Brasília – O primeiro ano do governo do presidente Jair Bolsonaro chega ao fim sem que as principais promessas da campanha eleitoral para o combate à criminalidade tenham entrado efetivamente em vigor. A proposta de ampliação do acesso às armas de fogo e o pacote anticrime do ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, por exemplo, enfrentaram forte rejeição no Congresso e foram esvaziadas. A redução de vários índices de criminalidade em 2019 segue a tendência dos últimos anos e se deve, em grande parte, à atuação dos governos estaduais e municipais.
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PGR envia ao Planalto pedido de veto a 16 itens da lei anticrimeSenado aprova pacote anticrime de olho em possíveis vetos de BolsonaroCâmara aprova versão desidratada de pacote anticrime de MoroBolsonaro assina indulto de Natal que perdoa policiais condenadosBolsonaro afirma que 'Lula é carta fora do baralho'Desde o início do ano, Moro tem ocupado as redes sociais e o noticiário com um discurso que busca vincular ao governo os bons resultados nos índices de criminalidade. E seu ministério adota uma estratégia de comunicação com o mesmo objetivo.
Segundo balanço divulgado pela pasta em 12 de dezembro, a atuação do governo foi decisiva para a redução da ocorrência de nove tipos de crimes no país. "Estratégia, inteligência, integração e políticas públicas eficazes permitiram a redução significativa da criminalidade violenta em todo o país", diz publicação no site do ministério, acompanhada de estatísticas.
A pasta informa, por exemplo, uma redução de 22% nos casos de homicídio entre janeiro e agosto de 2019, em comparação a período semelhante de 2018 (veja abaixo). "Foram mais de 6.900 vidas preservadas", diz o texto oficial de divulgação. Queda também, segundo o órgão, nas ocorrências de estupro (-10,5%), tentativa de homicídio (-6,6%) e de outros tipos criminais. Quanto aos homicídios, a curva decrescente das ocorrências já vinha sendo registrada nos últimos anos. Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a redução dos casos desse tipo crime em 2018 foi de 10,4% na comparação com 2017.
Obstáculos
Em 4 de fevereiro, Moro apresentou o seu pacote anticrime a governadores e secretários estaduais de Segurança de todo o país. Com o endurecimento de leis e dos códigos Penal e de Processo Penal, a iniciativa foi anunciada como uma política para fortalecer o combate à corrupção, aos delitos violentos e ao crime organizado.Logo na sequência, o primeiro obstáculo foi colocado pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), que demonstrou irritação ante a pressão do ex-juiz da Lava-Jato pela aprovação da matéria. Na Casa, foram retiradas partes importantes do pacote anticrime, como a possibilidade de prisão após condenação em segunda instância e o chamado excludente de ilicitude – uma mudança legislativa que isentaria de punição cidadãos comuns e policiais que cometessem excesso em legítima defesa. E foi com um formato desidratado que o projeto do ministro foi aprovado no Senado no início de dezembro, após ter recebido o aval dos deputados. O próximo passo será a sanção do presidente, possivelmente com alguns vetos.
Armas
O governo federal também não conseguiu emplacar como queria a proposta de flexibilizar o Estatuto do Desarmamento para que todos os "cidadãos de bem" pudessem ter uma arma de fogo. Foram oito decretos sobre o assunto, e todos enfrentaram resistência. O Ministério Público Federal, por exemplo, pediu a suspensão do Decreto 9.785, que facilitava o porte de armas para algumas categorias profissionais, como advogados, caminhoneiros e políticos. As reedições, pelo Executivo, dos primeiros decretos também foram um reflexo do desgaste do tema.
Por fim, a flexibilização do Estatuto do Desarmamento foi bem menor do que o prometido durante a campanha presidencial, favorecendo um segmento restrito de caçadores, atiradores e colecionadores.
Um dos principais apoiadores das propostas do governo na área da segurança pública, o senador Major Olímpio (PSL) reconhece que a melhoria nos índices de criminalidade no país devem ser atribuída, principalmente, aos estados e municípios. Segundo ele, os efeitos das políticas federais para o setor, como o pacote anticrime, só deverão ser sentidos a longo prazo.
"Não se pode atribuir ao governo federal a responsabilidade pelos resultados positivos nessa área, até porque essa melhoria é uma tendência que tem sido verificada nos últimos anos em todo o país. Além disso, o governo federal, ao contrário do que se esperava, não reforçou os investimentos em segurança pública", disse o senador à reportagem.
Major Olímpio também questionou a postura do Ministério da Justiça de atribuir ao governo federal a decisão de isolar lideranças de facções criminosas em presídios federais. “As transferências dessas lideranças foram pedidas pelo Ministério Público e atendidas pelo juiz corregedor Paulo Sorci”, destacou o senador.
Medo
Arthur Trindade, professor do Departamento de Sociologia da Universidade de Brasília (UnB) e consultor do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, disse que, a despeito das condições políticas favoráveis, foram poucas as políticas públicas efetivamente implantadas pelo governo federal nessa área. "Mesmo assim, o presidente Bolsonaro conseguiu administrar as expectativas da população com relação à insegurança. Ele soube gerir o medo e chamou para si a responsabilidade sobre a segurança."Trindade destacou a importância do programa Em frente Brasil, lançado, em agosto pelo Ministério da Justiça. Voltada à redução de homicídios, a iniciativa prevê ações de repressão policial e de prevenção social. Inicialmente estão em andamento cinco projetos- piloto em Ananindeua (PA), Paulista (PE), Cariacica (ES), São José dos Pinhais (PR), e Goiânia (GO).
"Os primeiros resultados são bastante animadores. O primeiro relatório aponta redução de 44% nos homicídios desde o início do projeto, no fim de agosto, até 30 de novembro", observou o especialista, frisando, entretanto, ainda ser cedo para atribuir ao governo federal a responsabilidade pela melhoria dos índices de criminalidade em todo o país.
Redução de crimes violentos
De janeiro a agosto de 2019, comparado com o mesmo período de 2018
Homicídios -22%
Estupro -10,5%
Furto de veículos -11,1%
Lesão corporal seguida de morte -4,7%
Latrocínio -21,7%
Tentativa de homicídio -6,6%
Roubos a instituições financeiras -36,4%
Roubos de cargas -22,9%
Roubos de veículos -24,9%
Fonte: Ministério da Justiça e Segurança Pública