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Estado de Minas CONGRESSO

Prisão em segunda instância: pressão para afrouxar regras atrasa votação no Congresso

Deputados que apoiam a PEC apostam no clamor popular da proposta para aprovar a medida no plenário da Câmara até setembro. Projeto está parado na comissão especial


10/08/2020 04:00 - atualizado 10/08/2020 07:41

No fim do ano passado, o STF decidiu suspender a possibilidade da execução da prisão após (foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil)
No fim do ano passado, o STF decidiu suspender a possibilidade da execução da prisão após (foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil)
Com a Câmara dos Deputados já considerando a possibilidade de retomar as atividades presenciais no Congresso Nacional, parlamentares querem dar prioridade à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 199/2019, que regulamenta a prisão após condenação em segunda instância.

O tema entrou em voga no fim de 2019, depois de o Supremo Tribunal Federal (STF) decidir que é ilegal que um réu inicie o cumprimento da pena antes que todos os recursos sejam esgotados, mas ficou em segundo plano por conta da pandemia do novo coronavírus. Mesmo assim, deputados que apoiam a medida apostam no clamor popular da proposta para dar seguimento ao tema e aprovar a PEC no plenário da Câmara até setembro.

O texto é de autoria do deputado Alex Manente (Cidadania-SP) e propõe a transformação dos recursos extraordinário e especial, previstos na Constituição, em ações revisionais, possibilitando que as decisões proferidas pelas cortes de segunda instância transitem em julgado já com o esgotamento dos recursos ordinários.

Com esta alteração, ficaria permitida a execução imediata das sentenças estabelecidas pelas cortes regionais. Manente diz que um dos principais objetivos da proposta é devolver a carga de responsabilidade institucional às instâncias ordinárias, que, segundo ele, são as que promovem, efetivamente, a análise probatória de um julgamento.

Além disso, caso a PEC seja aprovada, o trabalho do STF e do Superior Tribunal de Justiça (STJ) será limitado à análise de situações de efetiva gravidade, evitando a interposição automática dos recursos extraordinário e especial, o que, de acordo com Manente, “afoga” os tribunais em uma enxurrada de recursos diversos, fazendo com que muitos casos sequer sejam concluídos e as condenações acabem prescrevendo.

“A transformação dos recursos extraordinário e especial tenderia a não apenas remover incentivo positivo à interposição de recursos protelatórios, mas ainda a dar verdadeira efetividade às decisões judiciais que hoje se arrastam décadas a fio sem a devida efetivação do direito material”, defende o autor da PEC.

Por se tratar de uma PEC, a proposta depende do apoio de três quintos dos deputados (308), em dois turnos de votação, para ser aprovada na Câmara e seguir para o Senado, onde também precisa de três quintos dos votos favoráveis (49) em dois turnos. Se o texto for aprovado nas duas Casas sem alterações, é promulgado em forma de emenda constitucional em sessão do Congresso Nacional.

A proposta está parada na comissão especial criada para tratar o assunto. O relator do texto, deputado Fábio Trad (PSD-MS), garante que a sua análise da matéria já está pronta. O parlamentar afirma que o tema é consenso entre os membros do colegiado e que, portanto, deve ser aprovado sem grandes problemas. Assim que os encontros presenciais na Câmara forem permitidos pelo presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), a tendência é de que o parecer de Trad seja lido e votado já na primeira sessão da comissão.

“Espero que a PEC tenha a aceitação da maioria dos parlamentares. A primeira grande demanda dos deputados era no sentido de não limitar área penal, e isso foi atendido no relatório. Toda a Justiça brasileira ficará mais ágil no que diz respeito a efetividade das decisões. Hoje, é preciso percorrer praticamente quatro degraus para que as decisões sejam cumpridas. Se a PEC for aprovada, com apenas dois degraus o jurisdicionado vai ter concretizada a decisão”, destaca.


Problemas


Apesar do otimismo, Trad tem sofrido pressões de grupos de parlamentares que tentam afrouxar as regras discutidas na PEC. O movimento dos congressistas foi para tentar fazer com que as normas da proposta sejam válidas apenas para crimes cometidos depois da promulgação do texto. Pelo texto original, os responsáveis por ilícitos que já aconteceram podem ser atingidos pela alteração e presos após condenação em segunda instância desde que o processo judicial tenha início somente após a publicação da emenda na Constituição.

Para o relator, essa sugestão poderia desidratar a PEC e atrapalhar o objetivo maior do texto. “Esse tipo de sugestão não tem consistência jurídica e colide com o anseio popular, que quer uma Justiça mais efetiva. Como se trata de uma PEC que altera a norma processual, o correto juridicamente é fazê-la incidir sobre as ações penais e não penais iniciadas depois dela, não sobre fatos”, defende Trad. “Essa alteração teria o efeito de zerar o jogo para todos, e não sei se isso seria saudável para aqueles que querem que a Justiça seja mais efetiva e não deixe margem a qualquer manobra que possa chancelar uma impunidade”, acrescenta o deputado.

Outro aspecto que tem incomodado Trad é a falta de uma sinalização de apoio por parte do governo à proposta. O presidente Jair Bolsonaro nunca declarou abertamente ser favorável à PEC, por mais que tenha sido eleito sob a bandeira do combate à corrupção e à impunidade, e um dos filhos dele pode acabar sendo atingido pelos efeitos da medida, caso ela seja aprovada: o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) que é investigado por integrar um suposto esquema de rachadinha na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) quando era deputado estadual.

O relator espera, de todo modo, que razões políticas ou pessoais não diminuam a importância da proposta. “Não creio que o presidente vai deixar de apoiar a PEC por conta desses motivos. A proposta não foi feita, sobretudo o meu relatório, levando em perspectiva a situação particular individualizada. Alterar a Constituição ou fazer uma lei são atributos essenciais à generalidade e eu não vou transigir nenhuma tentativa de carimbar o relatório com uma pecha de casuísmo”, frisa Trad.

Entendimento da Corte


Em 7 de novembro do ano passado, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, por 6 votos a 5, suspender a possibilidade da execução da prisão após condenação em segunda instância de Justiça. Até aquela altura, o entendimento da própria Corte, estabelecido em 2016, era o de que o cumprimento da pena depois de decisão em segunda instância era válido. O julgamento levou em conta três ações que pediram a constitucionalidade do artigo 283 do Código de Processo Penal (CPP), que prevê, entre as condições para a prisão, o trânsito em julgado da sentença condenatória, em referência ao chamado princípio da presunção de inocência, presente no artigo 5º da Constituição Federal, segundo o qual “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. Um dos beneficiados com a medida foi o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que deixou a prisão após 580 dias.



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