Jornal Estado de Minas

Sem acordo com União, políticos mineiros prometem briga por verbas da Lei Kandir

Sem acordo com os estados para compensar as perdas da Lei Kandir, a União promete usar recursos arrecadados com leilões de campos de petróleo para aliviar os cofres estaduais. A proposta desagradou governadores e parlamentares, que prometem briga com governo federal. 

Na reunião desta segunda-feira (5) no Supremo Tribunal Federal (STF) o sentimento foi de um balde de água fria para os governadores e parlamentares que esperavam algum entendimento com representantes do governo federal sobre o ressarcimento das perdas desde que a lei entrou em vigor.

Estado mais prejudicado com as isenções fiscais para produtos primários, Minas Gerais deixou de arrecadar R$ 135 bilhões nas últimas duas décadas.

Para o presidente da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), deputado Agostinho Patrus (PV), a forma como a União tratou os estados foi “desrespeitosa” e as lideranças políticas mineiras não devem aceitar a falta de acordo para ressarcir os cofres estaduais.

“Parece que o governo federal não entende o Brasil como uma federação. As desonerações nos custaram uma saúde de mais qualidade, uma educação deficitária, dificuldades na infraestrutura e na segurança pública. Minas Gerais foi destratado e não aceita essa posição e e coloca frontalmente contra ela. Não é possível que diante de uma reunião em cima de uma decisão já tomada pelo Supremo os representantes do governo federal não apresentem nenhuma proposta”, criticou Agostinho Patrus.


Os parlamentares mineiros lamentaram a falta de acordo e prometeram começar a partir de amanhã uma mobilização para unir outros estados e cobrar uma postura diferente do governo federal.

“Amanhã (terça-feira) participo do fórum de governadores e vou levar as informações discutidas aqui. Vamos buscar somar forças para lugar por essas questões. Entendemos que a federação deve ser harmônica e o tratamento da União não pode ser da forma desrespeitosa como foi feito aqui hoje”, disse Agostinho Patrus.

Ele entregou ao ministro Gilmar Mendes, do STF, a Carta de Minas, um documento que foi assinado por representantes de todos os poderes do estado e que apresentou uma proposta de compensação aos cofres mineiros para os próximos 60 anos de forma parcelada.

Ao final da audiência, Mendes recomendou a criação de uma comissão formada por representantes dos 26 estados e do Distrito Federal para discutir uma proposta de acordo com a União que será apresentada em seis meses.

Durante o encontro, o governador Romeu Zema (Novo) ponderou que as perdas de Minas Gerais foram significativas desde que a Lei Kandir entrou em vigor e que é preciso uma forma de compensar o estado que também sofreu com dificuldades na infraestrutura por sua característica de exportador.


“Temos de lembrar que um estado como Minas, eminentemente exportador, que durante décadas vem contribuindo para o saldo da balança comercial do Brasil, acaba sendo mais utilizado do que outros estados em termos de infraestrutura. Nossas rodovias e ferrovias são usadas de forma muito mais intensa”, disse Zema.

Ao final do encontro, o governador prometeu avaliar todas as opções políticas e jurídicas que estado terá em busca dos recursos. “Minas demanda urgência e precisa desse recurso para ontem. Infelizmente, contra nossa expectativa nada será resolvido ainda esse ano. Mas vamos continuar lutando porque é algo que é direito de Minas. Tudo que for possível fazer em termos jurídicos e políticos nós vamos fazer”, afirmou Zema. 

Na audiência de conciliação do STF, o secretário especial da Fazenda, Waldery Rodrigues (que representou o Ministério da Economia) prometeu repassar aos estados e municípios 15% do valor líquido que a União receberá do megaleilão do petróleo marcado para outubro. Ele estima que o montante será de R$ 11,5 bilhões

Além de prometer parte dos recursos dos leilões de campos de petróleo, os representantes do Ministério da Economia e da Advocacia Geral da União (AGU) que participaram da audiência no Supremo propuseram o aumento de 50% nos recursos do Fundeb (Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica).


Os interlocutores da União avaliaram que não seria possível ressarcir os estados diante do cenário crítico dos cofres federais.
 
Para o deputado Sávio Souza Cruz (MDB) a União não leva em conta as perdas que Minas Gerais teve ao longo das últimas décadas e os prejuízos que a Lei Kandir causou para a população do estado.

“Essas propostas não levam em conta o peso que a questão da exportação de produtos primários tem na economia de Minas. É preciso estabelecer uma compensação específica para isso. Minas não perdeu só R$ 135 bilhões, mas perdeu um projeto de desenvolvimento econômico”, disse o emedebista, que criticou as propostas apresentadas pela União no encontro. 

O governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), também lamentou a falta de acordo com a União e criticou a continuidade das regras que causam perdas na arrecadação dos estados.

“A Lei Kandir não pode continuar sendo lesiva ao estados, como Minas e Pará, que atuam fortemente na exportação de produtos primários. Lamentavelmente o conceito de 'mais Brasil e menos Brasília' falado pelo governo federal não é o que se vê no dia a dia”, criticou Barbalho.

Novela da Lei Kandir 

A disputa sobre a compensação aos estados pela Lei Kandir se arrasta desde 2013, quando o governo do Pará ajuizou uma Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) questionando o Congresso Nacional por não regulamentar a forma que a União deveria ressarcir os estados que deixaram de arrecadar com a lei. 

Em 2016, o Plenário do Supremo acatou o pedido do Pará e estabeleceu prazo de 12 meses para a regulamentação da lei. Caso isso não ocorresse, o tribunal determinou que o Tribunal de Contas da União deveria fixar em caráter provisório o montante total devido e a cota de cada ente federativo, até a edição da lei. Em 2017, o governo federal pediu que o prazo fosse prorrogado por mais 24 meses. 

Em fevereiro deste ano, o ministro-relator do processo Gilmar Mendes atendeu a um pedido da Advocacia-geral da União (AGU) e concedeu mais 12 meses para que o Congresso delibere sobre a compensação financeira aos estados.
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