Nova York – Nem agressivo ao ponto de ser tratado grosseiro, mas nem tão light que possa parecer abrir mão da soberania. Mas com a franqueza que é peculiar ao presidente Jair Bolsonaro. É assim, com equilíbrio e destaque às ações do Brasil em relação aos objetivos do milênio, que integrantes da comitiva definem o tom do discurso que o presidente fará hoje, marcando sua estreia nas Nações Unidas. Por recomendações médicas, a agenda nos Estados Unidos ficou restrita à ONU e conversas rápidas e concentradas nesta terça-feira. A primeira será um rápido encontro com o secretário-geral da ONU, Antonio Guterrez, como é praxe nesse evento. O segundo, já no Hotel Intercontinental, será com o ex-prefeito de Nova York Rudolf Giulliani. Por último, o presidente Donald Trump, uma recepção no Hotel Lot, pouco antes de seguir para o aeroporto. O americano afirmou ontem, ao chegar para o encontro em Nova York, que Bolsonaro “é um bom homem".
Leia Mais
Bolsonaro fica em mesmo hotel de Trump em Nova York, mas líderes não se reuniramCongresso se articula para derrubar vetos de Bolsonaro à Lei de AbusoVersão light de Bolsonaro é expectativa em discurso na ONUPresidente do Chile assume protagonismo que deveria ser de BolsonaroDois Brasis estão na ONU hojeA frase de Araújo foi uma resposta ao que parte da comitiva brasileira considerou uma provocação do presidente da França, Emmanuel Macron. Na reunião sob o futuro da Amazônia, ontem logo cedo, ladeado por Guterrez, os presidentes do Chile, Sebastian Piñera, da Bolívia, Evo Morales, e da Alemanha, Angela Merkel, Macron foi direto ao dizer que estava fazendo toda aquela discussão sem o Brasil. Essa reunião, sem citar nomes, estará presente no discurso de Bolsonaro, de forma a deixar claro que decidir sobre a Amazônia sem o Brasil, significa deixar de fora a maior parte da floresta.
O discurso vem sendo tratado com reserva pela comitiva. O presidente ouviu muitos, mas, na hora de decidir, dizem seus assessores, ele trabalhou sozinho. Modificou a maior parte do que lhe foi recomendado. A expectativa é de que Bolsonaro trate dos temas com a franqueza que lhe é peculiar. A maior parte da fala de hoje, Bolsonaro passou com os ministros de Relações Exteriores, Ernesto Araújo, do Gabinete de Segurança Institucional, general Augusto Heleno, com o assessor internacional da Presidência, Felipe Martins, e o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), já apontado como a indicação do governo para a embaixada do Brasil em Washington.
Durante o voo, o presidente aproveitou para conversar e repassar parte do discurso, de forma a não ultrapassar o tempo previsto pelas Nações Unidas. Pela primeira vez, usou o quarto, porque sentiu um incômodo na região abdominal, mas nada que causasse muita preocupação. Apenas preferiu ficar no quarto por um tempo, algo que jamais foi visto por aqueles acostumados a acompanhá-lo nas viagens internacionais.
O forte esquema de segurança montado no Hotel Intercontinental, onde Bolsonaro está hospedado, não se deveu à movimentação da comitiva brasileira e sim à presença do "dono da casa", o presidente Donald Trump. Ele passou pelo menos quatro horas no hotel, com agenda de reuniões bilaterais. Encontrou a delegação do Egito, o primeiro-ministro do Paquistão, Imran Khan, e o presidente da Coreia do Sul, Moon Jae-in. O encontro entre Trump e Bolsonaro, entretanto, está previsto para ocorrer ainda hoje, antes do presidente voar de volta ao Brasil.
R$ 2 BILHÕES PARA A AMAZÔNIA
Além das trocas recentes de declarações polêmicas com líderes europeus, ontem o governo brasileiro foi alvo de nova crítica, por estar ausente da Cúpula do Clima da ONU, que está sendo realizada em Nova York também. O presidente Emmanuel Macron vem mobilizando os líderes internacionais para aumentar a destinação de recursos à proteção da Amazônia e outras florestas tropicais. Ontem, a França anunciou parceria com os maiores doadores internacionais, entre eles o Banco Mundial, o Banco Interamericano de Desenvolvimento e a ONG "Conservation International" para levantar US$ 500 milhões (cerca de R$ 2 bilhões). Macron informou que a França contribuirá com US$ 100 milhões para financiar o programa “Pro Green” de ajuda a projetos locais, segundo a agência francesa RFI.
O anúncio foi feito ontem em Nova York. O financiamento do reflorestamento foi um dos temas centrais de reunião especial sobre a Amazônia organizada pela ONU, antes da Cúpula de Ação Climática dos líderes mundiais. O Banco Interamericano de Desenvolvimento apoiará ações desenvolvidas pelos países da região. A Conservação International, dirigida pelo ator Harrison Ford, investirá em iniciativas de organizações não-governamentais, comunidades nativas e empresas privadas. O ator americano indicou hoje que a organização vai destinar US$ 20 milhões a esses projetos de defesa da Amazônia. A entidade informou em nota que o dinheiro se destina a apoiar a estrutura fornecida pelo Pacto de Letícia, assinado em setembro pelos países com floresta amazônica em meio aos esforços emergenciais para a floresta. Os projetos financiados por esta verba envolvem restauração florestal, apoio às comunidades indígenas e aproximação com agricultores para que conservam florestas.
A iniciativa do encontro foi do próprio Macron e dos presidentes Sebastián Piñera, Iván Duque e Evo Morales. Em agosto, Macron anunciou a liberação de 20 milhões de euros (R$ 91 milhões) dos países do G7 para combater as queimadas. O plano foi feito às pressas depois que Macron chamou a atenção do mundo para os incêndios na floresta amazônica, mas não ficou claro de que forma o dinheiro seria enviado. Na ocasião, o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, afirmou que o Reino Unido doaria o equivalente a R$ 50 milhões para o Brasil combater queimadas. E o primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau, informou que emprestaria aviões-tanque e doaria o equivalente a mais de R$ 46 milhões para os países da região amazônica. (Com agências)
Puxão de orelha coletivo
Nova York – A ativista sueca Greta Thunberg, de 16 anos, discursou para líderes de 60 países na abertura da Cúpula do Clima, na sede das Nações Unidas. O encontro foi convocado pelo secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, em meio à pressão da juventude mundial, que quer a redução das emissões de gases do efeito estufa. A jovem ativista conseguiu mobilizar milhares de jovens estudantes na última sexta-feira, durante a terceira greve global pelo clima. "Vocês roubaram meus sonhos e minha infância com suas palavras vazias", afirmou Thunberg. A adolescente destacou que não existem políticas e soluções à vista e que não acredita quando líderes mundiais afirmam que ouvem os mais jovens e entendem a urgência de tomar decisões. "Por mais de 30 anos a ciência foi clara. Como ousam seguir ignorando os alertas e vir aqui para dizer que estão fazendo o bastante? Se vocês realmente entendessem essa situação, e ainda assim seguissem falhando em suas ações, então vocês são maus."
Em outro momento, a garota afirmou: "Não vamos deixá-los sair ilesos dessa. Aqui, agora, vamos definir os limites. O mundo está acordando. A mudança está vindo, quer queiram ou não”. Ela seguiu com o puxão de orelhas coletivo: "Isso está errado, eu não deveria estar aqui. Eu deveria estar na escola, do outro lado do oceano. Vocês ainda se aproximam de nós, jovens, para ter esperança. Como ousam?" A adolescente ainda alertou para ecossistemas em colapso. "As pessoas estão sofrendo, estão morrendo. Estamos no início de uma extinção em massa e tudo o que vocês falam gira em torno de dinheiro e um conto de fadas de crescimento econômico eterno”.
Para Greta Thunberg, não haverá planos ou soluções para o que foi apresentado durante a cúpula. Isso, porque, segundo ela, os números são muito desconfortáveis. "Vocês não são maduros o suficiente para dizer que estão falhando. Mas os jovens estão começando a entender sua traição. Os olhos das gerações futuras estão virados para vocês. E se vocês decidirem nos ignorar, eu te digo. Nós nunca vamos perdoá-los."