O adiamento das manifestações marcadas para este domingo, 15, por causa do coronavírus não poupou o Congresso de ataques. Mesmo após ter vivido a maior renovação da história recente nas eleições de 2018, o Legislativo ainda é alvejado por críticas, como mostram pesquisas de opinião.
Após sugerir a suspensão dos atos, o presidente Jair Bolsonaro, que passou 28 anos no Congresso como deputado, teve apoio de seguidores ao dizer que "um tremendo recado ao Parlamento" foi dado nos últimos dias.
A percepção negativa se reflete nas pesquisas. Divulgado em dezembro, levantamento da Fundação Getúlio Vargas (FGV) sobre a imagem das instituições mostrou que 79% das pessoas não confiam no Congresso. Apenas 10% acham a atuação do Parlamento ótima ou boa.
No diagnóstico de ex-presidentes, políticos e analistas ouvidos pela reportagem, a explicação passa pelo excesso de privilégios dos parlamentares, por práticas de corrupção e "toma lá dá cá" e pelo hiato entre o resultado de votações no plenário e a melhoria no cotidiano da população.
Foi uma discussão sobre a concentração de uma fatia de recursos públicos nas mãos de deputados e senadores que levou Bolsonaro a alimentar a fogueira acesa dias antes pelo ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno. O chefe do GSI provocou um terremoto político ao acusar o Congresso de chantagear o Executivo.
Bolsonaro compartilhou um vídeo por WhatsApp incentivando as manifestações em defesa do governo - como revelou o jornal O Estado de S.Paulo - e, a partir daí, a convocação de atos contra o Congresso e o Judiciário foi feita nas plataformas digitais. Na prática, ao mesmo tempo em que impulsiona novas figuras da política, o terreno virtual expõe o poder.
Para o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, trata-se de um sintoma da crise de democracia representativa. "Com as redes sociais, as pessoas opinam diretamente e imaginam que as instituições representativas são dispensáveis", disse FHC. "A Lava Jato mostrou a teia que envolveu governo, empresas e alguns parlamentares. Além disso, o Poder Legislativo sempre foi mais aberto e, também, mais fácil de ser criticado."
O retrospecto do Congresso não ajuda. Escândalos como o dos anões do Orçamento (1993), do mensalão (2005) e a prisão do então presidente da Câmara, Eduardo Cunha (MDB-RJ), em 2016, afetaram a imagem do Legislativo e o desgaste se tornou irrestrito.
Na avaliação do ex-presidente Michel Temer, a generalização atrapalha. "Há uma tentativa de desacreditar o Congresso, uma coisa meio doentia até, e negativa para o País", afirmou ele, que também foi alvo da Lava Jato. "Algumas ações judiciais propostas contra membros do Legislativo, ao longo do tempo, criaram essa visão negativa de um órgão que é muito positivo para a democracia." Temer presidiu a Câmara três vezes.
A baixa credibilidade não é apenas saldo dos ruidosos protestos de 2013. Para o historiador e cientista político José Murilo de Carvalho, o descontentamento se agravou após 1964. "A ditadura manteve a instituição em situação de humilhante dependência do Executivo. Os eleitores eram obrigados a participar de uma farsa em que elegiam representantes que não os representavam e usavam o mandato apenas em benefício próprio, em arranjos clientelistas."
Trinta e cinco anos após o fim do regime, o resultado das urnas de 2018 sinalizava o início de uma nova relação entre representantes e representados. Naquele ano, surgiram novos personagens para 46 das 54 cadeiras em disputa no Senado e a Câmara mudou sua composição em 52%. Mesmo assim, esse aspecto não foi capaz de alterar de forma expressiva a opinião do eleitor. Pesquisa da XP Investimentos, feita em fevereiro, apontou que a avaliação ótima ou boa era de 19% quando os atuais parlamentares tomaram posse, caiu ao longo do ano e chegou a 10%. E, para 52% dos entrevistados, a expectativa para os próximos seis meses não é melhorar nem piorar. É ficar tudo como está.
As pessoas não entendem as atribuições dos Poderes e o senso comum prevalece, sobretudo entre aqueles que não acompanham e não conhecem as atribuições das Casas. É o que observa o cientista político Jairo Nicolau, professor do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil da FGV. "A população não tem noção da renovação. Sabe de um nome ou outro, mas não acompanha milimetricamente a atividade parlamentar. E a ideia dos privilégios, da autoproteção do Congresso, é bem explorada nas redes sociais."
Embora sejam alvo de críticas, líderes do Congresso estão convencidos de que atendem às demandas populares. Citam o trabalho para a aprovação das reformas e do equilíbrio fiscal como sinal de responsabilidade e consideram injustos os ataques sofridos pelos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP).
O ex-senador e ex-ministro Cristovam Buarque disse, porém, que a contribuição do Congresso ainda é pequena. "Onde o povo vê a construção de uma coesão e de um rumo para o País? O povo não vê. Claro que pior que o Congresso é o presidente que temos hoje. Mesmo assim, (o Legislativo) não atrai a simpatia da população pelo excesso de privilégios que têm os parlamentares em relação ao Brasil."
Para o jornalista e ex-deputado Fernando Gabeira, o Congresso tem se empenhado em algumas boas decisões reformistas. "Mas continua cobrando pedágios, na forma de fundos eleitorais, etc."
O próprio processo de escolha de candidatos aparece no radar das críticas ao Congresso. O sistema brasileiro é o proporcional. Com isso, não necessariamente o deputado mais votado ganha. Eleito 11 vezes para a Câmara, o ex-deputado e ex-ministro Miro Teixeira considera "um desastre" esse modelo. "O sistema de voto proporcional com quociente eleitoral se esgotou. No voto majoritário, a expressão popular do parlamentar contribui para o fortalecimento da instituição. No proporcional, é a instituição que vai fortalecer o titular do mandato."
Professor da USP, José Álvaro Moisés também questiona o sistema proporcional, em que correligionários disputam entre si, coligações põem ideologias distintas no mesmo pacote e candidatos menos votados podem ser eleitos. "Isso explica a distância que o Legislativo tem com relação aos representados. Em seis meses, as pessoas esquecem em quem votaram e não têm mais conexão."
O chef e empresário Junior Durski, dono da rede de restaurantes e hamburguerias Madero, disse à reportagem que o ato convocado para hoje ficou "pequenininho" diante da pandemia do novo coronavírus. "Tudo que estou fazendo nesse momento é olhar o coronavírus, administrando uma crise chegando", afirmou Durski, que é apoiador do presidente Jair Bolsonaro e sócio do apresentador Luciano Huck, apontado como candidato ao Planalto em 2022.
O sr. vai ao ato no Paraná?
Não sei. Tenho 3 milhões de clientes por mês para atender. Tudo que estou fazendo nesse momento é olhar o coronavírus, administrando uma crise chegando. Acho que isso é outra história. Não sei se deve ter ou não (manifestação). Não sei como vamos acordar amanhã com esse coronavírus. Acho que isso não é a prioridade no Brasil e não é a minha prioridade agora. Esse negócio de manifestação virou pequenininho perto do tamanho dessa crise que está chegando.
Fizeram campanha de boicote ao Madero após o sr. declarar apoio a Bolsonaro. Isso pegou?
Não pega. O barulho nas redes sociais não é o que as pessoas pensam. A rede social é muito dura. As pessoas que estão nas redes são muito provocativas, dos dois lados. Nunca foi meu estilo, meu negócio. Brigar é uma coisa, no mínimo, não inteligente. Se as pessoas não se entendem, que tentem conversar e se não der corta a relação e toca a vida. Com respeito. A rede social não funciona assim. É uma coisa chata que faz parte do Brasil.
O sr. se arrependeu de ter feito o vídeo de apoio ao ato?
Não me arrependi, mas também não me orgulho, não me aplaudo. Por que eu não fico quieto e vou fazer hambúrguer? Esse é o ponto. Estou muito mais preocupado com a chegada do coronavírus, o que a gente pode fazer para ajudar e se defender. Esse é o assunto do momento. Minha obrigação como patriota é tentar ajudar nesse problema. O coronavírus não vai escolher a direita ou a esquerda para infectar, vai pegar todo mundo e todo mundo está junto.
Como fica sua relação com seu sócio Luciano Huck, que tem projeto político?
Já conversamos muito, é meu amigo de longa data. Politicamente, ele tem opiniões diferentes da minha, e eu respeito muito a opinião dele. Se ele fosse presidente, seria muito bem-intencionado, tentaria fazer um bom governo e tem toda a condição para isso. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Após sugerir a suspensão dos atos, o presidente Jair Bolsonaro, que passou 28 anos no Congresso como deputado, teve apoio de seguidores ao dizer que "um tremendo recado ao Parlamento" foi dado nos últimos dias.
A percepção negativa se reflete nas pesquisas. Divulgado em dezembro, levantamento da Fundação Getúlio Vargas (FGV) sobre a imagem das instituições mostrou que 79% das pessoas não confiam no Congresso. Apenas 10% acham a atuação do Parlamento ótima ou boa.
No diagnóstico de ex-presidentes, políticos e analistas ouvidos pela reportagem, a explicação passa pelo excesso de privilégios dos parlamentares, por práticas de corrupção e "toma lá dá cá" e pelo hiato entre o resultado de votações no plenário e a melhoria no cotidiano da população.
Foi uma discussão sobre a concentração de uma fatia de recursos públicos nas mãos de deputados e senadores que levou Bolsonaro a alimentar a fogueira acesa dias antes pelo ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno. O chefe do GSI provocou um terremoto político ao acusar o Congresso de chantagear o Executivo.
Bolsonaro compartilhou um vídeo por WhatsApp incentivando as manifestações em defesa do governo - como revelou o jornal O Estado de S.Paulo - e, a partir daí, a convocação de atos contra o Congresso e o Judiciário foi feita nas plataformas digitais. Na prática, ao mesmo tempo em que impulsiona novas figuras da política, o terreno virtual expõe o poder.
Para o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, trata-se de um sintoma da crise de democracia representativa. "Com as redes sociais, as pessoas opinam diretamente e imaginam que as instituições representativas são dispensáveis", disse FHC. "A Lava Jato mostrou a teia que envolveu governo, empresas e alguns parlamentares. Além disso, o Poder Legislativo sempre foi mais aberto e, também, mais fácil de ser criticado."
Desgaste
O retrospecto do Congresso não ajuda. Escândalos como o dos anões do Orçamento (1993), do mensalão (2005) e a prisão do então presidente da Câmara, Eduardo Cunha (MDB-RJ), em 2016, afetaram a imagem do Legislativo e o desgaste se tornou irrestrito.
Na avaliação do ex-presidente Michel Temer, a generalização atrapalha. "Há uma tentativa de desacreditar o Congresso, uma coisa meio doentia até, e negativa para o País", afirmou ele, que também foi alvo da Lava Jato. "Algumas ações judiciais propostas contra membros do Legislativo, ao longo do tempo, criaram essa visão negativa de um órgão que é muito positivo para a democracia." Temer presidiu a Câmara três vezes.
A baixa credibilidade não é apenas saldo dos ruidosos protestos de 2013. Para o historiador e cientista político José Murilo de Carvalho, o descontentamento se agravou após 1964. "A ditadura manteve a instituição em situação de humilhante dependência do Executivo. Os eleitores eram obrigados a participar de uma farsa em que elegiam representantes que não os representavam e usavam o mandato apenas em benefício próprio, em arranjos clientelistas."
Trinta e cinco anos após o fim do regime, o resultado das urnas de 2018 sinalizava o início de uma nova relação entre representantes e representados. Naquele ano, surgiram novos personagens para 46 das 54 cadeiras em disputa no Senado e a Câmara mudou sua composição em 52%. Mesmo assim, esse aspecto não foi capaz de alterar de forma expressiva a opinião do eleitor. Pesquisa da XP Investimentos, feita em fevereiro, apontou que a avaliação ótima ou boa era de 19% quando os atuais parlamentares tomaram posse, caiu ao longo do ano e chegou a 10%. E, para 52% dos entrevistados, a expectativa para os próximos seis meses não é melhorar nem piorar. É ficar tudo como está.
As pessoas não entendem as atribuições dos Poderes e o senso comum prevalece, sobretudo entre aqueles que não acompanham e não conhecem as atribuições das Casas. É o que observa o cientista político Jairo Nicolau, professor do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil da FGV. "A população não tem noção da renovação. Sabe de um nome ou outro, mas não acompanha milimetricamente a atividade parlamentar. E a ideia dos privilégios, da autoproteção do Congresso, é bem explorada nas redes sociais."
Embora sejam alvo de críticas, líderes do Congresso estão convencidos de que atendem às demandas populares. Citam o trabalho para a aprovação das reformas e do equilíbrio fiscal como sinal de responsabilidade e consideram injustos os ataques sofridos pelos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP).
Contribuição
O ex-senador e ex-ministro Cristovam Buarque disse, porém, que a contribuição do Congresso ainda é pequena. "Onde o povo vê a construção de uma coesão e de um rumo para o País? O povo não vê. Claro que pior que o Congresso é o presidente que temos hoje. Mesmo assim, (o Legislativo) não atrai a simpatia da população pelo excesso de privilégios que têm os parlamentares em relação ao Brasil."
Para o jornalista e ex-deputado Fernando Gabeira, o Congresso tem se empenhado em algumas boas decisões reformistas. "Mas continua cobrando pedágios, na forma de fundos eleitorais, etc."
O próprio processo de escolha de candidatos aparece no radar das críticas ao Congresso. O sistema brasileiro é o proporcional. Com isso, não necessariamente o deputado mais votado ganha. Eleito 11 vezes para a Câmara, o ex-deputado e ex-ministro Miro Teixeira considera "um desastre" esse modelo. "O sistema de voto proporcional com quociente eleitoral se esgotou. No voto majoritário, a expressão popular do parlamentar contribui para o fortalecimento da instituição. No proporcional, é a instituição que vai fortalecer o titular do mandato."
Professor da USP, José Álvaro Moisés também questiona o sistema proporcional, em que correligionários disputam entre si, coligações põem ideologias distintas no mesmo pacote e candidatos menos votados podem ser eleitos. "Isso explica a distância que o Legislativo tem com relação aos representados. Em seis meses, as pessoas esquecem em quem votaram e não têm mais conexão."
'Manifestações ficaram pequenininhas'
O chef e empresário Junior Durski, dono da rede de restaurantes e hamburguerias Madero, disse à reportagem que o ato convocado para hoje ficou "pequenininho" diante da pandemia do novo coronavírus. "Tudo que estou fazendo nesse momento é olhar o coronavírus, administrando uma crise chegando", afirmou Durski, que é apoiador do presidente Jair Bolsonaro e sócio do apresentador Luciano Huck, apontado como candidato ao Planalto em 2022.
O sr. vai ao ato no Paraná?
Não sei. Tenho 3 milhões de clientes por mês para atender. Tudo que estou fazendo nesse momento é olhar o coronavírus, administrando uma crise chegando. Acho que isso é outra história. Não sei se deve ter ou não (manifestação). Não sei como vamos acordar amanhã com esse coronavírus. Acho que isso não é a prioridade no Brasil e não é a minha prioridade agora. Esse negócio de manifestação virou pequenininho perto do tamanho dessa crise que está chegando.
Fizeram campanha de boicote ao Madero após o sr. declarar apoio a Bolsonaro. Isso pegou?
Não pega. O barulho nas redes sociais não é o que as pessoas pensam. A rede social é muito dura. As pessoas que estão nas redes são muito provocativas, dos dois lados. Nunca foi meu estilo, meu negócio. Brigar é uma coisa, no mínimo, não inteligente. Se as pessoas não se entendem, que tentem conversar e se não der corta a relação e toca a vida. Com respeito. A rede social não funciona assim. É uma coisa chata que faz parte do Brasil.
O sr. se arrependeu de ter feito o vídeo de apoio ao ato?
Não me arrependi, mas também não me orgulho, não me aplaudo. Por que eu não fico quieto e vou fazer hambúrguer? Esse é o ponto. Estou muito mais preocupado com a chegada do coronavírus, o que a gente pode fazer para ajudar e se defender. Esse é o assunto do momento. Minha obrigação como patriota é tentar ajudar nesse problema. O coronavírus não vai escolher a direita ou a esquerda para infectar, vai pegar todo mundo e todo mundo está junto.
Como fica sua relação com seu sócio Luciano Huck, que tem projeto político?
Já conversamos muito, é meu amigo de longa data. Politicamente, ele tem opiniões diferentes da minha, e eu respeito muito a opinião dele. Se ele fosse presidente, seria muito bem-intencionado, tentaria fazer um bom governo e tem toda a condição para isso. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.