Brasília – O ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot está proibido de se aproximar a menos de 200 metros de qualquer ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e teve o porte de arma suspenso. A decisão foi tomada pelo ministro da Suprema Corte Alexandre de Moraes, que também expediu mandados de busca e apreensão cumpridos por policiais federais na casa e no escritório de Janot em Brasília, onde foram apreendidos revólver, celular e tablet pelo agentes federais, por volta das 18h de ontem. A decisão foi tomada no âmbito do inquérito que apura ofensas aos ministros do tribunal depois de entrevistas concedidas por Janot nas quais disse, em 2017, que entrou no STF com a intenção de matar o ministro Gilmar Mendes e se suicidar.
Em nota, Gilmar Mendes sugeriu "ajuda psiquiátrica" a Janot e pediu providências a Moraes, entre elas a suspensão do porte de arma do ex-procurador-geral. Moraes ordenou medida cautelar para execução de suas medidas. "Diante do exposto, com base nos artigos. 282, parágrafos 2º e 319, inciso II, do Código de Processo Penal, aplico a Rodrigo Janot Monteiro de Barros a medida cautelar de proibição de aproximar-se a menos de 200 metros de qualquer um dos ministros desta Corte, bem como impedir seu acesso ao prédio sede e anexos deste tribunal", escreveu Moraes.
O ministro justificou a medida sob o argumento de que ter por objetivo "evitar a prática de novas infrações penais e preservar a integridade física e psicológica dos ministros, advogados, serventuários da Justiça e do público em geral que diariamente frequentam esta Corte". Moraes destacou ainda que a intenção de matar um ministro é fato "gravíssimo".
Além de autorizar buscas no endereço, Moraes ordenou que Janot prestasse depoimento. "Determino, ainda, que seja colhido o imediato depoimento de Rodrigo Janot Monteiro de Barros, salvo se houver recusa no acompanhamento, por tratar-se de direito do investigado ao silêncio." Encontrado em casa pela PF e levado para depor, Janot fez silêncio.
ENTENDA
Na última quinta-feira, Janot, que foi procurador-geral de 2013 a 2017 durante os governos Dilma e Temer, afirmou que o momento mais tenso de sua passagem pelo cargo foi quando entrou armado a uma sessão do Supremo Tribunal Federal (STF), em maio de 2017, com a intenção de matar a tiros Gilmar Mendes. “Ia ser assassinato mesmo. Ia matar ele (Gilmar) e depois me suicidar”, afirmou. Segundo ele, logo depois de apresentar uma exceção de suspeição contra Gilmar, o ministro difundiu “uma história mentirosa” sobre sua filha. “E isso me tirou do sério.”
À época, na condição de chefe da Procuracoria-Gerai,l da República, Rodrigo Janot pediu o impedimento de Gilmar Mendes na análise de um habeas corpus de Eike Batista, com o argumento de que a mulher do ministro, Guiomar Mendes, atuava no escritório Sérgio Bermudes, que advogava para o empresário. Ao se defender em ofício à então presidente do Supremo Tribunal Federal, Cármen Lúcia, Gilmar afirmou que a filha de Janot – Letícia Ladeira Monteiro de Barros – advogava para a empreiteira OAS em processo no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). Segundo o ministro, a filha do ex-procurador-geral da República poderia na época “ser credora por honorários advocatícios de pessoas jurídicas envolvidas na Lava Jato”.
“Foi logo depois que eu apresentei a sessão (...) de suspeição dele no caso do Eike. Aí ele inventou uma história que a minha filha advogava na parte penal para uma empresa da Lava-Jato. Minha filha nunca advogou na área penal... e aí eu saí do sério”, afirmou o ex-procurador-geral. Janot disse ainda que foi ao Supremo Tribunal Federal armado, antes da sessão, encontrou Gilmar na antessala do cafezinho da Corte. “Ele estava sozinho”, disse. “Mas foi a mão de Deus. Foi a mão de Deus”, repetiu o ex-procurador ao justificar porque não concretizou a intenção.
Janot afirmou que estava se sentindo mal no dia e pediu para o vice-procurador-geral da República o substituir na sessão do Supremo. A cena descrita acima não está narrada em detalhes no livro Nada menos que tudo (Editora Planeta), no qual relata sua atuação no comando da operação Lava-Jato. Janot alega que narrou a cena, mas “sem dar nome aos bois”.
O ex-chefe do Ministério Público Federal ressaltou que sua relação com Gilmar Mendes já não era boa até esse episódio, mas depois cortou contatos. “Eu sou um sujeito que não se incomoda de apanhar. Pode me bater à vontade... Eu tenho uma filha, se você for pai...”.
AJUDA PSIQUIÁTRICA Gilmar Mendes disse que recomenda ajuda psiquiátrica a Janot. "Dadas as palavras de um ex-procurador-geral da República, nada mais me resta além de lamentar o fato de que, por um bom tempo, uma parte do devido processo legal no país ficou refém de quem confessa ter impulsos homicidas", afirmou o ministro pelo Twitter. Gilmar diz acreditar que Janot revelou o caso porque parece estar passando por crise de abstinência após um período de "apogeu" que viveu durante sua atuação na PGR.
Em 2017, quando a desavença entre os dois já era notória, Janot disse, em entrevista no 12º Congresso da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), em São Paulo, que ele e Gilmar Mendes tomaram posse no Ministério Público Federal no mesmo dia – 1º de outubro de 1984. E que, nos anos 1980, durante o período de formação acadêmica de ambos, simultaneamente, ele foi para Itália e Gilmar Mendes para a Alemanha.
"Lá a gente se frequentava, ele nunca veio à Itália, eu fui à Alemanha, nós saíamos, tomávamos cerveja. Nós éramos de um mesmo grupo e depois a vida foi encaminhando cada um para o seu lado. Eu não tenho nada contra ele, é da minha turma de concurso."