Jornal Estado de Minas

POLÍTICA

Caciques partidários vão dominar fundo eleitoral

Criado para ajudar a financiar as eleições de 2018, o fundo eleitoral ficará sujeito à lógica partidária que privilegia caciques e políticos que já têm mandato nas disputas municipais do ano que vem. As eleições de 2020 serão as primeiras escolhas de prefeitos e vereadores em todo País bancadas majoritariamente por dinheiro público. Sem poder contar com recursos das doações empresariais, líderes partidários no Congresso Nacional já defenderam a ampliação do valor do fundo eleitoral com o argumento de que é preciso abranger disputas nos mais de cinco mil municípios brasileiros e democratizar a distribuição de recursos para os candidatos.

Levantamento feito pelo jornal O Estado de S. Paulo, com consultas a dirigentes e parlamentares dos 25 partidos que atuam no Congresso, porém, indica, no entanto, que a reserva bilionária ficará concentrada nas mãos de uma elite política, que deve usar a verba para fortalecer suas bases eleitorais nos Estados. Ao menos 17 legendas admitem a influência dos parlamentares eleitos na divisão do fundo. Sete siglas não definiram ou se recusaram a responder e outros dois negaram.

Ao entregar a Lei de Diretrizes Orçamentárias, no início de setembro, o governo federal reservou R$ 2,5 bilhões para o fundo eleitoral. Dias depois, no entanto, o Ministério da Economia informou que o valor seria revisto para R$ 1,86 bilhão. O Congresso ainda não tomou a decisão definitiva e parlamentares agem nos bastidores ampliar a reserva.

"Os deputados que têm mandato e base vão fazer a análise nos seus Estados e ver que têm condições de vencer. Vamos também ter um olhar especial para cidades com retransmissoras de TV", disse o deputado Baleia Rossi (SP), presidente nacional do MDB.

Além do MDB de Baleia Rossi, PP, PT, PSD, PSB, PSDB, DEM, Podemos, PSOL, PROS, Cidadania, PCdoB, Patriota, PV, PMN, Rede e Solidariedade confirmaram que a divisão do fundo eleitoral será decidida pelos deputados eleitos.

Segundo analistas consultados pelo Estado, a prática cria um obstáculo para a renovação, pois a tendência de quem já tem mandato é privilegiar aqueles que fazem parte do seu grupo político, deixando de irrigar campanhas que não são alinhadas aos seus projetos particulares.

Os recursos do fundo se tornaram munição na guerra interna do PSL, que viveu um racha entre os seguidores do presidente Jair Bolsonaro e o grupo do deputado Luciano Bivar, presidente nacional da sigla. Se for mantido o atual valor do fundo, o PSL terá direito à segunda maior parcela dos recursos. Nas eleições de 2018, a legenda recebeu cerca de R$ 9,2 milhões. Em 2020, aplicando-se as regras atuais, o partido vai receber R$ 230 milhões. Dono da maior bancada na Câmara, o PT terá direito à maior parte da reserva: R$248 milhões.

O fato de o tamanho da bancada influenciar a parcela do fundo que fica com o partido é usado pelo deputado Júlio Delgado (PSB-MG) para justificar a distribuição da verba pelos parlamentares. "Algumas cidades são estratégicas para os deputados. As eleições proporcionais deram a eles esses mandatos, e em função deles se constituiu o fundo. Portanto acho justo que eles sejam ouvidos."

O ex-deputado Roberto Freire, presidente do Cidadania, concorda: "A eleição do ano que vem não se encerra em 2020. Ela será uma passagem para 2022. Por isso os deputados federais são de fundamental importância na programação dos recursos", disse.

Para o sociólogo Rodrigo Prando, professor da Universidade Mackenzie, a concentração dos recursos do fundo eleitoral na mãos dos deputados vai dificultar a renovação do parlamento e fortalecer o poder dos caciques. "Esse dinheiro do fundo vai dar aos deputados uma vantagem competitiva nas eleições de 2022 em relação a quem não tem mandato, o que cria obstáculos para a renovação."

O cientista político Carlos Melo, do Insper, avalia que a medida cria um círculo vicioso que privilegia a elite dos partidos. "O dinheiro do fundo eleitoral tende a ficar concentrado em lideranças consolidadas e parlamentares que já têm mandato. Eles costumam ocupar cargos na executiva dos partidos e estabelecem os critérios internos de distribuição do fundo que os favorecem." As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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