o líder do Novo na Câmara, Marcel van Hattem (RS), comentou que “nada impede que o plenário possa reincluir determinadas questões que possam aumentar de novo a economia”.

Um dos pontos que o Novo questiona é o aumento da Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL) dos bancos. O relator sugeriu que passe dos atuais 15% para 20%, para diminuir o impacto das mudanças feitas no parecer. Moreira calcula que, com a medida, a arrecadação aumentaria em R$ 50 bilhões nos próximos 10 anos — mais do que os R$ 34,8 bilhões que renderiam, no mesmo período, as mudanças no Benefício de Prestação Continuada (BPC), que ele retirou da proposta.

No relatório, Moreira lembrou que, mesmo durante a crise econômica, o setor financeiro teve lucros. “Apenas entre 2017 e 2018, o aumento do lucro dos bancos foi de 17%, alcançando o montante de quase R$ 100 bilhões no ano de 2018”, diz o parecer. A necessidade de recursos adicionais mostra a importância de “adequar a tributação incidente sobre o setor à capacidade contributiva das instituições financeiras, bem como os efeitos neutros para o sistema tributário nacional da referida alteração. Propõe-se retomar a alíquota vigente até dezembro de 2018”.

Segundo deputados do Novo, o problema é que a medida acaba afetando, indiretamente, os mais pobres.
A legenda considera o aumento da tributação aos bancos tão relevante que a escolheu como assunto do único destaque de bancada a que tem direito durante a tramitação da reforma.

Outra compensação questionada por parlamentares é o fim do repasse de recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O parecer diz que o valor passará a ser usado para pagar despesas correntes com aposentadorias e pensões, acrescentando R$ 217 bilhões em 10 anos ao cálculo da economia prevista com a reforma. A ideia partiu de uma emenda do deputado Eduardo Cury (PSDB-SP), aceita pelo relator.

O líder da oposição na Câmara, Alessandro Molon (PSB-RJ), já se posicionou contra essa mudança, que considera um “gravíssimo erro”. “A medida estrangula o maior banco de investimento do país justo quando o Brasil precisa de investimentos e geração de emprego e renda”, criticou. O fim dos repasses pode, inclusive, atrapalhar o cronograma de devoluções de recursos do BNDES ao Tesouro. (AA)
 


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