A Assembleia Legislativa vai votar nesta quarta-feira (4) o projeto de lei que garante o pagamento do 13º dos servidores de Minas Gerais, mas não do jeito que queria inicialmente o governador Romeu Zema (Novo). O texto que autoriza a venda de créditos do nióbio recebíveis até 2032 será apreciado com pelo menos duas travas, que serão incluídas pelos deputados em parecer nas comissões de Minas e Energia e Administração Pública nesta terça-feira (3). As mudanças são para impedir um possível prejuízo futuro de até R$ 10 bilhões para o estado com a operação financeira.
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A outra mudança no substitutivo vai determinar que, caso a Codemig e a Codemge voltem a ser uma única empresa, o comprador dos recursos da exploração da primeira (que são os colocados à venda) não passe a ter direito sobre os valores devidos à segunda companhia. O risco, também calculado em cerca de R$ 5 bilhões, se deve ao fato de a cisão da Codemig com a Codemge feita pelo governo Fernando Pimentel (PT) estar sendo discutida na Justiça.
No projeto de lei, o governo de Minas coloca à venda os direitos creditórios do nióbio pertencentes à Codemig (que são 49% dos dividendos pagos pela CBMM), deixando de fora os 51% da Codemge.
No formato atual, segundo o deputado João Vítor Xavier, não fica resguarda a possibilidade de a empresa voltar a ser incorporada pela Codemig por uma eventual decisão judicial. “Se amanhã cair a cisão, os compradores poderiam alegar ter direitos sobre a parte da Codemge. Aí comprariam 49% dos direitos do nióbio do estado e ficariam com 100%, porque poderia haver a interpretação de que o valor integral fica para quem comprou (os créditos)”, explicou.
Diferença do nióbio
Os outros cerca de R$ 5 bilhões, alvo da primeira emenda, foram apurados pela própria Codemig. É o valor que deixou de ser repassado ao estado ao longo dos anos por uma falha contratual, que a emenda vai resguardar como uma reparação de direito do estado. Ocorre que os lucros das duas minas operadas pela CBMM (uma de sua propriedade e uma do estado) foram divididos de forma igualitária, sendo que a jazida que pertence ao estado tem produção maior.
O valor do prejuízo para o estado foi afirmado pelo próprio presidente da Codemig Dante de Matos em audiência em maio deste ano na Assembleia, na qual ele pediu que a CBMN reconheça os teores reais do nióbio em Araxá.
De acordo com Matos, o teor de nióbio das reservas da Codemig é de 2,62% enquanto o da CBMM é de 2,22%. A constatação da Codemig foi sustentada por quatro pareceres jurídicos. Essa diferença nunca foi considerada no contrato firmado entre as partes em 1972. Na audiência pública no Legislativo, o deputado Ulysses Gomes (PT) calculou o prejuízo pela divisão incorreta, desde 2003, em cerca de R$ 5,5 bilhões.
O relator do projeto da cessão dos direitos creditórios do nióbio, deputado João Vitor Xavier, afirmou que o substitutivo que será apresentado foi discutido com representante do governo na sexta-feira e que houve concordância com a alteração.
Prejuízo de R$ 10 bilhões
“Podemos evitar um prejuízo ou uma briga judicial de R$ 10 bilhões para o estado, estamos falando, portanto, de uma filigrana de R$ 10 bilhões”, afirmou o parlamentar. A fala foi para alfinetar o colega Sargento Rodrigues (PTB), que durante audiência pública sobre o projeto do nióbio na última quarta-feira reclamou que os colegas que queriam discutir o projeto estavam se apegando a filigranas, ou detalhe insignificantes.
Na última reunião na comissão de Minas e Energia, representantes do Ministério Público de Contas apontaram falhas no projeto enviado pelo governador Romeu Zema e o risco de a operação ser lesiva ao estado, prejudicando inclusive os servidores públicos no futuro. Segundo o órgão, a precificação do produto feita pelo governo estaria equivocada, já que foram considerados os valores históricos e não uma prospecção para o setor no mercado, que “cresce vertiginosamente”. Também foram apontados a capacidade de ampliação de produção e o risco de a mina se exaurir em 2032.
Representante da Codemig no encontro, o diretor Ricardo Toledo afirmou que o valor que Minas espera receber pelos direitos do nióbio, estimado em R$ 4,5 bilhões no projeto, pode mudar. A negociação será feita na bolsa de valores.
A ausência do secretário de Planejamento e Gestão, Otto Levy, na reunião foi muito criticada. Por isso, ele participa de nova audiência no Legislativo marcada para a tarde desta segunda-feira, na qual terá de responder às dúvidas levantadas. Depois disso, as comissões de Minas e Energia e Administração Pública marcaram três reuniões cada na terça-feira, para garantir a aprovação dos pareceres elaborados em conjunto. A votação em plenário, conforme confirmou o presidente da Casa Agostinho Patrus (PV) será na manhã da quarta-feira.
Nióbio em Minas
Minas Gerais abriga a maior reserva de nióbio do mundo, responsável por cerca de 80% da produção mundial. O produto vale cerca de US$ 40 mil a tonelada, enquanto a mesma medida do minério de ferro vale cerca de US$ 120. A CBMM, que é do grupo Moreira Salles, mesma família que comanda o Itaú Unibanco, é vista como potencial compradora dos direitos creditórios que o governo de Minas vai colocar à venda.
No contrato praticado em Minas, a CBMM explora o nióbio e repassa 25% do lucro líquido ao governo estadual. Entre 2012 e 2018, a arrecadação da empresa com o produto foi de R$ 13.943.105.470,00, dos quais R$ 3.485.776.367,00 pertencem ao estado. Considerando esses valores, a projeção seria de que mais R$ 6 bilhões fossem repassados ao estado de 2020 até 2032.
Entenda a operação do nióbio que garante o pagamento do 13º
O que diz a proposta do governador Romeu Zema (PL 1205/19)
Autoriza o Executivo a ceder a pessoas jurídicas e fundos de investimento os direitos creditórios da Codemig até 31 de dezembro de 2032
O que isso significa
Esses valores são relativos à exploração do nióbio em Araxá pela Companhia Brasileira de Mineração e Metalurgia (CBMM). Pelo contrato atual, o estado fica com 25% do lucro líquido da exploração do produto, que é uma liga de metal
Minas Gerais é responsável por 80% da produção mundial de nióbio. O produto vale US$ 40 mil a tonelada, enquanto a mesma medida do minério de ferro vale cerca de US$ 120
O estado tem direito a cerca de R$ 1 bilhão por ano
Com a proposta, Zema vai vender 49% dos valores a que tem direito, que são a parte da Codemig. Os outros 51%, relativos à Codemge, continuarão sendo do estado, segundo o governo
Quais são as emendas (ou travas) que serão colocadas pelos deputados:
1 – Os cerca de 5 bilhões contabilizados pela Codemig que foram repassados a menos ao estado desde 2003 e são alvo de disputa entre a empresa e a CBMM não entrarão na cessão dos créditos. Ou seja, independentemente da venda, a CBMM (que é do grupo Moreira Sales, mesmo do Itaú Unibanco) continuará devendo essa possível reparação ao estado e não ao futuro comprador dos créditos.
Essa diferença de R$ 5 bilhões foi apurada porque, embora a mina do estado tenha um teor de nióbio 18% maior que a da CBMM, a companhia divide as lavras igualitariamente, nas proporções devidas.
2 – Os direitos creditórios da Codemge sobre o nióbio, que são de 51%, continuarão sendo do estado mesmo se a cisão da empresa com a Codemig, que é questionada na Justiça, for desfeita. A cláusula é para evitar que uma possível reincorporação da Codemge pela Codemig dê ao futuro comprador o direito sobre a outra metade dos lucros do estado sobre o nióbio.
3 – Na votação de primeiro turno, os parlamentares já aprovaram uma emenda prevendo que o governo divulgue na internet os valores de referência, o preço da venda, a identificação do comprador e demais informações sobre a cessão dos direitos creditórios do nióbio
De quanto o governo de Minas diz precisar:
R$ 3 bilhões
para quitar o 13º dos cerca de 600 mil servidores públicos mineiros
R$ 2 bilhões
para acabar com o parcelamento dos salários dos servidores por até seis meses
R$ 300 milhões
para pagar a primeira parcela de uma dívida de R$ 7 bilhões com os municípios mineiros