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Estado de Minas O PROTESTO DOS MASCARADOS

Carnaval em BH eleva o tom de crítica à política

Foliões aproveitam a festa de Momo para manifestar-se contra políticos estampando máscaras com rosto do presidente, de ministros e outros personagens


postado em 22/02/2020 08:00 / atualizado em 22/02/2020 08:00

O comerciante Ricardo Menezes, com Bolsonaro e Sergio Moro nas mãos, diz que já vendeu quase todos os adereços, como rostos de políticos (foto: Gladyston Rodrigues/EM/d.a press)
O comerciante Ricardo Menezes, com Bolsonaro e Sergio Moro nas mãos, diz que já vendeu quase todos os adereços, como rostos de políticos (foto: Gladyston Rodrigues/EM/d.a press)
As chuvas em BH, a polêmica declaração sobre as empregadas domésticas do ministro da Economia, Paulo Guedes, e até a nova secretária de Cultura, Regina Duarte, deram um novo tom para as fantasias do carnaval de Belo Horizonte. O carnaval de Belo Horizonte tem sua história marcada por atos políticos. Seu ressurgimento, em 2009, veio depois da ocupação da Praça da Estação em protesto contra o então prefeito Márcio Lacerda, e, desde então, a festa chega sempre com crítica à política. Entre a tentativa de manter a sua essência e a chegada de uma multidão, muitos foliões optam por especificar suas lutas.

As fantasias politizadas são a forma mais procurada. Entre elas, as máscaras com o rosto do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), do ministro da Justiça, Sergio Moro, e da primeira-dama Michelle Bolsonaro estão entre as mais vendidas nas bancas e lojas. Segundo o comerciante Ricardo Menezes, que vende esse tipo de acessório em sua banca, “as máscaras demoraram para sair, mas agora mais perto do carnaval já vendemos quase tudo. As pessoas compram porque acham engraçado, para fazer graça”. “Eu acho que política tem muito a ver com carnaval, a gente manifesta um desejo de liberdade nessa época, extravasa, podendo manifestar e dizer as coisas que a gente pensa”, acrescenta.

''Esses tipos de fantasias são espécies de crônicas lúdicas de acontecimentos paradigmáticos da cena política nacional. A cada carnaval alguns acontecimentos e personagens parecem ser eleitos como focos das críticas''

José Márcio Pinto, professor de Antropologia da PUC Minas


Nos bloquinhos do pré-carnaval da capital mineira, várias dessas “sátiras” chamaram a atenção do público e divertem a grande massa. Vestidos de “fake news”, Zé de Abreu e Regina Duarte, “conservador de costumes e liberal da economia”, “coxinha e mortadela”, “onda conservadora”, “kit gay”, “Eduardo Bolsonaro vendendo hambúrguer”, “Lula na cadeia”, “empregadas do Paulo Guedes” e “Dilma bolada” os foliões usam da criatividade para brincar e levantar bandeiras políticas.

Folião convicto, desde a volta do carnaval belo-horizontino, Gustavo Euclydes transforma as fantasias em manifestação.“Já fui fantasiado de paneleiro, laranja do PSL, meninos vestem rosa e Bolsonaro”, conta. “Eu acho importante trazer esse debate para as ruas. O carnaval cresceu assim, de forma política. Nada mais justo que nesses tempos onde tudo está tão polarizado, trazer o debate de volta à praça pública”.

Outros carnavais

E para quem acha que esse tipo de fantasia está em alta apenas em 2020, não se engane. As fantasias repaginadas em atos políticos lotam as ruas brasileiras desde 2013, quando a polarização política se acirrou no país. Com o passar dos anos e mudanças de governo, os brasileiros trazem para o carnaval várias pautas e debates que ficaram em alta na mídia e nas redes sociais.

De acordo com o professor de antropologia da PUC Minas José Márcio Pinto, o carnaval anda junto com a política. “O carnaval é um acontecimento singular, na medida em que integra festa, crítica e protesto social. É essa articulação criativa e massiva do prazer com o protesto que faz do carnaval um evento único no Brasil. As fantasias, as marchinhas e a própria ocupação do espaço urbano são as formas de realizar essa junção. As fantasias de protestos e críticas são, na maioria das vezes, relacionadas a eventos e personagens do mundo da política, dada a característica da cultura do Brasil, onde os cidadãos compartilham pouca ou nenhuma confiabilidade em seus próprios representantes”, diz.

Em 2013, por exemplo, a onda das fantasias era a então presidente Dilma Rousseff. Caracterizados de todas as formas, as pessoas usavam a imagem  para criticar o governo petista. Anos depois, em 2018, o “vampiro” Temer era o mais cotado nas lojas de fantasia e adereços. No ano de 2019, a cor favorita dos foliões era o laranja, isso depois que o escândalo do PSL tomou conta das manchetes dos jornais.

“Esses tipos de fantasias são espécies de crônicas lúdicas de acontecimentos paradigmáticos da cena política nacional. A cada carnaval, alguns acontecimentos e personagens parecem ser eleitos como focos das críticas. Há também o papel da mídia, no sentido de plantar no imaginário social temas mais recorrentes”, explica o professor.

José Márcio enfatiza que “o carnaval não pode ser pensado como um momento de alienação do cidadão”. O professor explica que a época festiva é uma forma “muito criativa e eficaz de se expressar com liberdade, sem censura, aquilo que se pensa”.

*Estagiária sob supervisão de Marcílio de Moraes


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