Brasília – O “pacto de entendimento” entre os Três Poderes sinalizado pelo governo federal no fim de maio subiu no telhado e ficou no esboço. Mas o Congresso arregaçou as mangas e iniciará um debate que promete tirar o compromisso do papel, colocá-lo em prática e unir Executivo, Legislativo e Judiciário em uma agenda comum.
Quando o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP) criou uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) para investigar ataques cibernéticos, na quarta-feira, ele ampliou e fortaleceu uma discussão que começou na Câmara, por meio de audiência pública. Serão 15 deputados e 15 senadores a compor o colegiado. Além disso, intensificou uma articulação feita nos bastidores com o Supremo Tribunal Federal (STF).
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Operação policial combate crimes cibernéticos em seis estadosCPI dos Crimes Cibernéticos sugere proibição a bloqueios do WhatsAppCrimes cibernéticos já dão cadeia no paísParlamento são de que o Executivo vai entrar de bandeja na discussão. O deputado Filipe Barros (PSL-PR), vice-líder da legenda na Câmara, apresentou ao STF um pedido de suspensão da CPMI – assinado somente por ele –, questionando que a intenção é “instaurar o crime de opinião”. Um dos objetivos do colegiado é apurar o uso de perfis falsos e a influência disso em resultados das eleições de 2018.
A demanda do parlamentar, no entanto, deve naufragar. Juridicamente e politicamente.
No STF, a estratégia é jogar a análise para depois do recesso. Responsável pelo tribunal no período de paralisação das atividades, o presidente da corte, ministro Dias Toffoli, não trata o assunto com urgência e deixou para ser apreciado após a retomada das atividades, em agosto, pelo relator, ministro Ricardo Lewandowski. A aposta, no entanto, é pela manutenção das atividades no colegiado.
O STF atua para suspender CPMIs somente em casos de extrema afronta à Constituição. Na corte, não é essa a avaliação de ministros no caso do colegiado criado, dizem assessores.
A própria discussão é de interesse pessoal de alguns magistrados, como Alexandre de Moraes e Toffoli, que, em abril, instaurou inquérito sigiloso para investigar ataques em redes sociais contra ministros da corte. O próprio Toffoli é um dos mais interessados na continuidade da CPMI.
Há cerca de duas semanas, em Brasília, jantou com representantes da bancada do DEM – inclusive o presidente nacional do partido, o prefeito de Salvador ACM Neto –, em um encontro no qual procurou apoio do Congresso para entender como identificar a origem dos crimes cibernéticos e como se disseminam as fake news.
PUNIÇÕES
Do jantar entre Toffoli e a bancada do DEM, se intensificou a articulação para a criação da CPMI, com base em requerimento apresentado pelo deputado Alexandre Leite (DEM-SP), escolhido para presidir a comissão.
O líder da legenda na Câmara, Elmar Nascimento (BA), discutiu com outros líderes o uso das investigações feitas no colegiado para subsidiar a criação de proposições legislativas para estabelecer punições mais rígidas a quem comete os crimes na internet. Um dos próprios objetivos da CPMI é investigar “ataques cibernéticos que atentam contra a democracia e o debate público”, além do cyberbullying e o aliciamento de crianças para o cometimento de crimes de ódio e suicídio.
A desconstrução de imagens pelas fake news virou um motivo de briga pessoal dentro do Congresso e do STF. No Parlamento, a retórica é de que o mesmo está ocorrendo com Moro e, por isso, buscam trazer o governo para o debate.
“A questão é muito mais a tentativa de desconstruir a imagem do Moro do que o crime no processo de vazamento das conversas entre ele e a força-tarefa da Lava-Jato”, pondera uma liderança do DEM. A ideia é estabelecer penas extremamente rigorosas para violações cometidas na internet. A ideia é prever, em média, o dobro da punição que existe atualmente e transformar todo crime cometido na web em ação civil pública, e não em ação privada.
O artigo 154-B do Código Penal estabelece que só há denúncia em casos de crimes cibernéticos quando a vítima manifesta vontade judicialmente. A ideia da CPMI é discutir proposições que alterem a legislação para que o Ministério Público (MP) e as polícias civis e federal possam atuar sem a necessidade de representação.
Além disso, a ideia é ampliar o artigo 154-A, que prevê como crimes apenas a invasão de dispositivos informáticos mediante violação indevida de mecanismos de segurança para quem obtém, adultera ou destrói dados.