O presidente da República, Jair Bolsonaro e o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, vêm discordando publicamente sobre o modo com que o Brasil deve lidar com a crise do coronavíus. Enquanto Mandetta recomenda o isolamento social como a melhor estratégia para evitar mortes e uma sobrecarga no sistema de saúde, Bolsonaro se mostra preocupado com as perdas econômicas e defende a liberação dos trabalhadores que não são do grupo de risco.
Relembre os principais atritos que marcaram a relação do presidente com o ministro desde o agravamento da pandemia no Brasil. Inicialmente, enquanto a crise ia se agravando e mais casos eram confirmados no Brasil, Mandetta tentava alinhar seu discurso ao do chefe. Os dois falavam em público um ao lado do outro. Porém, à medida que Bolsonaro não só defendia o chamado "isolamento vertical" como também desrespeitava a orientação de seu ministro, saindo às ruas, Mandetta começou a defender mais expressamente a sua posição.
Relembre os principais atritos que marcaram a relação do presidente com o ministro desde o agravamento da pandemia no Brasil.
15 de março
Jair Bolsonaro participou de manifestações que se diziam contra o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Congresso. O presidente cumprimentou apoiadores e postou vídeos dos atos nas redes sociais. Porém, o presidente havia dito, pouco antes, que os atos deveriam ser repensados. Ele havia acabado de voltar de viagem dos EUA, de onde boa parte de sua comitiva contraiu o coronavírus.
Procurado para comentar, Mandetta minimizou a situação. Disse que era válido criticar o presidente, mas que as praias estavam lotadas. “Eu tenho minhas falhas também, cometo meus erros. Não é por isso que vamos ficar apontando dedos”, afirmou.
22 de março
Bolsonaro e Mandetta participaram de uma reunião por videoconferência com prefeitos de capitais. O presidente criticou o “alarmismo”, com que a imprensa tratava a crise, em sua avaliação. Também disse que o Brasil não pode ser comparado com a Itália- um dos países mais afetados pelo coronavírus – por ser uma nação com mais idosos e densidade populacional maior.
Nesse dia, Mandetta não fez nenhuma consideração contrária ao que o chefe falou. Porém, depois, com o avanço da crise, o ministro reforçou a gravidade da situação e apontou o quadro da Itália como um dos que o Brasil poderia alcançar caso não fossem tomadas medidas.
29 e 30 de março
Em um domingo, Bolsonaro saiu às ruas de Brasília, conversou e tirou foto com apoiadores. Contrariando a recomendação de isolamento de seu próprio Ministério da Saúde. “O povo quer trabalhar”, disse ao público que o acompanhou. Enquanto isso, o Brasil contabilizava 4.309 casos e 139 mortes por coronavírus.
No dia seguinte, em entrevista coletiva no Palácio do Planalto, Mandetta não pode comentar a saída do presidente. Quando um repórter questionou o ministro se Bolsonaro podia ter feito o que fez, o ministro chefe da Casa Civil, Walter Braga Netto, encerrou a coletiva.
2 e 3 de abril
Talvez o maior volume de críticas de Jair Bolsonaro contra o ministro da Saúde veio em entrevista à rádio Jovem Pan, na quinta-feira (2). O presidente declarou que faltava “humildade” a Mandetta, e que ele deveria ouvi-lo mais sobre o combate ao coronavírus. Apesar de dizer que não pensava em demitir o ministro “no meio da guerra”, Bolsonaro disse que nenhum ministro do governo é “indemissível”. “O Mandetta já sabe que a gente está se bicando há algum tempo. Agora, em algum momento ele extrapolou”, afirmou o presidente.
Na entrevista, Bolsonaro ainda comentou que não enfrentou Mandetta na questão do isolamento social por temer acusações de opositores de que teria agravado a crise do coronavírus no Brasil. O presidente afirmou que analisaria a possibilidade de liberar a circulação e o funcionamento do comércio na próxima semana.
No dia seguinte a essa entrevista, Mandetta participou da coletiva de imprensa diária do governo federal no Palácio do Planalto. Questionado sobre a possibilidade de ser demitido, Madetta respondeu: “Médico não abandona paciente”. Na entrevista, o ministro se mostrou preocupado com ideias de relaxar o isolamento social, como defendidas pelo presidente. “Não adianta alguém também na primeira semana, na segunda semana que a gente está enfrentando a situação, a gente já chegar e falar: ‘ah,não, vou não, chega, pra mim tá bom, já deu, vamos deixar acontecer’”, argumentou o ministro.
Por outro lado, Mandetta disse entender a posição do presidente, já que ele estaria sofrendo pressão de empresários para liberar a circulação. A avaliação do chefe da Saúde é ver aos poucos a possibilidade de afrouxar o isolamento. O ministro disse entender as críticas, e que para ele o atrito com o chefe é “muito tranquilo”. Mandetta reconheceu que não é “dono da verdade” e que não há “fórmula pronta” para enfrentar o vírus.
Em 3 de abril, uma pesquisa do Datafolha indicava que 76% dos brasileiros aprovavam a atuação do Ministério da Saúde na crise, enquanto 30% aprovaram as ações do presidente Bolsonaro.
5 de abril
Em conversa com apoiadores no Palácio da Alvorada, Bolsonaro afirmou que “algo subiu na cabeça” de integrantes do governo, que estariam “se achando”. Sem citar Mandetta, o presidente ressaltou que a “hora” dessas pessoas iria chegar, e que sua "caneta funciona'.
Mais tarde, questionado por um jornalista sobre a fala do presidente, Mandetta disse que estava dormindo e procuraria saber sobre no outro dia.