O vice-presidente Hamilton Mourão interrompeu seu período de silêncio e, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, disse que o presidente Jair Bolsonaro decidiu "tratar pessoalmente" da comunicação. E que ele, Mourão, "está cuidando" do seu "quadrado". Alvejado pela ala ideológica do governo, que o acusou de tentar ofuscar o presidente, Mourão deixou de dar entrevistas diárias sobre os diversos assuntos da República.
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Eu não estou calado.
Como o sr. avalia o tom dessa comunicação?
Reclamavam que ele não falava, que fugia da imprensa. Agora que ele está falando, o pessoal reclama também? Ele tem procurado a imprensa. Ele tem expressado a opinião dele sobre diferentes assuntos e está cuidando pessoalmente da comunicação. É uma estratégia que ele traçou.
A forma como fala, usando até palavras chulas, palavrões, tem motivado críticas.
É a natureza do presidente Bolsonaro. O presidente é um cara simples e direto. Não adianta esperar que ele vá tecer comparações pensando em grandes mestres da filosofia. Não. Ele não vai fazer isso. Ele vai se expressar com a linguagem dele, usando sujeito, verbo e predicado. Podem não ser as melhores palavras, mas é o jeito dele.
O deputado Marco Feliciano (Podemos-SP) disse que o sr.
Não respondo a ele. É tudo tão fora do contexto que eu não respondo.
O deputado sugere que houve um desentendimento anterior (entre Mourão e o presidente)?
Nunca houve qualquer desentendimento.
Houve interferência indevida do presidente Bolsonaro na Polícia Federal e na Receita Federal?
O presidente tem uma visão hierarquizada, que é uma visão que nós, militares, temos. Ele julga que determinadas alterações devem ser feitas. Ele sugeriu um nome para a Polícia Federal do Rio. A PF não concordou com esse nome, trouxe outro nome, eles se acertaram e tudo bem. Sem ruídos.
Mas isso foi um problema para o ministro da Justiça, Sérgio Moro. Ele está prestigiado?
O ministro Sérgio Moro é um quadro emblemático do nosso governo.
O governo está com problema de caixa. Talvez as Forças Armadas tenham de antecipar a dispensa de recrutas do Exército. O presidente e o vice são militares. Não era para ser diferente?
Não há como ser diferente. Este é o dilema da economia: canhão ou manteiga. Então, no momento em que a arrecadação está baixa, a atividade econômica está fraca, todos são afetados. Não é só um problema interno do Brasil, é um problema do mundo inteiro. A visão do ministro Paulo Guedes (Economia) é de que, a partir de setembro, conseguirá captar recursos dos bancos públicos.
Os militares costumam dizer que o governo de Fernando Henrique Cardoso foi o pior para as Força Armadas. Agora temos um governo oriundo da área militar.
O Brasil passava por um momento de ajuste fiscal, tinha de ter um equilíbrio entre receita e despesa. Já se tinha aumentado os impostos até onde podia, tinham criado a CPMF, inclusive. Ele não queria contrair dívida. Eu sofri, eu era comandante de unidade. Ao passar o governo para o Lula, FHC entregou as finanças públicas totalmente equilibradas, inclusive com superávit. Ao mesmo tempo, entrou o boom das commodities.
Não é um contrassenso deixar as Forças Armadas à míngua?
Não é deixar à míngua. Todo o País está vivendo essa situação. O dilema de qualquer economia é o canhão ou manteiga. Ou nós vamos botar dinheiro na saúde, na educação, na infraestrutura, ou nós vamos ter as Forças Armadas mais poderosas do mundo e a turma passando fome. E esta opção não é a melhor. As Forças Armadas têm de ter o que é justo e necessário.
O que o sr. chama de "justo e necessário" é uma cota de contribuição das Forças Armadas? O sr. vê comprometimento da função institucional das Forças Armadas com esse corte?
É óbvio que, a partir do momento em que você tem uma perda em um orçamento que já é deficitário, isso reduz a operacionalidade das Forças. Os pilotos vão voar menos.
Isso o preocupa?
Hoje, não. Isso preocuparia caso perdurasse por dois anos, três anos, quatro anos. Aí, sim, você vai reduzindo a capacidade operacional. Se for questão de um ano só, não vejo problema.
Sobre a lei de abuso de autoridade recém-aprovada na Câmara. Há a necessidade de veto?
Há artigos completamente desnecessários. A questão das algemas, por exemplo. Isso tem de ser definido na hora, no momento da prisão. Também há a questão do critério subjetivo do juiz (na decretação de prisões preventivas). São artigos que eu acho que poderiam ser vetados. Mas o presidente está discutindo isso aí.
O sr. acha que o nome do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) para a embaixada nos Estados Unidos passará no Senado?
O presidente vem costurando esse assunto. O Eduardo está circulando pelo Senado, conversando com os senadores, procurando se apresentar. Quando chegar a hora de ele ser sabatinado, ele poderá ter um bom grau, pode tirar 8 e "passar direto".
E se Donald Trump não conseguir a reeleição?
Não há problema. O Eduardo não será embaixador perante um governo, mas perante os Estados Unidos.
O presidente sinalizou que pode não indicar mais o filho. Ele ainda não tem os votos para conseguir ser aprovado. O sr. o aconselharia a retirar a indicação de Eduardo Bolsonaro?
A decisão é do presidente. Eu acompanho 100% o que ele decidir.
No caso do projeto da Previdência dos militares, há quem defenda a inclusão dos policiais militares no texto. Isso é viável?
A PM não quer os 35 anos de serviço. Portanto, isso é outra discussão.
O procurador-geral da República já está escolhido? O sr. sugeriu algum nome?
A escolha está nas mãos do presidente. Acho que ele não decidiu ainda. Não tenho indicação nenhuma.
Hoje (ontem) vimos um sequestro de um ônibus no Rio, que acabou com a morte do sequestrador e os passageiros salvos. Como o sr. viu essa operação?
A ação foi bem feita. A PM tomou a decisão que tinha de tomar. Salvou a vida das pessoas.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo..