Os brasileiros estão indo de mala e cuia para o exterior. Dispara o número de declarações de saída definitiva do país entregues à Receita Federal, indicando o aumento da expatriação. Nos primeiros sete meses do ano, documentos registrados na instituição somavam 94% do total de declarações registradas em todo o ano passado, que já havia sido recorde, com 23.149 comunicados. Neste ano, a expectativa é de que essa quantidade seja superada, pois até 28 de julho haviam sido apresentados 21.873 documentos.
A onda migratória de brasileiros vem tomando corpo desde 2016, quando a crise política e econômica se agravou e houve o impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT). Enquanto em 2015, 14.920 deixaram o país em definitivo, no ano seguinte, esse contingente subiu 41%, chegando a 21.040. O levantamento mostra também que, de 2011 a 2018, houve um aumento de 183% nas declarações, que passaram 8.170, em 2011, para 23.149.
A comunicação de saída definitiva à Receita Federal é obrigatória a todo contribuinte que se mudar do país definitivamente ou àqueles que ficam mais de um ano fora. A empreendedora e coaching de negócios Paola Tucunduva, de 51 anos, entregou em janeiro à Receita Federal a documentação. Ela e a família se mudaram no início de 2018 para Sunny Island, na Flórida, nos Estados Unidos. E a intenção é ficar, sem pensar em voltar ao Brasil.
“Decidimos fazer uma mudança planejada para trazer para os filhos a perspectiva de viver num país com economia mais estável”, conta. O primogênito, Mathias, de 21, chegou antes, para fazer faculdade na Califórnia e motivou a guinada na vida da família. Paola e o marido, Roberto, que é advogado, venderam uma lavanderia industrial em São Paulo e redirecionaram os investimentos para os EUA, o que fez com que eles aplicassem para uma categoria de visto específica para investidores, o EB-5.
“A gente adora desafio. Isso mobiliza e motiva a gente. A sensação de segurança e a estabilidade econômica são pontos fortes. É um desafio de começar do zero num país diferente. Nossa experiência de vida ajuda a acelerar o processo. Mas, para recomeçar, tem que ter muita humildade”, avalia. Ela recomenda cautela e planejamento para quem quer emigrar. “Às vezes, você acha que vai ter sucesso, mas o mercado é muito diferente, com muito mais concorrência”, diz Paola. O Departamento de Estado do governo norte-americano aponta aumento de 27% na concessão de vistos para emigrantes brasileiros, passando de 3.502, em 2017, para 4.458, em 2018.
A pesquisa é da consultoria especializada em expatriação JBJ Partners, feita no ano passado com brasileiros que moram nos Estados Unidos indica mudança no perfil. “As pessoas estão desesperançosas no Brasil e isso não vem de hoje. É um movimento que se sente desde 2014”, afirma o especialista em imigração da JBJ Jorge Botrel. “São pessoas brilhantes que poderiam estar produzindo no Brasil e ajudando o país a evoluir que estão indo para outro país. O lado positivo é que acabam mantendo o vínculo de negócios com o Brasil”, destaca.
Segundo o levantamento, a violência foi o motivo mais mencionado(56%) que as levou a mudar de país entre quem chegou a partir de 2014 nos Estados Unidos (EUA). Na sequência, aparecem instabilidade política e corrupção (47%), instabilidade econômica (45%) e baixa qualidade de vida em geral (45%). Minas Gerais foi o estado com maior crescimento de emigrantes, passando a corresponder à fatia de 10% dos brasileiros no exterior. Antes de 2013, os mineiros correspondiam a 7%.
A escolaridade dos emigrantes também aumentou. Enquanto entre os que chegaram nos EUA antes de 2013, 18% não tinham ensino superior completo, depois desse período, apenas 6% não contavam com formação superior. A parcela com pós-graduação aumentou de 18% para 23%. Também aumentou o total de casados na onda de emigração pós-2013, passando de 41% para 68%. Entre eles, mais de 83% têm filhos, frente a 63% entre os que chegaram antes desse período.
Um green card por US$ 500 mil
A formação superior em engenharia química abriu caminho para que o mineiro de Varginha, Matheus Comunian, de 38 anos, pudesse embarcar com a esposa, Amanda, de 34, e o filho Matheus Dande, de 15, para morar nos Estados Unidos, há três anos. Dono de uma loja de carros em Extrema, no Sul de Minas, ele entrou na rota dos emigrantes por causa de outra onda: a de descrédito no Brasil. “Dentro de mim, tinha a certeza que, se o Brasil continuasse com os mesmos políticos, teria o mesmo destino da Venezuela”, diz.
Atualmente, ele trabalha como vendedor numa concessionária de carros e espera ser promovido para o setor financeiro, já que atuou no setor por 13 anos. “O que mais me motivou a mudar foi trazer meu menino. Ele está na High School (ensino médio), já aprendeu inglês e espanhol. A escola é gratuita e não tem nem comparação com a daí”, conta. “A saudade é muita. Os EUA são uma rosa sem perfume. Aqui tem de tudo, mas todo mundo só trabalha. Talvez, o Brasil seja um lugar para eu voltar na velhice”, resume.
Diretor de vendas de investimentos da Driftwood, que capta investidores estrangeiros para hotéis nos EUA, André Salles, constata uma corrida de brasileiros para aplicar recursos nos país do presidente Donald Trump, outro caminho para a emigração. Quem investe US$ 500 mil lá consegue aplicar para a categoria de visto EB-5, que garante o green card para residir legalmente nos EUA. “Em 21 de novembro, esse valor vai passar a ser de US$ 900 mil. Temos visto nas últimas três semanas uma correria absurda de pessoas querendo aproveitar o prazo”, diz.