O sentimento de indignação tomou conta dos moradores da pacata Pedra do Indaiá, no Centro-Oeste. Ao longo de toda a semana passada, o assunto foi só um: o risco de incorporação a um município maior. A cidade, que pertence à microrregião de Santo Antônio do Monte, a 15 quilômetros, se enquadra nos critérios de extinção, conforme a proposta do governo federal. Além de ter menos de 5 mil habitantes, a arrecadação própria representa 7,44% da receita total. Dos R$ 16 milhões que caem nos cofres municipais ao ano, 60% vêm do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). O Imposto Predial Territorial Urbano (IPTU), por exemplo, não passa de 0,5% do total. Estima-se que 50% dos contribuintes não pagam o imposto.
A esperança do prefeito de três mandatos, Itamar José da Costa (PSDB), está em ampliar a receita para fugir da lista dos 211 municípios ameaçados em Minas Gerais. “Tenho segurança grande de que até 2023, que é o ponto de partida, estaremos com a arrecadação já acima de 10%”, afirma. Ele quer incentivar o pagamento do IPTU e transferir para a cidade o ISSQN arrecadado de avicultores. Apesar dos cerca de 40 galpões estarem na cidade, o imposto fica em São Sebastião do Oeste, onde funciona o abatedouro.
Embora já pense em estratégias para escapar da lista, o prefeito contesta a proposta do governo. “O primeiro erro deste projeto é que ele chegou sem a participação dos municípios”, declara. Apesar de reconhecer a economia que será gerada, ele destaca o viés assistencial. “No geral, prejudica. O povo ficará mais longe do atendimento, do administrador”. Ele cita os resultados positivos alcançados na educação. A cidade é uma das únicas duas do estado a atingir índice satisfatório na área, segundo o levantamento divulgado pela Fundação Lemman. O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) é de 7,1. Para Costa, o ideal seria a prometida reforma política começando a partir de cortes dentro do próprio governo federal e um debate amplo.
Hoje, a prefeitura é a principal empregadora do município, com 280 servidores. A folha de pagamento consome ao ano R$ 8,3 milhões da receita. Considerando os subsídios brutos de prefeito, vice, vereadores e secretários, ao ano, são desembolsados cerca de R$ 1 milhão, excluindo benefícios, como férias e 13º salário. Apesar de a estrutura consumir 52% do orçamento anual, o vereador Kenice José do Nascimento (PSDB) não está convencido de que a economia será positiva. “O prejuízo será maior. Vamos deixar de gerar empregos, a cidade deixará de ser atrativa para empresas, o acesso às políticas públicas ficará dificultoso”, declara. Além dos nove vereadores, o Legislativo tem três servidores.
“(A extinção de Pedra do Indaiá)
vai extinguir junto a história, a religião.
São culturas diferentes”
Guilherme Luiz dos Santos, técnico administrativo
IDENTIDADE
O técnico administrativo Guilherme Luiz dos Santos nasceu em Pedra do Indaiá. Dos 39 anos de vida, passou apenas sete deles em Belo Horizonte para estudar. Para ele, perder o status de município e virar distrito também representa perder a identidade cultural. “Vai extinguir junto a história, a religião. São culturas diferentes”, declarou. Para ele, o governo federal deveria criar mecanismos de incentivo para ampliar as receitas dos pequenos municípios. “Desta forma seríamos menos dependente da União e iríamos gerar emprego e renda”.
Maria de Lourdes Nunes, de 67 anos, cresceu na comunidade rural de Vista Nova. Ela tinha apenas 10 anos quando Pedra do Indaiá foi emancipada e acompanhou as transformações, principalmente assistencial. “Agora que as coisas estão melhorando, temos saúde, se mudar, como vamos fazer? Teremos que ir até Santo Antônio do Monte para agendar consultas, pegar remédios. Até recentemente não tínhamos nem banco”, preocupa.
O receio do comerciante Artur Teixeira Cardoso é exatamente com o retrocesso. “Ao voltar a ser distrito de uma cidade vizinha, Pedra do Indaiá vai retroceder. Hoje, temos em nossa cidade tudo de que precisamos e com qualidade – nossas escolas já foram reconhecidas como as melhores do estado, na saúde o atendimento é rápido e existem várias especialidades”, comenta, indignado. Com 27 anos, ele tem orgulho de ser indaiaense e não se vê morando em outra localidade. “Prezo pelo crescimento de nossa cidade e tenho pretensão de continuar a viver e a gerir meus negócios aqui”, lembra.
Para o operador de máquinas Reverter Rainer da Silva, de 35 anos, a economia prometida não é argumento suficiente para acabar com municípios. “Se o governo sendo da cidade não governa bem, como alguém que não conhece nosso município, as pessoas daqui, vai governar bem?”, indaga. Para ele, não se deve “arrancar a naturalidade de um cidadão”.
Ainda não existe uma definição sobre a qual município Pedra do Indaiá seria incorporada, mas é comum os moradores terem como referência Santo Antônio do Monte. Até 1962, a cidade pertencia a Itapecerica. De acordo com a PEC, uma lei ordinária definirá qual município vizinho absorverá a prefeitura. Uma lei complementar disciplinará a criação e o desmembramento de municípios.
“O primeiro erro deste projeto é
que ele chegou sem a participação
dos municípios”
Itamar José da Costa (PSDB), prefeito de Pedra do Indaiá
OUTRAS CIDADES
Pedra do Indaiá não é a única da região Centro-Oeste atingida pela PEC. Camacho, com 2.901 habitantes também está na lista. Lá, a receita própria representa 2,81% da receita total, segundo o TCE. Para o prefeito Bruno Lamounier, a proposta vai representar também a extinção de setores sociais nas localidades. “Não há que prosperar a ideia de que a redução de estruturas administrativas ensejará maiores investimentos em setores sociais, pelo contrário, com a extinção dos municípios essas estruturas que dão amparo à dignidade humana logo desaparecerão”, avalia.
Por lá, a proposta também gera indignação. “Penso que é um tiro no pé, não porque sou habitante de uma cidade que está em via de ser extinta, mas porque os problemas vão aumentar. Temos uma infraestrutura aqui que nem Itapecerica nem Candeias vão conseguir nos oferecer. Vai economizar por um lado, mas vai inchar e inflar do outro lado, com riscos de essas cidades entrarem em colapso ao assumirem mais 3 mil pessoas”, avalia o professor de história aposentado Edson Junior Leão. No Centro-Oeste também podem ser absorvidos por uma cidademaior Japaraíba, Córrego Danta, Estrela do Indaiá, Tapiraí, Serra da Saudade, Medeiros, Santana do Jacaré, Onça do Pitangui, Aguanil.
(Amanda Quintiliano)