A articulação política do governo de Jair Bolsonaro no Congresso vai enfrentar uma prova de fogo nos próximos dias. Após sofrer três derrotas importantes na Câmara, nesta semana, o Palácio do Planalto tenta reverter a crise acelerando a transferência de recursos para redutos de parlamentares antes das eleições municipais de novembro. Até agora, no entanto, Bolsonaro não tem conseguido votos suficientes para fazer valer sua vontade no plenário.
Nem mesmo os cargos que o Planalto distribuiu para partidos do Centrão, recentemente, fizeram com que o bloco se unisse no apoio fechado ao governo. Agora, o teste para saber se Bolsonaro de fato construiu uma base no Congresso quando se aliou ao Centrão ocorrerá na votação de vetos presidenciais a projetos aprovados pelo Congresso, prevista para a semana que vem.
Para segurar a dispersão da base, o ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, vai se reunir com líderes da Câmara e do Senado, na terça-feira, quando tentará nova negociação com os parlamentares.
As derrotas impostas a Bolsonaro acenderam o sinal amarelo no Planalto. A contragosto da equipe econômica, por exemplo, a Câmara aprovou projeto que já havia passado pelo Senado e prevê indenização de R$ 50 mil para profissionais de saúde incapacitados de trabalhar, após contaminação pelo coronavírus. Além disso, deputados também deram sinal verde para o projeto que prevê socorro financeiro de até R$ 1,6 bilhão ao setor esportivo.
O governo tentou tirar a proposta da pauta, mas não conseguiu. O terceiro revés ocorreu com a retomada da discussão da reforma tributária sem a participação do ministro da Economia, Paulo Guedes. A iniciativa do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), foi vista como uma forma de pressionar Guedes a enviar o projeto, o que deve ser feito na terça-feira.
Dirigentes do Centrão, entre eles líderes do Progressistas e do PL, querem que Maia paute logo a reforma do governo. Mas há divisões no bloco, principalmente em relação à volta de um imposto nos moldes da antiga CPMF, como defende Guedes.
"Estamos dispostos a apoiar (o governo), mas dentro de critérios plausíveis", disse o deputado João Roma (BA), vice-líder do Republicanos, um dos partidos que compõem o Centrão. "Não há um alinhamento sistemático em qualquer coisa do governo. Por mais que haja uma construção de base de apoio sobre temas e bandeiras políticas, você não pode imaginar que qualquer assunto terá anuência dos que se declaram governistas."
No Senado, o Planalto teve mais sucesso nesta semana e conseguiu impedir a votação de uma medida provisória que ampliaria a suspensão do pagamento de tributos até o fim do ano. Mesmo assim, há preocupação com a análise dos vetos presidenciais a projetos que passaram pelo crivo do Congresso, como a prorrogação da desoneração da folha de pagamento de empresas e o novo marco regulatório do saneamento.
Um veto do presidente só é derrubado com votos de 257 deputados e de 41 senadores. Isso significa que o governo precisa garantir maioria na Câmara e no Senado para impedir nova derrota.
Emendas
Diante das dificuldades para montar uma base de apoio no Congresso, o governo cedeu e garantiu a liberação de recursos das emendas parlamentares ao Orçamento para redutos de deputados e senadores. Embora sejam obrigatórias, as emendas e seu cronograma de pagamento sempre funcionaram como moeda de troca em momentos de votações consideradas cruciais pelo governo.
Na prática, o Planalto liberou até esta semana 74% das emendas individuais indicadas por parlamentares para o ano todo. Com a estratégia, o governo assegurou a chegada do dinheiro a locais escolhidos pelos congressistas a tempo da eleição de prefeitos e vereadores, que foi adiada para novembro por causa da pandemia do coronavírus.
A verba serve para que eles divulguem o trabalho para o financiamento de obras nos locais onde recebem votos. Em ano de disputa eleitoral, a pressão para liberação do dinheiro aumenta.
Vice-líder do governo no Congresso e pré-candidato à prefeitura de Maringá (PR), o deputado Ricardo Barros (Progressistas-PR) admitiu a negociação para pagamento dos recursos. "Já está precificado. Foi combinado e está sendo cumprido. Se o governo não cumprisse, piorava, mas está sendo cumprido."
Neste ano, cada um dos 513 deputados e 81 senadores indicou R$ 15,9 milhões em emendas no Orçamento, o que totalizou R$ 9,5 bilhões. Até quarta-feira passada, o Executivo havia garantido R$ 7 bilhões, o que representa 74%. Além das emendas impositivas, o Planalto liberou uma quantidade extra de recursos para combate à covid-19, uma estratégia também usada para obter apoio político.
Procurada pela reportagem, a Secretaria de Governo citou dispositivos legais que obrigam a equipe de Bolsonaro a pagar emendas sob "critérios objetivos e imparciais", impedindo o repasse da verba três meses antes das eleições. A secretaria também argumentou que, por causa da pandemia e do decreto de calamidade pública, não houve bloqueio de recursos.
Indenização
Câmara aprovou projeto - já votado no Senado - que prevê indenização de R$ 50 mil a profissionais de saúde incapacitados de trabalhar após contaminação pela covid-19. Decisão contrariou equipe econômica do governo.
Socorro ao setor esportivo
Foi aprovado na Câmara, anteontem, projeto de lei para socorro ao setor esportivo durante a pandemia do coronavírus. De acordo com o texto, que ainda será analisado pelo Senado, o gasto autorizado é de até R$ 1,6 bilhão. O governo tentou tirar a proposta da pauta, sem sucesso.
Reforma tributária
Outra derrota recente imposta ao Planalto foi a retomada da discussão da reforma tributária sem a participação de Paulo Guedes. A iniciativa do presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia, foi considerada uma forma de pressionar o ministro da Economia a enviar o projeto.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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