A alcunha veio à tona na mídia e nas redes sociais nesta quarta-feira, 20, quando Regina deixou a Secretaria de Cultura do governo federal, onde de fato foi nomeada secretária, em 4 de março, mas pouco fez em dois meses de gestão.
Depois de 45 dias de uma indefinição chamada por ela e Bolsonaro de “noivado”, a atriz de 73 anos assumiu a Secretaria no lugar de Roberto Alvim, demitido em dezembro por publicar um vídeo institucional da pasta com conteúdo nazista.
Uma das primeiras ações de Regina no comando da Secretaria foi exonerar o então presidente da Funarte, Dante Mantovani, nomeado por Alvim. A presença do ex-maestro no cargo era motivo de polêmica e desgaste com a classe artística, já que Mantovani era conhecido por um vídeo publicado anteriormente em seu canal no YouTube, dizendo que o “rock leva ao aborto e ao satanismo”.
Outros presidentes de órgãos da cultura foram demitidos de imediato por Regina, em uma tentativa de tornar o setor mais moderado em relação à ideologia política, em comparação às escolhas feitas pelo antecessor Roberto Alvim. As decisões fizeram Regina perder prestígio tanto com o presidente, quanto com seus apoiadores.
O próprio Bolsonaro admitiu certa decepção com a escolhida, em uma entrevista no fim de abril, quando declarou: “Infelizmente, a Regina está trabalhando pela internet ali e eu quero que ela esteja mais próxima. Uma excelente pessoa, um bom quadro, é também uma secretária que era ministério, muita gente de esquerda, pregando ideologia de gênero, essas coisas todas que a sociedade, a massa da população não admite, e ela tem dificuldade nesse sentido”.
O ápice do estranhamento com o governo veio em 5 de maio, quando Mantovani foi renomeado presidente da Funarte pela manhã, na publicação do Diário Oficial da União, e novamente exonerado, no fim da tarde.
No mesmo dia, um áudio vazado pela revista Crusoé flagrou uma fala da ex-secretária com uma assessora, dizendo suspeitar que estava sendo dispensada pelo presidente.
Se com o governo o clima era ruim, entre a classe artística ela também não tinha apoio e foi criticada desde que assumiu a pasta e comparou a cultura “ao pum produzido com talco espirrando do traseiro do palhaço que faz a risadaria da criançada”, em seu discurso de posse. “Cultura é assim, feita de palhaçada, de música, de musicais”, disse ela ainda no começo de março. Sem nem apresentar planos concretos para o setor, Regina foi muito cobrada, sobretudo quando a pandemia impôs dificuldades ainda maiores ao desenvolvimento da atividade cultural no país.
O período no cargo coincidiu justamente com o avanço do novo coronavírus no Brasil e foi marcado pela morte de grandes personalidades da cultura nacional, em função ou não da COVID-19. A lista inclui o compositor Aldir Blanc, a maestrina Naomi Munakata e o artista plástico Daniel Azulay, vítimas da doença, além dos escritores Rubem Fonseca e Luiz Alfredo Garcia-Roza, o músico Moraes Moreira e o ator Flávio Migliaccio, que faleceram por outras causas.
Em comum, eles tiveram o descaso por parte do órgão chefiado por Regina Duarte, que não chegou nem a emitir nota ou prestar qualquer homenagem, o que rendeu algumas das críticas mais duras que a ex-secretária sofreu da classe artística.
Uma delas foi feita pela atriz Maitê Proença, ao vivo, enquanto a então secretária participava de uma entrevista à emissora CNN Brasil, no dia 7 de maio, que foi a derrocada final.
Convidada pela produção, Maitê disse em vídeo que “a Cultura está perplexa com a falta de informação com o que tem sido feito ou proposto. É inexplicável o silêncio sobre uma política para o setor. Nós estamos sobrevivendo de vaquinhas”, e ainda que “São muitos poucos os que têm reservas financeiras para milhares [de artistas] que estão à míngua. Enquanto isso, morrem os nossos gigantes: Rubens, Aldir, Flávio… Nenhuma palavra de nosso presidente, de nossa secretária. Regina, eu apoiei desde o início o seu direito a posição que divergia da maioria dos seus. Regina, estou aqui clamando: fale com a sua classe, nós precisamos de você”.
Quando a edição retornou para a Regina Duarte, ela esbravejava com os jornalistas, acusando-os de “desenterrar mortos”, alegando que os questionamentos de Maitê eram antigos. Antes do que a própria Regina chamou de “chilique”, ela havia dado declarações constrangedoras na entrevista, minimizando as mortes e práticas de tortura durante a ditadura militar brasileira (1964 a 1985).
“Na humanidade, não para de morrer. Se você fala 'vida', do lado tem morte. Sempre houve tortura. Stalin, Hitler, quantas mortes... não quero arrastar um cemitério de mortes nas minhas costas”, disse ela ao ser confrontada pelo entrevistador sobre a gravidade desses fatos, depois que a atriz cantarolou a marchinha Pra frente Brasil e disse “Não era gostoso isso?”, na tentativa de destacar pontos positivos do regime ditatorial.
Regina Duarte deixa o cargo sob aparente boa relação com o presidente Bolsonaro, que comentou sobre a mudança em suas redes sociais dizendo:”Regina Duarte relatou que sente falta de sua família, mas para que ela possa continuar contribuindo com o Governo e a Cultura Brasileira assumirá, em alguns dias, a Cinemateca em SP. Nos próximos dias, durante a transição, será mostrado o trabalho já realizado nos últimos 60 dias”.
Na manhã dessa quarta-feira, os dois estiveram em frente ao Palácio do Planalto, entre abraços, elogios, agradecimentos e promessas. "Vai me prometer que quando vier (ele, Bolsonaro) a São Paulo, me acompanhará", disse Bolsonaro, que ainda atribuiu todo o desgaste entre a ex-secretária e o governo à imprensa.