Após o voto de quatro horas do ministro Dias Toffoli, que levantou uma série de dúvidas entre os colegas, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) retomou na tarde desta quinta-feira, 21, o julgamento que discute o compartilhamento de informações fiscais e bancárias pela Receita Federal e pela Unidade de Inteligência Financeira (UIF) - antigo Coaf - com o Ministério Público Federal.
Antes mesmo do início da sessão desta quinta-feira, ministros do STF discutiram reservadamente a possibilidade de delimitar o julgamento à Receita, excluindo o Coaf. Esse ponto já foi levantado no julgamento pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, e deve voltar à tona ao longo do debate na sessão de hoje, possivelmente, no voto do relator da Operação Lava Jato no STF, ministro Edson Fachin.
Pelo menos quatro ministros do STF não estão plenamente convencidos de que a ação em discussão no plenário, que se limitava originalmente à Receita Federal, pode ser ampliada a ponto de definir como deve ser feita a troca de informações do antigo Coaf.
Segundo o Estado/Broadcast Político apurou, o ministro Edson Fachin - que será o terceiro a se manifestar no julgamento - deve abordar essa questão. O ministro deve restringir o voto à questão da Receita, sem incluir o Coaf.
Para um outro ministro, se já é difícil julgar o caso concreto, "então imagina quando se parte para disciplinar de uma forma abrangente uma matéria como essa, tão palpitante, momentosa". Para um terceiro integrante da Corte, o julgamento não tem nada a ver com o Coaf.
Isso porque o caso analisado gira em torno de um processo de sonegação fiscal envolvendo donos de um posto de gasolina em Americana (SP). A defesa dos empresários acusam a Receita de extrapolar suas funções ao passar dados sigilosos sem aval da Justiça. O processo ganhou repercussão geral, ou seja, o entendimento firmado pelo Supremo deve ser aplicado para outros casos nos diversos tribunais do País.
Para o procurador-geral da República, Toffoli ampliou o escopo do caso levado a julgamento, incluindo também o Coaf, quando a discussão inicial tratava apenas da Receita.
Relator da ação, Toffoli determinou em julho a suspensão de diversos procedimentos de investigação apoiados em dados fiscais e bancários compartilhados sem o aval prévio da Justiça, o que beneficiou o senador Flávio Bolsonaro (RJ) em suposto esquema da "rachadinha" na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.
Entre os processos paralisados estão investigações sobre crimes contra a ordem tributária, relacionados à lavagem ou ocultação de bens, além de apurações sobre crimes ambientais na Amazônia, contrabando e corrupção. Se o Supremo decidir que é necessária a autorização de um juiz para o envio dos dados, a Lava Jato sofrerá mais uma derrota.
Um quarto ministro diz acreditar que a discussão tem várias nuances e que ainda tem muitas dúvidas sobre o assunto. Para esse ministro, o ideal seria se a Corte ganhasse mais tempo para se debruçar sobre o tema.
'Javanês'
No início da sessão desta quinta-feira, Toffoli procurou esclarecer pontos do voto proferido ontem, reafirmando os pontos que já haviam sido apresentados. Ao final da sessão de quarta-feira, o ministro Luís Roberto Barroso disse que "tem que chamar um professor de javanês" para compreender o voto do presidente do Supremo.
Para Toffoli, o antigo Coaf pode compartilhar informações com o Ministério Público e a Polícia, mas os dados devem ser repassados mediante sistemas de acesso restrito e vedadas outras formas de comunicação, como e-mail. Na avaliação de Toffoli, a UIF também não pode elaborar relatório de inteligência por "encomenda" contra cidadãos sem qualquer investigação criminal existente.
Esses dois pontos são contestados pela defesa de Flávio Bolsonaro, que utilizou esses argumentos para anular as investigações.
O presidente do STF também quer proibir a Receita de incluir nas chamadas Representações Fiscais para Fins Penais (RFFP) que envia ao Ministério Público, dados considerados sensíveis, como a íntegra de extratos bancários ou de declaração de imposto de renda, a não ser que solicite autorização da Justiça. Na prática, isso obrigaria a Receita a rever os procedimentos atualmente adotados.