Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) retomam nesta quarta-feira a discussão sobre os efeitos do entendimento – aprovado na semana passada – de que os réus delatados devem apresentar as alegações finais em um processo judicial, depois dos delatores. O debate atinge diretamente 32 sentenças relacionadas à Lava-Jato, que podem ser anuladas.
É ponto pacífico que todos os casos julgados a partir de agora deverão adotar a sistemática de o delatado se manifestar no processo por último. Embora não se trate de uma súmula vinculante – ou seja, não obrigatoriedade de seguir a decisão para casos semelhantes – não há dúvida que os juízes e desembargadores vão querer evitar o risco de a decisão ser anulada em recurso que pode chegar ao próprio STF.
A grande dúvida é então relacionada aos casos já julgados – entre eles, a condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no sítio de Atibaia.
Para os casos já julgados, os ministros poderão fixar a tese de que é preciso levar em consideração um provável prejuízo à parte para que a decisão condenatória seja anulada. E mais: será preciso comprovar que houve o prejuízo ou ele poderá ser presumido?
Na hipótese de os ministros determinarem a necessidade de demonstrar um dano para que o processo seja anulado, estaria configurado o princípio da nulidade relativa, que pode ser arguido em qualquer fase do processo penal. Se esse dano não puder ser comprovado, a nova regra não seria então aplicada à ação e a sentença mantida.
Ontem, o ministro Gilmar Mendes afirmou em entrevista à imprensa que a decisão sobre a ordem das alegações finais deve atingir apenas os casos em que os advogados do réu tenham feito o pedido desde a primeira instância. De acordo com ele, essa tese já tem maioria no STF e essa é a modulação “possível de se fazer”.
A modulação citada por Gilmar Mendes, no entanto, pode encontrar resistência no direito penal. Há quem defenda que, se houve um cerceamento no direito de defesa, trata-se de uma violação a uma garantia fundamental. Portanto, poderia ser arguida em qualquer fase do processo, e não apenas na primeira instância.
Para o professor de processo penal, Bruno Cesar Gonçalves da Silva, o ideal seria que não houvesse uma modulação para a aplicação do novo entendimento do STF. “Nulidade se analisa no caso concreto, caso a caso, não se deve criar, via modulação, uma imposição. Pode ser que a defesa não tenha interesse. Vamos que o delator não falou nada demais. Pode ser que a parte tenha mais interesse em acabar logo com o processo do que começar tudo de novo”, afirmou. Ele lembrou que, caso a parte não requeira a aplicação da nova regra no processo, ela só poderá ser feita de ofício, pelo juiz, caso seja vantajoso para o réu.
Julgamento
A discussão envolvendo a ordem para apresentação de alegações finais em um processo penal teve início no julgamento, quinta-feira passada, de um habeas corpus apresentado pelo ex-gerente de empreendimentos da Petrobras, Marcio de Almeida Ferreira. Condenado a 10 anos e três meses de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, os advogados dele reclamaram que não tiveram acesso ao conteúdo das alegações finais dos delatores – o que teria prejudicado o direito de defesa.
A sessão terminou com o placar de seis votos a três: Alexandre de Moraes, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Celso de Mello votaram a favor da tese de que os delatores deverão apresentar as alegações finais sempre antes dos réus que não fizeram acordo de delação premiada.
Edson Fachin, Luís Roberto Barroso e Luiz Fux defenderam a prática da Lava-Jato. O ministro Marco Aurélio Mello não votou. A sessão será retomada nesta quarta-feira com o voto do presidente do STF, Dias Toffoli, mas na semana passada, ele adiantou que concorda com a tese aprovada pela maioria do plenário. O ministro disse ainda que apresentará uma proposta para delimitar a abrangência da decisão da Corte.