O ministro da Economia, Paulo Guedes, chamou de “irresponsabilidade” o discurso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva de chamar o povo para rua. “Não se assustem, então, se alguém pedir o AI-5. Já não aconteceu uma vez?”, questionou. A declaração ocorreu, nessa segunda-feira (25/11), em entrevista coletiva em Washington. Ao deixar a prisão, o petista convocou a juventude para ir as ruas e seguir o exemplo do Chile e da Bolívia.
Na fala, o ministro comentava a crise social e institucional em países da América Latina. “Chamar povo para rua é de uma irresponsabilidade... Chamar o povo para rua pra dizer que tem o poder, para tomar. Tomar como? Aí o filho do presidente fala em AI-5, aí todo mundo se assusta, fala 'o que que é?' (...) Aí bate mais no outro. É isso o jogo? É isso o que a gente quer? Eu acho uma insanidade chamar o povo pra rua pra fazer bagunça. Acho uma insanidade”, afirmou.
Durante uma entrevista à jornalista Leda Nagle, publicada no fim do mês passado, o deputado federal Eduardo Bolsonaro afirmou que, se a esquerda radicalizasse no Brasil, como ocorria nos protestos no Chile naquele momento, era preciso "ter uma resposta que pode ser via um novo AI-5."
Já na declaração dessa segunda, Guedes disse que “assim que ele (Lula) chamou para a confusão, veio logo o outro lado e disse 'é, saia para a rua, vamos botar um excludente de ilicitude, vamos botar o AI-5, vamos fazer isso, vamos fazer aquilo. Que coisa boa, né? Que clima bom”, criticou o ministro.
O responsável pela economia na gestão de Bolsonaro também sugeriu que o projeto de lei de excludente de ilicitude para militares e agentes de segurança pública em operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) é uma resposta ao discurso de Lula. “Aparentemente digo que não (Bolsonaro não está com medo do Lula). Ele só pediu o excludente de ilicitude. Não está com medo nenhum, coloca um excludente de ilicitude. Vambora”, disse.
Ministro pediu off
Após a coletiva, Paulo Guedes pediu que as declarações fossem mantidas em off — que é a prática jornalística de não publicar ou não revelar de quem é uma declaração —, mas foi alertado que havia transmissão da coletiva. “É irresponsável chamar alguém pra rua agora pra fazer quebradeira. Pra dizer que tem que tomar o poder. Se você acredita numa democracia, quem acredita numa democracia espera vencer e ser eleito. Não chama ninguém pra quebrar nada na rua”, ponderou, logo após saber que tinha sido gravado.
“Este é o recado para quem está ao vivo no Brasil inteiro. Sejam responsáveis, pratiquem a democracia. Ou democracia é só quando o seu lado ganha? Quando o outro lado ganha, com dez meses você já chama todo mundo pra quebrar a rua? Que responsabilidade é essa? Não se assustem então se alguém pedir o AI5. Já não aconteceu uma vez? Ou foi diferente? Levando o povo pra rua pra quebrar tudo. Isso é estúpido, é burro, não está à altura da nossa tradição democrática”, prosseguiu.
Ele também foi questionado se achava a volta do AI-5 concebível. “É inconcebível, a democracia brasileira jamais admitiria, mesmo que a esquerda pegue as armas”. Guedes também reiterou a todo momento que fazia as declarações como “pessoa física”, não como ministro da Economia e que não caberia ao ministro da economia discutir com Lula.
O que foi o AI-5?
O Ato Institucional nº 5 (AI-5) foi uma das medidas mais duras e sombrias tomadas durante a ditadura militar. Emitido pelo presidente Artur da Costa e Silva em 13 de dezembro de 1968, resultou na suspensão de direitos políticos, demissões, intervenções nos estados e nos municípios e na suspensão de garantias constitucionais que resultaram na repressão, tortura e morte de opositores do regime.
O ato dava poderes quase que ilimitados ao presidente, como fechar o Congresso Nacional e demais casas legislativas por tempo indeterminado. Reuniões políticas não autorizadas pela polícia eram tidas como ilegais. Houve também a suspensão do habeas corpus por crimes de motivação política. O chefe do Executivo tinha ainda o poder de decretar a suspensão dos direitos políticos dos cidadãos considerados “subversivos”, privando-os da capacidade de votação ou de eleição.
Durante os 10 anos de vigência, o documento fundamentou a cassação do mandato de 110 deputados federais e sete senadores, 161 deputados estaduais, 22 prefeitos e 22 vereadores. No total, essas cassações descartaram arbitrariamente mais de seis milhões de votos. Por meio do AI-5, também foram cassados três ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), além de professores universitários e pesquisadores.