Brasília – A Polícia Federal identificou o vereador Carlos Bolsonaro, filho do presidente Jair Bolsonaro, como um dos articuladores do esquema de divulgação de fake news, segundo investigação sigilosa conduzida pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Ele é apontado como responsável pelo chamado “gabinete do ódio” no Planalto para atacar críticos do governo. Nos últimos meses, o presidente pediu informações, em reuniões e por telefone, de Maurício Valeixo, demitido do comando da PF na sexta-feira. Um dos quatro delegados que atuam no inquérito é Igor Romário de Paula, que coordenou a Lava-Jato em Curitiba quando Sergio Moro era o juiz da operação. Valeixo foi superintendente da PF no Paraná no mesmo período e escalado por Moro para o comando da PF.
Na Polícia Federal não há dúvidas de que Bolsonaro vinha pressionando Valeixo, homem de confiança de Moro, porque já havia certeza de que a investigação tinha chegado a Carlos, vereador do Rio de Janeiro. Para Bolsonaro, tirar Valeixo do comando da PF poderia abrir caminho para obter informações sobre a investigação, inclusive trocar delegados responsáveis pelo caso. Por isso, na sexta-feira, o ministro do STF Alexandre de Moraes, relator do caso, se antecipou e determinou que a PF mantenha os mesmos delegados na investigação.
O inquérito começou em março do ano passado por ordem do presidente do STF, Dias Toffoli, para investigar fake news com ameaças aos ministros. Carlos Bolsonaro é suspeito de ser um dos líderes de grupo que divulga notícias falsas para intimidar autoridades públicas pela internet. A participação do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), irmão de Carlos, também é investigada. Jair Bolsonaro indicou o diretor-geral da Agência Brasil de Inteligência (Abin), Alexandre Ramagem, amigo de Carlos, para a assumir a PF.
SUCESSÃO NA PF
Os dois se aproximaram na campanha eleitoral de 2018, quando Ramagem atuou no controle da segurança de Jair Bolsonaro depois da facada que ele sofreu em Juiz de Fora. Carlos convenceu o pai a indicar Ramagem para a vaga de Valeixo. Os dois se tornarammais próximos ainda Ramagem passou a ocupar cargo de assessor especial no Planalto.
Na última quinta-feira, Bolsonaro enviou mensagem por WhatsApp a Moro Moro com um link do site Antagonista com informação sobre o inquérito das fake news com o título "PF na cola de 10 a 12 deputados bolsonaristas". "Mais um motivo para a troca", disse o presidente a Moro, referindo-se à sua intenção de tirar Valeixo. Moro disse a ele que a investigação era conduzida por Alexandre Moraes, e não por Valeixo.
Os delegados que apuram a divulgação de fake news também investigam as manifestações a favor de intervenção militar no país, uma delas contou com a participação de Jair Bolsonaro, no domingo passado. Há expectativa no STF de que os dois inquéritos, fake news e protestos, vão se cruzar, porque empresários que financiaram esquema de notícias falsas também estariam envolvidos na organização das manifestações. Coincidência ou não, Bolsonaro apertou o cerco a Valeixo depois da abertura da nova investigação pelo Supremo.
Deputada divulga mensagens
Brasília – Depois de postar nas redes sociais, na noite de sexta-feira, vídeo questionando a divulgação de troca de mensagens entre ela e o ex-ministro Sérgio Moro, a deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP) divulgou ontem outras imagens da conversa, que teria ocorrido na última quinta-feira, véspera do anúncio do pedido de demissão de Moro do Ministério da Justiça e Segurança Pública.
Carla Zambelli mostrou os novos prints. “Por favor, fica”, escreveu na ocasião pelo WhatsApp. “O sr. é muito maior do que um cargo. O Brasil depende do sr. estar no MJ. Entendo sua frustração. Pelo amor de Deus, me deixe ajudar”, enviou a deputada ao até então ministro. A parlamentar continua: “Vamos amanhã marcar 07h00 com o PR lá no Alvorada. A gente conversa e ele lhe garante a vaga no STF este ano”, ao que Moro respondeu: 'Já falei com ele'”.
Ao se justificar, a deputada disse que não era novidade que Moro tinha interesse em integrar o Supremo Tribunal Federal. “É uma conversa que se tem em Brasília desde que o ministro entrou. Ontem, ele deixou claro que o presidente não prometeu essa vaga para ele, mas, é claro, todo mundo esperava que o ministro Moro, que foi o juiz da Lava-Jato, em algum momento fosse para o Supremo”, disse.
Em outra mensagem, Moro autoriza Carla Zambelli a falar com Jair Bolsonaro. Ela diz que entrou em contato com ele e que o presidente não queria que ele saísse. “Nem quero sair, mas preciso de condições de trabalho”, respondeu Sergio Moro. A deputada continuou. “O Valeixo pediu demissão? O PR propôs o seguinte: Já que o Valeixo pediu para sair, deixa o cargo vago por alguns dias. Vocês conversam com calma, se conhecem melhor (que está faltando desde o começo do mandato) e decidem juntos um nome. O que você acha?” Em outro trecho da conversa, ainda sobre a questão de Maurício Valeixo, agora ex-diretor-geral da Polícia Federal (PF), Moro responde “Carla, não vou tratar essas questões por escrito. O PR já tem todas as informações”.
Zambelli disse que tinha a intenção de criar uma ponte entre Moro e Bolsonaro para evitar desentendimentos. “Quando você trabalha intimamente com alguém, que tem que confiar, tem que ser mútuo. Eu acho eu faltava uma conversa entre os dois, para parar com os problemas como esse que vocês viram ontem”, disse neste sábado.
PSDB propõe CPI mista
Brasília – A bancada do PSDB na Câmara dos Deputados defenderá a abertura de uma comissão parlamentar de inquérito mista com deputados e senadores (CPMI) para investigar as acusações do ex-ministro Sergio Moro ao presidente Jair Bolsonaro. Os deputados tomaram a decisão em reunião por videoconferência na noite de sexta-feira. O líder do PSDB na Câmara, Carlos Sampaio (SP), afirmou que a situação é muito grave, mas, por enquanto, não há provas, por isso, é necessária investigação do Congresso. “É uma oportunidade do Moro falar sua versão, do próprio presidente Bolsonaro dar sua versão. A investigação é o caminho mais sereno e mais correto”, disse o deputado.
Pedidos de CPI necessitam de apoio dos congressistas, mas quem decide pela instalação ou não é o presidente da Casa. No caso de CPIs mistas, a prerrogativa é do presidente do Congresso, Davi Alcolumbre (DEM-AP). Enquanto não houver provas do que Moro disse, não há motivo para impeachment.
Demissão
Já a demissão do delegado Maurício Valeixo do comando da Polícia Federal é alvo dos senadores Randolfe Rodrigues (Rede-AP) e Fabiano Contarato (Rede-ES). Eles entraram na Justiça com ação popular que pede a anulação da exoneração de Aleixo e a revogação da nomeação de Alexandre Ramagem para o cargo. O documento, protocolado na 22ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária do Distrito Federal, se baseia nas alegações de Sergio Moro, que acusou Bolsonaro de ingerência política na PF.
“A interferência serviria justamente para tentar garantir verdadeira blindagem a priori a investigados do círculo do presidente, ou seja, teriam verdadeiros ‘superpoderes’ de cometerem eventuais crimes, mas nunca serem por eles responsabilizados”, afirma o texto da ação popular. Os senadores destacam ainda que estão em andamento investigações relacionadas ao presidente da República e aos seus filhos, como a que tramita no Supremo Tribunal Federal para apurar manifestações antidemocráticas pedindo intervenção militar.