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Estado de Minas LAVA-JATO

Odebrecht confirma propinas para o PT

Marcelo reafirma em depoimento o acerto de pagamentos relacionados a financiamento do BNDES em Angola, na África


postado em 08/10/2019 00:04

O empresário Marcelo Odebrecht, quando foi preso pela Polícia Federal em 2015. Ele disse em depoimento que era o seu pai, Emílio, que negociava com Lula(foto: BRUNNO COVELLO/GAZETA DO POVO)
O empresário Marcelo Odebrecht, quando foi preso pela Polícia Federal em 2015. Ele disse em depoimento que era o seu pai, Emílio, que negociava com Lula (foto: BRUNNO COVELLO/GAZETA DO POVO)


Brasília – O empresário Marcelo Odebrecht confirmou ontem o acerto de propinas ao PT em favor de Luiz Inácio Lula da Silva, relacionados ao financiamento pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) de exportação de serviços do grupo em Angola, na África. Ouvido como delator pelo juiz federal Vallisney Oliveira, da 10ª Vara Federal de Brasília, ele disse que manteve o teor de suas delações e apontou contradições nos depoimentos do pai, Emílio Odebrecht.

O caso dos negócios da Odebrecht em Angola tem Lula como réu em dois processos penais abertos na Justiça Federal, em Brasília, resultado na Operação Janus, deflagrada em 2016 em desdobramento às descobertas da Lava-Jato. O principal, que trata do suposto acerto de US$ 40 milhões de propinas ao PT pela liberação dos recursos pelo BNDES, tem como alvos Lula e Paulo Bernardo. O outro é o que apura corrupção, lavagem de dinheiro e tráfico de influência contra o ex-presidente e Taiguara Rodrigues dos Santos, conhecido como "sobrinho de Lula".

“Naquela época, eu tinha uma conta corrente que eu e Palocci administrávamos, e que pertencia ao PT, Lula e que, na verdade, era fruto de um combinado de Lula com meu pai. Quando havia pedidos de valores para ajudar o PT, saia dessa conta corrente." A conta corrente está registrada na "Planilha Italiano", que a Lava-Jato apreendeu, que era a contabilidade informal de um crédito de R$ 300 milhões que os Odebrecht reservou para pagamentos ao PT.

Odebrecht afirma que na "Planilha Italiano" havia duas "contrapartidas". que seriam os negócios onde houve cobrança condicional de propinas, o caso do chamado "rebate", dos negócios em Angola e BNDES, e o Refis da Crise. "Esses dois foram de fato contrapartidas solicitadas, e que geraram créditos." No caso do financiamento de Angola, apontou envolvimento do ex-ministro Paulo Bernardo. "A Planilha Italiano era a conta corrente onde havia créditos que eram colocados em função de pedidos, que eram feitos, principalmente através de Palocci. Basicamente por Palocci e, no caso do rebate, por Paulo Bernardo."

contradições Em quase uma hora e meia de depoimento ao juiz da 10ª Vara Federal, Odebrecht confirmou o que sabia sobre o caso e acusou o pai e o ex-executivo da Odebrecht Alexandrino Alencar de "contradições" ao falarem à Justiça sobre a participação do ex-presidente e o acerto de valores. "Como a relação de Lula pertencia ao meu pai, eu tinha que referendar esses valores com ele, buscar a autorização dele. Só que agora ele está dizendo em depoimento que nunca conversou com Lula sobre valores."

Como delator, ele explicou que não teve participação direta nos supostos acertos com o ex-presidente, mas que tanto o pai, como Palocci e outros executivos relataram pedidos de Lula. Afirmou ainda que manteve o teor de sua colaboração premiada, homologada em 2017 pelo Supremo Tribunal Federal (STF). "Aquilo que eu sabia, era via Alexandrino e meu pai. E os dois têm várias contradições nos depoimentos deles em relação ao que me contaram à época", afirmou Odebrecht. "O grande ponto da questão é que tem alguns itens, que eu tinha obtido através de meu pai informação de que ou ele tinha falado com Lula, ou ia falar com Lula e eu autorizava. Mas que basicamente nesse momento, ou ele esqueceu, e está no direito dele, ou ele falava uma coisa comigo e falava com Lula outra. Então isso que precisava esclarecer."

Presidente do grupo de 2009 até 2015, quando foi preso pela Lava-Jato – cumpriu dois anos de prisão e agora está em regime domiciliar, monitorado por tornozeleira eletrônica –, Odebrecht disse que a "relação de Lula pertencia" ao pai, Emílio, mas que referendava valores com ele. "Só que agora ele está dizendo em depoimento que nunca conversou com Lula sobre valores. Respondo pela minha colaboração e pelo o que eu falei. Se pessoas acertaram propinas e disseram que não acertaram, eles é que têm que responder. Posso responder pela minha colaboração."

SOBRINHO No processo em que Odebrecht foi ouvido ontem as acusações são relacionadas aos supostos pagamentos feitos para Lula e para o "sobrinho", relacionados a negócios em Angola. O delator explicou que não teve envolvimento direto com o caso. "Não tive nenhuma relação com esse assunto da contratação do sobrinho, e o que eu soube, soube depois. Como também não era responsável pela relação com o presidente Lula, nem constava nos meus anexos. Quando veio a denuncia (do MPF, em 2016) eu ainda não tinha fechado o acordo de colaboração, eu apenas citei em um dos meus anexos o que eu sabia dos fatos", explicou Odebrecht, ao juiz.

O delator voltou a contar que o diretor da Odebrecht em Angola, Ernesto Bayard, o comunicou, após os acertos, que havia a solicitação de apoio. "O que eu soube foi que por volta de 2011, que o Ernesto Bayard me alertou, que houve pedido de Lula, não sei se a meu pai ou Alexandrino para que nós pudéssemos subcontratar o sobrinho dele em Angola." Odebrecht disse também que tempos depois Alexandrino também relatou novo pedido para ajuda ao "sobrinho". "Não tinha falado nada, porque não tinha me envolvido."

O advogado de defesa de Lula, Cristiano Zanin Martins, disse que os depoimentos de Marcelo e de Emílio, somados, deixam claro que "o ex-presidente não praticou nenhum ato ilícito que foi imputado a ele nessa ação." "Não há como sustentar vínculo com o ex-presidente. Se ocorreu algum fato ilícito, não tem qualquer participação de Lula", disse Zanin.

“Romaria de empresários”


Brasíia – O empresário Marcelo Odebrecht disse que "o Instituto Lula era uma romaria de empresários". Em depoimento à Justiça Federal, no âmbito de ação penal em que o ex-presidente é réu por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e tráfico de influência, Odebrecht declarou que, após a saída de Lula da Presidência, "havia sim um descontentamento enorme da classe empresarial em relação ao rumo que estava tomando o governo Dilma".

Segundo Odebrecht, era "extremamente difícil" lidar com Dilma. "Essa a avaliação de todos. Esses empresários, entre os quais, meu pai, não cansavam de ir até Lula para tentar ver se ele influenciava ela (Dilma) de alguma maneira." O empresário foi ouvido em uma Vara Federal de Osasco (Grande São Paulo), por meio de vídeo conferência. O processo, sobre negócios em Angola, na África, tramita na 10.ª Vara Federal de Brasília.

O juiz Vallisney Oliveira perguntou a Odebrecht. "Os senhores utilizavam o ex-presidente Lula para fazer algum pedido ao governo da ex-presidente Dilma? Ele (Lula) trabalhava, entre aspas, pela empresa?, fazia algum favor para a empresa junto ao governo? Aqui (no processo) tem um crime de tráfico de influência. O senhor como colaborador o que pode dizer sobre isso?" "A maior dificuldade que tinha com a presidente Dilma era, por exemplo, no nosso caso, o projeto do etanol que o presidente Lula incentivou a Odebrecht entrar e, depois, a presidente Dilma fez várias medidas que foram contra", respondeu o empresário. "Então, tinha sim, nós, empresários, recorríamos a Lula para tentar influenciar Dilma porque entendíamos que os rumos do governo não estava sendo dos mais adequados."

Odebrecht reiterou que "o Instituto Lula virou uma romaria de empresários". "Mas eu não diria que nesse processo foi feito nada de ilícito, era uma coisa normal de um presidente que saiu e que colocou a sucessora dele." O juiz insistiu. "E por que o sr. se utilizava do ex-presidente?” O empresário começou a responder. "Excelência, a percepção que existia em todo o meio empresarial..." O juiz interrompeu e retomou a palavra: "Quero entender porque (o processo) é um tráfico de influência. Tem que ter alguma promessa do réu nesse caso específico."

"Nesse caso específico não me lembro de nada, a gente pode ter pedido para ele reforçar lá alguma coisa. Acho que é normal, a gente fazia isso com os presidentes quando viajavam, presidentes e ex-presidentes, nós atualizávamos eles o que estávamos fazendo nesses países, lobby positivo a favor das empresas", disse Marcelo.  Ainda ao ser indagado sobre palestras relativas ao Instituto Lula, Odebrecht explicou. "Soube que houve um combinado do meu pai com Lula, ou Alexandrino (Alencar, executivo do grupo), não sei ao certo, para se fechar algumas palestras. Assim como soube que várias outras empresas no Brasil e no exterior contrataram o presidente Lula para fazer palestras. Qual foi a motivação que meu pai contratou essas palestras, acho mais correto escutar diretamente dele."

Odebrecht prosseguiu: "Havia duas razões, havia intenção de ajudar o Instituto Lula, como ajudamos o Instituto FHC. O presidente Lula era pessoa que tinha imagem bastante positiva em vários países em que a gente atuava. Ao contratar ele para umas palestras não deixara de ser um trabalho de relações públicas." O empresário ressaltou que avisou o ex-ministro Antonio Palocci (Fazenda e Casa Civil/governos Lula e Dilma) que R$ 15 milhões foram reservados a Lula e que esse valor sairia da "Planilha Italiano" – fluxo de dinheiro da empreiteira para o PT e para o Instituto. Ele disse que o dinheiro das palestras seria descontado da planilha, sem avisar Lula.


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