O clima de rivalidade nas relações do presidente Jair Bolsonaro (PSL) com os governadores de São Paulo, João Doria (PSDB), e do Rio, Wilson Witzel (PSC), ficou explícito ontem em duas cerimônias públicas que reuniram os três políticos. Em São Paulo, durante evento de formatura de sargentos da Polícia Militar, Doria foi vaiado pelo público, enquanto o presidente foi recebido aos gritos de "mito".
Mais tarde, na cerimônia de integração do submarino Humaitá, em Itaguaí (RJ), Bolsonaro se dirigiu ao governador fluminense e disse que trabalha para entregar no futuro um governo "muito melhor" para quem queira assumir a Presidência "de forma ética, moral e sem covardia".
Bolsonaro e Witzel se afastaram após o governador manifestar diversas vezes que sua intenção é chegar ao Palácio do Planalto. Bolsonaro também olhou para o governador quando falou em "inimigos internos".
Tanto Witzel quanto o governador de São Paulo foram eleitos com campanhas associadas ao então candidato do PSL. Na capital paulista, Doria e o presidente se encontraram pela primeira vez em um evento público após o desgaste provocado por críticas mútuas.
Bolsonaro chegou a afirmar que o tucano é "ejaculação precoce" ao comentar a possibilidade de o governador concorrer em 2022. Doria, por sua vez, fez duras críticas ao discurso do presidente na Assembleia-Geral da ONU e recentemente afirmou que "nunca foi bolsonarista" - apesar de ter utilizado o slogan "Bolsodoria" no segundo turno da eleição do ano passado.
Ontem, porém, ao discursar, Doria fez um gesto para o presidente e disse que ele é um "amigo dos brasileiros em São Paulo". "Fiz questão de estar presente para mostrar que o Estado de São Paulo é parceiro das boas ações do Brasil. O que for positivo para o Brasil e para São Paulo, o governador estará ao lado.
Em São Paulo, não fazemos oposição ao Brasil", disse Doria, cuja presença era dúvida até horas antes da formatura, quando o compromisso foi incluído em sua agenda oficial. Doria foi vaiado ao chegar e ao discursar no evento, que reuniu um público de cerca de 5 mil pessoas, conforme a PM.
No entorno do governador, a avaliação é de que as vaias aconteceram por causa da presença do senador Major Olimpio (PSL), da reserva da PM e que tem um histórico de oposição aos governos tucanos no Estado. Doria não comentou as vaias.
Bolsonaro, ao discursar, elogiou militares, criticou governos que o antecederam disse "os únicos a quem deve obediência" são as pessoas. Citou protocolarmente Doria no início de sua fala e depois não fez mais menções ao governador. Os dois deixaram o evento sem falar com a imprensa.
Horas depois, na região metropolitana do Rio, no Complexo Naval, o presidente se referiu aos inimigos ao se dirigir ao governador fluminense. "Como político digo a vocês, o nosso partido é o Brasil. Temos inimigos dentro e fora do Brasil. Os de dentro são os mais terríveis", afirmou Bolsonaro. "Trabalho para que, no futuro, quem, por ventura, de forma ética, moral e sem covardia um dia por acaso venha assumir o destino da nossa nação encontre a nossa pátria numa situação bem melhor do que assumi."
Pivô da crise entre Witzel e o PSL de Bolsonaro no Rio, o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), que preside o partido no Estado, estava na plateia de convidados. O governador e Bolsonaro estavam lado a lado na cerimônia. Mas, quando vagou uma cadeira durante o discurso de Azevedo e Silva, o presidente pulou para ela. Ao falar no púlpito, Witzel saudou Flávio e lembrou que eles "caminharam juntos" durante a eleição do ano passado.
O presidente também destacou, ao lembrar um dos lemas da campanha de 2018, que "seu partido é o Brasil". Ele vive uma crise com o PSL, ao qual se filiou antes do pleito do ano passado.
Na cerimônia de integração do submarino Humaitá, Bolsonaro não fez referências à França. O submarino é o segundo construído após parceria firmada entre os dois países em 2008, ainda no governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Ele destacou a importância do projeto para proteger a "soberania nacional" e disse que o Brasil vai vencer o que considera inimigos externos.
As relações conturbadas dos governadores com o presidente preocupam parlamentares no Congresso. Fontes próximas dos governos de Bolsonaro e de Doria dizem tentar "baixar a fervura". A leitura é de que as eleições de 2022 ainda estão distantes e que o desgaste institucional será grande se os governantes trocarem farpas até lá.
O estranhamento, porém, não é negado. "Bolsonaro jamais ignoraria o governador, que é o chefe da PM. Mas é errado achar que existe aproximação entre eles", afirmou o deputado Capitão Derrite (PP-SP), vice-líder do governo na Câmara. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.