Brasília – O governo de Jair Bolsonaro completa hoje seis meses de uma gestão marcada por medidas polêmicas nas áreas de educação, meio ambiente, direitos humanos e, sobretudo, por tropeços na relação com o Congresso e o Judiciário – o que é visto como o erro mais grave cometido no período. A partir do momento em que um presidente da República compõe forças com o Parlamento, o próprio Legislativo ajuda o Executivo a corrigir máculas e a defender as políticas de Estado. Não foi o que aconteceu. O capitão reformado tensionou o relacionamento com a criminalização da política, promoveu uma queda de braço com os poderes e governou isoladamente. Posturas que custaram desgastes e, para alguns, a sensação de que essa será, majoritariamente, a tônica da gestão.
Leia Mais
Reunião do G20 termina com saldo positivo para BolsonaroMoro foi alvo de críticas por aceitar Ministério, diz sitePSL vai decidir sobre destaques à reforma da Previdência na segunda-feiraGilmar suspende processos de acordos coletivos que reduzem direitos trabalhistas'Não é cedo para falar em reeleição agora', diz Marco FelicianoGoverno corre para aprovar reformas com temor de nova recessão econômicaA relação com o STF começou a ser melhor construída no fim do semestre. O presidente da corte, ministro Dias Toffoli, passou a frequentar solenidades no Planalto e a ser convidado para ouvir, opinar e construir diálogo em relação a propostas do governo. É o caso da regulamentação de posse e porte de armas de fogo e munições. O magistrado foi consultado antes da assinatura de outros quatro decretos e de um projeto de lei que versam sobre o assunto. Apesar da análise de insegurança jurídica feita pelo Ministério Público Federal (MPF) sobre o tema, ter aberto o canal de comunicação com o Judiciário conta pontos importantes.
A principal dificuldade para fazer com que a gestão Bolsonaro “dê certo” reside no relacionamento com o Congresso. No próprio Planalto é unânime a previsão de que o desafio central para os próximos seis meses é a construção de uma articulação eficaz com os parlamentares. Ao fim desses seis primeiros meses, Bolsonaro parou de tensionar a relação e admitiu que a interlocução feita pela Casa Civil, sob o comando do ministro-chefe Onyx Lorenzoni, não funcionou. Transferiu a missão para a Secretaria de Governo, que, a partir de julho, será chefiada pelo general Luiz Eduardo Ramos. Só isso, no entanto, não será eficaz. A mera troca de articulador não resolverá os problemas. Será preciso dar poderes ao militar, estabelecer diretrizes e estar pronto para “retornar ao que era feito em governo anterior”, como disse ele mesmo: dialogar e ceder espaços para indicações de aliados.
O tempo para o presidente mudar a interlocução está contando. Depois que a reforma da Previdência for aprovada na Câmara, o vácuo entre Executivo e Legislativo vai se ampliar. Com o protagonismo que a Casa passará a ter, sob domínio do presidente, Rodrigo Maia (DEM-RJ), o clima de “parlamentarismo branco” se ampliará. A menos que uma articulação seja bem construída e norteada com apoio de membros do alto clero do Centrão dispostos a rachar o bloco político informal para apoiar o governo. Afinal, o governo não poderá se ancorar por muito tempo na liberação de emendas – que, por sinal, estão atrasadas – depois da aprovação da PEC 34/2019, que torna todas as emendas impositivas.
Base de apoio Os diálogos e acordos precisarão ser benfeitos. Afinal, seria uma árdua tarefa para a articulação política negociar projeto a projeto com o Congresso enquanto ainda enfrenta crises, como a fritura proposta pela oposição ao ministro da Justiça, Sérgio Moro, alerta o líder do Podemos na Câmara, José Nelto (GO). “Se o governo não fizer a base, vai sangrar pelos próximos três anos e meio. O conselho que eu dou é agir politicamente agora para começar a pavimentar a construção da base, que, efetivamente, deve ficar pronta depois da aprovação da reforma da Previdência”, destaca.
Assim como o governo admitiu que a liberação de emendas é um instrumento importante de aceno aos parlamentares, ao acenar com o pagamento de R$ 2 bilhões, o Planalto precisará valorizar as bancadas e líderes partidários dispostos a “ser governo”, recomenda Nelto, um dos líderes aliados da articulação política feita pelo líder do governo na Câmara, major Vitor Hugo (PSL-GO). “Essa é a boa política. Ele tem que fazer sua base com ela. Fazer tudo com transparência, na verdade. Não pode enganar a sociedade. Não custa explicar que vai construir a base, dizer ‘quem quer participar de ministério aqui ou de empresas aqui’. O governo é de coalizão. Essa é a verdade e a sociedade entende. O que ela não quer é a roubalheira”, sustenta.
A base, insiste Nelto, passa pela construção de pessoas e partidos que queiram participar e não queiram se envolver com propina, “como era no passado”, ressalta o líder do Podemos. “Tudo, sabendo que é um governo de direita, liberal, com forte atuação dos militares. O governo tem que chamar e conversar com os partidos. Não faz nada sem eles. Tem que ter uma agenda e fazer isso dentro das discussões das reformas da Previdência, tributária, política, penal, do Pacto Federativo, e da abertura do sistema financeiro”, pondera.
O governo admite que a construção de uma base pré-formatada sem o presidencialismo de coalizão não garante um grande apoio de sustentação, diz Vitor Hugo. No entanto, ele avalia que, melhor do que compor da forma como se compunha antigamente, é compor o mérito dentro do possível. “Nossa meta é chegar a meios termos que assegurem suporte para a aprovação das matérias. E faremos isso com muito diálogo e respeito com o Parlamento”, afirma.
.