A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, "segurou" casos da Lava-Jato por um ano ou até mais. A desaceleração nos ritmos de trabalho da investigação levou o ministro Edson Fachin, relator da operação no Supremo Tribunal Federal, a questionar, no mês passado, a chefe do Ministério Público Federal sobre o andamento das apurações, conforme documento obtido pelo jornal O Estado de S. Paulo. Raquel deixa nesta terça-feira, 17, o cargo e apresentará uma prestação de contas sobre os dois anos de sua conturbada gestão.Leia Mais
'Protejam a democracia', diz Raquel Dodge em sua última sessão no STFRaquel Dodge recebe Augusto Aras para 'assuntos institucionais'Raquel Dodge diz que MP não permite que 'a hipertrofia de um poder oprima a sociedade'Procuradores que debandaram do grupo de Raquel na Lava-Jato estão de voltaEx-executivo da Odebrecht que delatou Aécio Neves e Edison Lobão é encontrado morto no Rio Raquel Dodge deixa a PGR: democracia e factoideRaquel Dodge sobre mandato na PGR: exerci autocontenção e fui eloquentemente silenciosa
Em dezembro do ano passado, os advogados Aristides Junqueira e Luciana Moura, defensores de Eunício, reclamaram do ritmo das investigações e pediram o arquivamento do processo. "A última vez que o inquérito esteve nesse Supremo Tribunal Federal foi no início de março de 2018.
Outro caso mencionado pelo relator da Lava-Jato é uma apuração preliminar sobre o repasse de valores pela JBS a parlamentares em troca de apoio político à eleição do deputado cassado Eduardo Cunha (MDB-RJ) à presidência da Câmara, em 2014. O caso está parado na Procuradoria há quase um ano.
Um inquérito que investigava o senador Renan Calheiros (MDB-AL) também ficou quase um ano parado na Procuradoria até retornar, no início deste mês, ao STF - depois, portanto, que Fachin enviou o ofício a Raquel. O caso acabou arquivado pelo relator da Lava-Jato.
Em março, o magistrado enviou à Procuradoria um inquérito que apura se o ex-senador Edison Lobão (MDB-MA) recebeu vantagem indevida entre 2011 e 2013 - quando ocupava o cargo de ministro de Minas e Energia no governo de Dilma Rousseff (PT) -, em virtude de contratos celebrados para a construção da usina de Belo Monte.
Na época, Fachin fixou um prazo de cinco dias para que a Procuradoria se manifestasse se seria o caso de apresentar denúncia, arquivá-lo ou de prosseguir com as apurações. Até hoje não recebeu resposta.
No despacho obtido pela reportagem, Fachin cumprimentou Raquel pelo "brioso" trabalho, mas observou que "se encontram na PGR inquéritos, bem como ações cautelares e petições (...) no aguardo de diligências e respectivos trabalhos, em lapso superior ao prazo".
Raquel disse que a maior parte das peças (manifestações) ajuizadas no STF está sob segredo de Justiça. "No tempo próprio elas expressarão o empenho com que eu trabalhei no enfrentamento da corrupção, naquilo que me cabe de atuação", afirmou ela, na semana passada.
Debandada
A crise na Procuradoria levou, recentemente, um grupo de trabalho da Lava-Jato a abandonar os postos, em sinal de desaprovação à conduta de Raquel na delação da OAS.
A procuradora se colocou à disposição do presidente Jair Bolsonaro para ser reconduzida ao cargo por mais dois anos, mas acabou preterida pelo subprocurador Augusto Aras, que lançou candidatura avulsa, sem disputar uma vaga na lista tríplice da categoria. Aras já defendeu uma "disruptura" no Ministério Público, fez críticas a métodos de investigação "personalistas" da Lava-Jato e prometeu atuar para destravar a economia. A indicação ainda precisa ser aprovada pelo Senado.
Raquel enfrentou resistência no Planalto por ter denunciado, no ano passado, Bolsonaro por racismo e o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente, por ameaçar uma jornalista. O entorno do presidente também critica a atuação de Raquel na Lava-Jato sob o argumento de que ela não deu prioridade ao combate à corrupção.
Apurações
Eunício Oliveira (MDB-CE): O inquérito que investiga se o ex-senador foi beneficiado com valores repassados pelo grupo Hypermarcas foi enviado à Procuradoria em 2 de março de 2018.
Edison Lobão (MDB-MA): Lobão é investigado por corrupção e lavagem envolvendo contratos de Belo Monte. Em março, Fachin enviou o inquérito à PGR para que, em 5 dias, se manifestasse, mas não houve resposta.
Eduardo Cunha (MDB-RJ): Apuração envolve repasse de valores pela JBS a parlamentares em troca de apoio à eleição de Cunha à presidência da Câmara, em 2014. O caso está na PGR desde 21 de setembro de 2018.
Renan Calheiros (MDB-AL): Caso investigava pagamento de propina por meio de dinheiro desviado de contrato para a construção de navios-sonda. O caso ficou quase um ano na Procuradoria. Depois, foi arquivado.
.