O pesquisador Xulio Ríos, diretor do Observatório da Política Chinesa e coordenador da Rede Iberoamericana de Sinologia, afirma que o incidente diplomático entre os governos Jair Bolsonaro e Xi Jinping é um exemplo do "fim da modéstia chinesa".
Qual a importância do Brasil para a política externa chinesa?
Muito importante, sem dúvida, pelo que representa na América Latina e por seus significados na estratégia multipolaridade. O mimetismo retórico do governo é um revés importante para a China, que estava muito mais confortável com os governos do PT. Se a linha atual for aprofundada, o distanciamento será inevitável e poderá afetar áreas de interesse do Brasil, como o agronegócio. Não seria uma mudança abrupta, mas progressiva.
É algo novo na diplomacia chinesa a atitude do embaixador Yang Wanming?
É relativamente novo e pouco frequente, embora em ascensão. Houve casos semelhantes, mas não do mesmo tamanho, por exemplo, no Chile e na França, embora normalmente se refiram a críticas de terceiros (EUA, por exemplo) à sua política em um determinado país. Geralmente são "esclarecimentos". É a "diplomacia chinesa da nova era", como diria o presidente Xi Jinping. Tem a ver com o fim da modéstia chinesa, um processo anterior a Xi e que começa na Olimpíada (de 2008). Trata-se de uma diplomacia sem complexos, exercida por um país que em pouco tempo poderá se tornar a principal potência do mundo. Xi pediu a seus diplomatas mais ativismo. Isso pode ser confuso, porque é algo a que não estávamos acostumados.
Que efeitos essa discussão pode gerar no comércio exterior?
A China conhece bem a complexidade política do Brasil e sabe distinguir, na sociedade e no governo, quem é aliado e quem não é. Um esfriamento diplomático pode afetar alguns projetos, mas ambas as partes estão interessadas em limitar os efeitos e colocar a cooperação em horizonte de médio prazo, no qual muitas coisas podem mudar.
O que o senhor diz sobre o embaixador Yang Wanming?
Nenhum embaixador chinês age profissionalmente em função de seu nível de veemência pessoal. Yang Wanming também não. Isso custaria a ele o emprego.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.