Desde o agravamento da crise do coronavírus no Brasil, o presidente da República, Jair Bolsonaro, e o ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, vinham se desentendendo sobre como enfrentar o problema. Depois de um mês de atritos, nesta quinta-feira (16), o presidente decidiu demitir Mandetta do cargo. O principal ponto da discórdia entre os dois era sobre a necessidade e o nível do isolamento social empregado para frear o avanço do vírus.
Relembre, em ordem cronológica, os principais atritos que marcaram a relação do presidente com o ex-ministro desde o agravamento da pandemia no Brasil.
Inicialmente, enquanto a crise ia se agravando e mais casos eram confirmados no Brasil, Mandetta tentava alinhar seu discurso ao do chefe. Os dois falavam em público um ao lado do outro. Porém, à medida que Bolsonaro não só defendia o chamado "isolamento vertical" como também desrespeitava a orientação de seu ministro, saindo às ruas frequentemente, Mandetta começou a defender mais expressamente a sua posição.
15 de março
Procurado para comentar, Mandetta minimizou a situação. Disse que era válido criticar o presidente, mas que as praias estavam lotadas. “Eu tenho minhas falhas também, cometo meus erros. Não é por isso que vamos ficar apontando dedos”, afirmou.
22 de março
Bolsonaro e Mandetta participaram de uma reunião por videoconferência com prefeitos de capitais. O presidente criticou o “alarmismo”, com que a imprensa tratava a crise, em sua avaliação. Também disse que o Brasil não pode ser comparado com a Itália- um dos países mais afetados pelo coronavírus – por ser uma nação com mais idosos e densidade populacional maior.
29 e 30 de março
No dia seguinte, em entrevista coletiva no Palácio do Planalto, Mandetta não pode comentar a saída do presidente. Quando um repórter questionou o ministro se Bolsonaro podia ter feito o que fez, o ministro chefe da Casa Civil, Walter Braga Netto, encerrou a coletiva.
2 e 3 de abril
Talvez o maior volume de críticas de Jair Bolsonaro contra o ministro da Saúde veio em entrevista à rádio Jovem Pan, na quinta-feira (2). O presidente declarou que faltava “humildade” a Mandetta, e que ele deveria ouvi-lo mais sobre o combate ao coronavírus. Apesar de dizer que não pensava em demitir o ministro “no meio da guerra”, Bolsonaro disse que nenhum ministro do governo é “indemissível”. “O Mandetta já sabe que a gente está se bicando há algum tempo. Agora, em algum momento ele extrapolou”, afirmou o presidente.
Na entrevista, Bolsonaro ainda comentou que não enfrentou Mandetta na questão do isolamento social por temer acusações de opositores de que teria agravado a crise do coronavírus no Brasil. O presidente afirmou que analisaria a possibilidade de liberar a circulação e o funcionamento do comércio na próxima semana.
No dia seguinte a essa entrevista, Mandetta participou da coletiva de imprensa diária do governo federal no Palácio do Planalto. Questionado sobre a possibilidade de ser demitido, Madetta respondeu: “Médico não abandona paciente”. Na entrevista, o ministro se mostrou preocupado com ideias de relaxar o isolamento social, como defendidas pelo presidente. “Não adianta alguém também na primeira semana, na segunda semana que a gente está enfrentando a situação, a gente já chegar e falar: ‘ah,não, vou não, chega, pra mim tá bom, já deu, vamos deixar acontecer’”, argumentou o ministro.
Em 3 de abril, uma pesquisa do Datafolha indicava que 76% dos brasileiros aprovavam a atuação do Ministério da Saúde na crise, enquanto 30% aprovaram as ações do presidente Bolsonaro.
5 e 6 de abril
Em conversa com apoiadores no Palácio da Alvorada, Bolsonaro afirmou que “algo subiu na cabeça” de integrantes do governo, que estariam “se achando”. Sem citar Mandetta, o presidente ressaltou que a “hora” dessas pessoas iria chegar, e que sua "caneta funciona'.
Mais tarde, questionado por um jornalista sobre a fala do presidente, Mandetta disse que estava dormindo e procuraria saber sobre no outro dia.
Na fala, Mandetta defendeu o trabalho de seus suburdinados na pasta. "O trabalho que fazemos é trabalho técnico. A única coisa que eu faço é ser porta-voz do trabalho técnico de vocês. De vez em quando, não é muito comum, dou apenas alguns pequenos palpites. Alguns pequenos palpites", afirmou.
8 de abril
Bolsonaro e Mandetta tiveram uma reunião privada no Palácio do Planalto, como não faziam há algum tempo. Na saída do encontro, Mandetta não falou com a imprensa. Logo depois, quem entrou no gabinete presidencial foi Osmar Terra.
Mais tarde, Mandetta elogiou o presidente. “É muito parceiro, muito voluntarioso e tem um pensamento muito forte no Brasil. A gente vai dando passos rumo a uma unidade muito boa por parte do governo”, disse.
9 de abril
Na transmissão ao vivo semanal no Facebook, Bolsonaro ironizou a fala de Mandetta, sobre um médico não abandonar o paciente. "O médico não abandona o paciente, mas o paciente pode trocar de médico", afirmou.11 de abril
Bolsonaro foi até Águas Lindas, em Goiás, inspecionar o hospital de campanha que está sendo construído na cidade. O governador do estado, Ronaldo Caiado (DEM) recebeu a comitiva do presidente, que contava, entre outros ministros, com Mandetta. Como Caiado é um ex-aliado que rompeu politicamente com o presidente e Mandetta não aparecia ao lado de Bolsonaro há algum tempo, o evento foi visto como uma tentativa de reaproximação.
12 de abril
15 de abril
O secretário nacional de Vigilância em Saúde, Wanderson de Oliveira, pediu demissão do cargo. Ele é considerado um homem de confiança de Mandetta na pasta. Em carta de despedida aos funcionários do ministério, Oliveira disse que a saída do ministro da Saúde já estava planejada, mas que não era possível saber quando viria.
Mais tarde, o ministro da Saúde anunciou que recusou o pedido de demissão do secretário. Em entrevista coletiva ao lado do Oliveira, Mandetta afimou que "entramos juntos e saíremos todos juntos" do ministério.
16 de abril
Mandetta afirmou, em um seminário videoconferência, que a sua demissão poderia vir neste dia ou no outro. "Nós temos uma perspectiva de troca aqui no ministério. Deve ser hoje, mais tardar amanha, mas enfim isso deve ser concretizar", admitiu.
Na parte da tarde, Mandetta foi chamado para uma reunião com o presidente Bolsonaro no Palácio do Planalto. Na conversa, Bolsonaro informou o ministro de sua demissão. Segundo Mandetta, a conversa foi "amistosa" e "agradável".