O presidente Jair Bolsonaro recuou ontem da ideia de desmembrar o Ministério da Justiça e Segurança Pública, comandado por Sérgio Moro, depois de uma forte reação de aliados, que viram na medida um esvaziamento do ex-juiz da Lava Jato no governo. Após dizer que a separação estava em estudo, Bolsonaro recebeu uma enxurrada de críticas em seu celular e nas redes sociais, enquanto estava a caminho da Índia, onde iniciou ontem uma visita oficial. "Vai trocar Moro por Fraga?", foi pergunta recorrente no WhatsApp do presidente.
Alberto Fraga, ex-deputado federal, amigo e interlocutor do presidente, questionou, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, o trabalho de Moro à frente da Segurança Pública. Assim que Bolsonaro anunciou que estudaria tirar do ministro a gestão dessa área, o nome de Fraga apareceu em primeiro lugar na bolsa de apostas para assumir a nova pasta.
Para um interlocutor direto do presidente ouvido pela reportagem, que preferiu não se identificar, durante o voo, o presidente compreendeu a confusão que criou e decidiu retificar o que havia dito. "A chance no momento é zero, tá bom? Não sei amanhã, na política tudo muda, mas não há essa intenção de dividir", disse Bolsonaro ao desembarcar em Nova Délhi, na manhã de ontem.
Em outro gesto, Bolsonaro pediu ao presidente em exercício, Hamilton Mourão, que chamasse Moro para uma conversa no Palácio do Planalto para acalmar os ânimos. Moro esteve lá na manhã de ontem e saiu sem falar com a imprensa.
No Ministério da Justiça, a avaliação é de que, apesar da declaração sobre "chance zero" de desmembrar a pasta, a situação se mantém "imprevisível". O que ainda desagrada a aliados do presidente e do ministro é que Bolsonaro recuou ao dizer que "em time que está ganhando não se mexe", mas deixou no ar uma porta aberta para a mudança ao declarar que, "na política, tudo muda". Caso o presidente leve adiante a ideia de recriar o Ministério da Segurança Pública, não há dúvidas no entorno de Moro de que ele deixará o governo.
Entrevista
A análise de aliados do ex-juiz da Lava Jato foi a de que Bolsonaro quis dar uma "alfinetada" nele por sua participação no programa Roda Vida, da TV Cultura, na segunda-feira. Para assessores do presidente, o ministro não defendeu Bolsonaro com a "ênfase esperada" durante o programa. O troco veio na sequência, com a ameaça de tirar do ministro a área mais importante de sua pasta. Caso a separação seja nos moldes do que era no governo de Michel Temer, Moro perderia o controle da Polícia Federal.
Inicialmente, a avaliação do grupo de Moro era a de que Bolsonaro admitiu dividir a pasta da Justiça apenas para agradar aos secretários de Estado que defenderam essa agenda em reunião no Planalto na quarta-feira. Mas as dúvidas de que ele poderia estar falando sério vieram quando o ministro da Secretaria-Geral, Jorge Oliveira, deu entrevista confirmando que o governo estudava a divisão do ministério, o que enfraqueceria Moro.
O que era considerada só uma "alfinetada" passou a ser percebida como uma medida formal quando anunciada pelo responsável pela análise jurídica do governo. Diante disso, Moro foi aconselhado a pedir demissão com base em dois questionamentos: 1) Se Bolsonaro o acha incapaz para gerir a segurança pública, o que ele estava fazendo no governo? 2) Se a razão não for pela incapacidade, então Bolsonaro não estaria conseguindo conviver com a popularidade do seu ministro?
Quem convive com Bolsonaro diz que a estratégia dele é sempre a mesma: ele lança uma ideia e fica "incomunicável" por um tempo (neste caso, por causa da viagem para a Índia) para "ver para onde o vento vai". Diante das repercussões negativas dentro e fora do governo, o presidente vem a público e tenta "minimizar os danos".
Fritar
O presidente concedeu ontem entrevista ao Jornal da Band, da TV Bandeirantes, e disse que não precisa "fritar" publicamente ministros com a intenção de demiti-los. Ele elogiou o trabalho de Moro na pasta, mas ressaltou o papel de governos estaduais na melhoria de índices de segurança pública do País.
"(Moro) Está fazendo um bom trabalho no tocante à segurança, juntamente com os secretários de Estado. Não é o trabalho nosso apenas, ele faz a parte dele", disse Bolsonaro. "Nenhum ministro meu vive acuado, com medo de mim. Minhas ações são bastante pensadas e muito bem conversadas antes", afirmou. "Eu não preciso 'fritar' ministro para demitir."
Encontro
Antes de se reunir com os secretários estaduais no Planalto, na quarta-feira, Bolsonaro recebeu, às 7h, no Palácio da Alvorada, residência oficial, o secretário de segurança do Distrito Federal, Anderson Torres. No encontro, Torres pediu ao presidente que recebesse o grupo na tarde do mesmo dia.
Diante da confirmação, os secretários se reuniram e discutiram uma agenda para levar ao presidente. Somente os representantes de São Paulo e Minas Gerais se posicionaram contra a recriação do ministério.
Torres, que é da Polícia Federal, é ligado ao ministro Jorge Oliveira. Já teve seu nome ventilado para ir para o comando da Polícia Federal no ano passado, quando se falava na saída de Maurício Valeixo, em mais um processo de tentativa de enfraquecimento de Moro. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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