Jornal Estado de Minas

Montes Claros

Prefeito é acusado de pedaladas fiscais em cidade mineira


A não aplicação dos percentuais mínimos na educação e na saúde e alterações contábeis de dotações orçamentárias do município, por meio de decreto, as chamadas “pedaladas fiscais”. Essas são as denúncias feitas por quatro vereadores de Montes Claros (Norte de Minas) em representação que encaminharam ao Tribunal de Contas do Estado (TCE), ao Ministério Público Estadual (MPMG), ao Ministério Público Federal (MMF) e a outros órgãos de controle contra a atual administração municipal de Montes Claros, do prefeito Humberto Souto (Cidadania). O procurador do município, Otávio Batista Rocha, rebate todas as acusações e diz que elas não têm fundamento. Ele alega também “aproveitamento político da situação”.



A representação, assinada pelos vereadores Fábio Neves (PSB), Ildeu Maia (PP), Sérgio Pereira (DC) e Marlon Xavier (PTC), também foi encaminhada ao Ministério Público de Contas e à Polícia Federal. Em nota, a assessoria do prefeito afirma que as informações “são falsas”. Humberto Souto é ex-presidente do Tribunal de Contas da União (TCU).

Na denúncia, os vereadores, que se dizem "independentes" em relação à atual administração municipal, relatam que o chefe do Executivo propôs e firmou com o TCE um Termo de Ajustamento de Gestão (TAG) com “o objetivo de regularizar as informações relativas à execução orçamentária e financeira dos exercícios de 2017 e 2018”.

Os vereadores lembram que, na fundamentação do acórdão, “o atual prefeito de Montes Claros informou que teriam ocorrido problemas na execução do contrato com a sociedade empresarial Taylor Sistema Ltda., gerando graves pendências relativas à contabilização da receita, ao empenhamento da folha de pagamento, à prestação de contas dos anos de 2015 e 2016, ocasionando a impossibilidade material de a atual gestão adequar as prestações de contas, via Sistema Informatizado de Contas dos Municípios (Sicom), em tempo hábil, bem como entregar o Acompanhamento Mensal (AM) e o balancete e, consequentemente, as prestações de contas dos anos de 2017 e 2018”.



Os vereadores afirmam que no parecer do TCE “recomendando a reprovação das contas de 2017” foi verificado que, naquele ano, o município aplicou na educação 24,64% do seu orçamento, enquanto a Constituição Federal exige o mínimo de 25%, e que, nesse caso, deixaram de ser investidos no setor R$ 28 milhões, considerando o orçamento municipal de R$ 700 milhões no referido exercício.

Na representação, os denunciantes argumentam também que a Prefeitura de Montes Claros aplicou 7,48% do seu orçamento na saúde em 2017, enquanto o percentual mínimo exigido pela Constituição é de 15%, deixando de investir R$ 50 milhões na área.

Os  vereadores lembram que o prefeito fez o pedido do TAG junto ao TCE solicitando “autorização de reenvio do Acompanhamento Mensal, Balancete e Demonstrações Contábeis Aplicadas ao Setor Público (DCASP), via Sistema Informatizado de Contas dos Municípios (Sicom), dos exercícios de 2017 e 2018, e concessão de prazo de oito meses para tanto”. Entretanto, “para surpresa, o prefeito vem realizando, de fato, é a alteração dos atos legislativos e não a adequação das informações constantes do Sicom com as registradas no sistema contábil do órgão, na medida em que vem expedindo decretos de suplementação revogando os anteriores com efeitos retroativos”. Na denúncia, são relacionados vários decretos municipais alterando dotações orçamentárias, com efeitos retroativos.



Os vereadores também argumentam que a Prefeitura de Montes Claros destinou recursos arrecadados com a taxa de iluminação pública para obras de pavimentação asfáltica, o que, segundo eles, é ilegal. “O prefeito, desde o início de sua gestão, fala em honestidade e transparência. Prega ética, eficiência e compromisso com as pessoas de Montes Claros. Mas, na realidade, tem sido um governo que não respeita as pessoas e muito menos as normas legais”, acusa Fábio Neves em material distribuído para imprensa local.
 
Na representação, os vereadores solicitam que seja determinada liminarmente a proibição do prefeito de Montes Claros de “expedir decretos suplementares com efeito retroativo, tornando sem efeito os já editados e publicados”. Pedem que também seja determinada “a realização de inspeção e auditorias de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial in loco”. Requerem ainda que o chefe do Executivo seja citado para “apresentar defesa”.

OUTRO LADO

O procurador do município, Otávio Batista Rocha, disse que as denúncias apresentadas pelos vereadores não têm nenhum fundamento. Ele sustenta que a atual administração aplica em educação e saúde percentuais acima dos exigidos pela Constituição e que nunca praticou pedaladas fiscais, pautando-se pela lisura e ética.



“Essas afirmações feitas (pelos vereadores) não representam a realidade. Os gastos do município com educação e saúde, tanto em 2017 quanto em 2018, foram feitos rigorosamente dentro do que prevê a Constituição. Em 2018, os gastos com educação foram de quase 30% do orçamento, e com saúde, mais de 23%, bem acima do mínimo constitucional exigido. Em 2017, o gasto com educação foi da ordem de 27,5% e o gasto com saúde foi de mais de 30%, mais que o dobro exigido constitucionalmente”, assegura Rocha.

O procurador explica que foi firmado um TAG com o TCE devido à situação deixada pela gestão anterior, que, segundo ele, foi de calamidade financeira. Também lembrou que a gestão anterior teve as contas do seu último ano (2016) rejeitadas pela corte de Contas.

“A situação de caos contábil (da gestão passada) era tamanha que não possível em um ou dois anos readequar os saldos contábeis. Tivemos que mudar todo o sistema contábil, regularizar os saldos. Mais de 120 mil linhas contábeis foram refeitas. Toda essa conduta foi corroborada pelo Tribunal de Contas do Estado, que, por unanimidade, entendeu a situação e aprovou a readequação pedida pelo município”, assegurou o procurador.



Rocha alegou que também não existe ilegalidade no uso de recursos da taxa de iluminação para despesas como asfaltamento de ruas. “A Emenda Constitucional 93, de 2016, criou a obrigatoriedade da desvinculação dos recursos da iluminação pública”, salientou.

O procurador apontou o uso político-eleitoral das denúncias dos vereadores. “Refuto essas denúncias. Há uma conjuntura política a ser levada em conta. As eleições estão chegando. É natural que surja o aproveitamento político da situação.”
 

Sem partido

 
Fabio Neves foi candidato a vereador em  2016 e ficou na primeira suplência da coligação PSB/PTB. Em 2018, foi candidato a deputado estadual pelo Pros. Depois, retornou ao PSB e assumiu o cargo na Câmara, diante da  renúncia do ex-vereador Cláudio Prates (PTB) após decisão judicial. 

Neves diz que "atualmente" está filiado ao PSB. Mas a direção do partido em Minas diz que não o reconhece como integrante da sigla. O presidente do PSB em Minas, Renê Vilela, disse  que  Fabio Neves "nao representa o partido". Informou ainda que a sigla entrou com ação na Justiça para "reaver o mandato" na Câmara de Montes Claros para o médico João Paulo Bispo, segundo suplente da coligação PTB/PSB em 2016.